ACÓRDÃO N.º 370/2015
PROCESSO N.º 472-C/2015
Partidos Políticos e Coligações
(Recurso para o Plenário – n.º 1 do artigo 18.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro – Lei dos Partidos Políticos)
Em nome do povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. RELATÓRIO
COMISSÃO INSTALADORA DO PARTIDO PAND, melhor identificada nos autos, veio interpor o presente recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional, com fundamento no n.º 1 do artigo 18 da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro – Lei dos Partidos Políticos, do Douto Despacho do Venerando Juiz Presidente deste Tribunal, que rejeitou o pedido de inscrição do Partido Político PAND e consequentemente, cancela o credenciamento da sua Comissão Instaladora, por não terem sido preenchidos os requisitos legalmente estabelecidos, no prazo fixado.
O despacho em questão considerou que a Recorrente não apresentou o número mínimo de assinaturas válidas em 17 Províncias (150), conforme exigido no n.º 1 do art.º 14º da Lei dos Partidos Políticos, nem o número mínimo de assinaturas válidas a nível nacional (7500), situação resultante do facto de parte substancial das assinaturas apresentadas para a subscrição do Partido não estarem conformes à assinatura aposta nos respectivos documentos de identificação.
A Recorrente fundamenta o seu recurso alegando ter apresentado o número de assinaturas e atestados de residência legalmente estabelecido pelo que conclui pedindo, a recontagem por forma a fazer o levantamento dos documentos e anulação do cancelamento do credenciamento da Comissão Instaladora e, consequentemente a legalização do Partido Político PAND.
A Recorrente juntou documentos diversos.
Admitido o requerimento, nos termos das alíneas b), c) e d) do n.º 2.º, do artigo 66.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Julho, Lei do Processo Constitucional, foi elaborado o memorando e dele foi dado conhecimento aos Venerandos Juízes Conselheiros e à Digna Representante do Ministério Público.
Colhidos os vistos dos Venerandos Juízes Conselheiros e da Digna Representante do Ministério Público, cumpre decidir.
II. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL
Nos termos do n.º 1 do artigo 18.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos, cabe recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional “do acto do Presidente do Tribunal Constitucional que ordene ou rejeite a inscrição de um partido político”.
Por sua vez, a Lei n.º 2/08, de 17 de Junho (Lei Orgânica do Tribunal Constitucional), refere, na sua alínea i) do artigo 16.º (com a redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 24/10, de 3 de Dezembro), que ao Tribunal Constitucional compete, em geral, administrar a justiça em matéria jurídico-constitucional, nomeadamente: (…) “verificar a legalidade na formação de partidos políticos, bem como declarar a sua extinção, nos termos da Lei dos Partidos Políticos”. Consequentemente, a Lei n.º 3/08, de 17 de Junho (Lei Processo Constitucional), refere, na alínea a) do n.º 2 do artigo 63.º, que se inscreve ainda no âmbito da competência do Tribunal Constitucional “proceder ao cancelamento do credenciamento e da autorização concedida à comissão instaladora de partido político, quando esta não tenha requerido dentro do prazo legal a formação do partido político nos termos do n.º 6 do artigo 12 da Lei dos Partidos Políticos”.
Tem, pois, este Tribunal competência para apreciar e decidir sobre o objecto dos presentes autos.
III. LEGITIMIDADE
Nos termos do n.º 2 do artigo 18.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos, a Recorrente é parte legítima na presente acção.
IV. OBJECTO
Posto isto, ao Tribunal Constitucional cumpre apreciar se os pressupostos e requisitos que a lei estabelece para a criação de um partido político foram ou não cumpridos pela Comissão Instaladora do partido político PAND.
V. APRECIANDO
Tendo em atenção o objecto do processo e visando delimitá-lo, importa analisar o pedido de inscrição e a regularidade dos documentos apresentados, com realce para:
É sobre estas questões que se impõe responder, tendo em atenção a pretensão da Recorrente.
V. a) As assinaturas dos cidadãos e respectivas fotocópias de documentos de identificação estão em conformidade e correspondem ao número mínimo de 7.500 cidadãos maiores de 18 anos de idade, estabelecido por lei para o efeito?
A Lei n.˚ 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos (LPP) estabelece no n.˚ 1 do artigo 14.˚, que a inscrição de um partido político deve ser requerida por, pelo menos, 7.500 cidadãos maiores de 18 anos e no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos, sendo que, destes, devem corresponder pelo menos 150 cidadãos residentes em cada uma das 18 províncias que integram o País.
Para este efeito, a lei estabelece o conjunto de documentos que devem acompanhar o requerimento de inscrição de um partido político, como dispõe o n.º 2 e suas alíneas, da Lei dos Partidos Políticos.
Os cidadãos que requeiram a inscrição de um partido político devem remeter ao Tribunal Constitucional os documentos que vêm enumerados de forma taxativa e cumulativa no artigo 14.˚ da Lei doa Partidos Políticos, dentre os quais, fotocópia do bilhete de identidade ou cartão de eleitor dos 7.500 cidadãos subscritores.
Da análise feita aos documentos apresentados pela Recorrente e compulsadas as assinaturas apresentadas, foram detectadas várias irregularidades, umas relacionadas com vícios na documentação dos subscritores e outras respeitantes à ausência de atestados de residência.
A título demonstrativo das várias irregularidades relacionadas com vícios na documentação dos subscritores, foi detectadas assinaturas válidas e outras inválidas como se resume no quadro seguinte:
PROVÍNCIAS |
CONFORME |
NÃO CONFORME |
BENGO |
15 |
100 |
MALANJE |
23 |
125 |
LUANDA |
1.023 |
1.403 |
CABINDA |
10 |
105 |
HUÍLA |
12 |
90 |
NAMIBE |
13 |
121 |
LUNDA SUL |
20 |
98 |
LUNDA NORTE |
32 |
146 |
BIÉ |
30 |
109 |
BENGUELA |
14 |
132 |
HUAMBO |
38 |
121 |
MOXICO |
8 |
58 |
KUANZA-SUL |
27 |
86 |
KUANZA-NORTE |
0 |
93 |
UÍGE |
29 |
210 |
ZAIRE |
16 |
123 |
CUANDO CUBANGO |
2 |
84 |
CUNENE |
13 |
130 |
TOTAL |
1.325 |
3.334 |
Como se pode verificar no quadro supra apresentado, a Comissão Instaladora do Partido PAND só preencheu os requisitos legalmente estabelecidos na província de Luanda.
Os fundamentos que estiveram na base da não admissão das assinaturas foram, essencialmente, os seguintes:
Sobre esta questão, a Recorrente nada traz ao processo que possa provar o contrário ou pôr em causa a avaliação feita pelo Gabinete dos Partidos Políticos, sendo que o único argumento que arrola sobre a conformidade das assinaturas é alegar que os dados foram forjados dentro do Tribunal e de seguida a Recorrente apresenta o mesmo quadro das inconformidades referidas por este Tribunal.
Nesta conformidade, só a falta do preenchimento deste requisito, isto é, o número mínimo exigível quer a nível nacional quer a nível provincial, bastaria para considerar a improcedência do recurso, pois, não obstante as irregularidades apontadas, em geral, o número total de subscritores apresentados pela Comissão Instaladora é de 4.659, quando a lei exige 7.500.
V. b) Os atestados de residência para comprovar o carácter nacional que os partidos políticos devem possuir foram apresentados nos termos e em conformidade com o estabelecido pela lei?
De acordo com as disposições conjugadas da al. a) do n.˚ 2 do artigo 17.˚ da Constituição da República de Angola (CRA) e o artigo 5.˚ da Lei dos Partidos Políticos, os partidos políticos devem possuir carácter e âmbito nacionais.
É por causa desta obrigação jurídico-constitucional e legal, que os partidos políticos devem fazer prova no momento da sua inscrição, da recolha válida de assinaturas pelas dezoito (18) províncias do país.
Para o efeito, a Recorrente apresentou como justificativo de cumprimento do requisito constante da al. g) do n.˚ 2 do artigo 14.˚ da Lei dos Partidos Políticos – atestado de residência – seis (6) declarações de atestados de residência emitidos pelas autoridades administrativas locais, designadamente: i) Viana (fls. 10 a 17), trata-se apenas de uma única e mesma declaração, N.˚ 58/2014, embora tenha sido apresentada pela Recorrente como se fossem dois documentos distintos e autónomos entre si); ii) Cabinda (fls. 18 a 24); iii) Malanje (fls. 25 a 31); iv) Benguela (fls. 32 a 34) e Lobito (fls. 35 a 39); v) Mbanza Congo (fls. 40 a 46); e vi) Namibe (fls.47 a 50).
As declarações acima descritas perfazem um total de 853 (oitocentas e cinquenta e três) assinaturas. Este número é insuficiente para efeitos do cumprimento do quantum definido pelo artigo 14.˚ da Lei dos Partidos Políticos.
Olhando para o número mínimo legalmente exigido de 7.500 assinaturas para que a inscrição do partido político da Recorrente ocorra nos termos determinados pela Lei dos Partidos Políticos, faltam 6.647 (seis mil seiscentas e quarenta e sete) assinaturas, das quais a Recorrente não fez prova legal da sua existência durante a fase administrativa de requerimento de inscrição do partido político, sendo que nesta fase (jurisdicional) em que agora se encontra em apreciação o seu pedido.
Ademais, a Requerente juntou uma lista nominal de cidadãos que, alegadamente, residem nas localidades do Tômbua (fls. 51 a 53); Saurimo (fls. 54 a 57); Lunda Norte (58 a 66); Bié (fls. 72 a 76); Cunene (fls. 77 a 96); Cuanza Sul (fls. 97 a 112); Moxico (fls. 113 a 121); Bengo (fls.122 a 131); Cuanza Norte (fls. 132 a 136); Uíge (fls. 137 a 153); Cuando Cubango (fls. 153 a 158); Huíla (fls. 159 170), embora na sua maioria os mesmos documentos tenham sido reproduzidos.
Nenhuma das listas acima referidas e que foram remetidas ao conhecimento deste Tribunal mereceu qualquer reconhecimento das autoridades administrativas locais. Logo, as listas apresentadas como meio de prova, não produzem quaisquer efeitos jurídico-legais para confirmação de residência dos cidadãos subscritores nas localidades mencionadas.
Consequentemente, não pode este Tribunal considerar estas assinaturas e os correspondentes cidadãos como residentes nas circunscrições administrativas que a Requerente alega, sem fazer a adequada prova deste facto.
Para este efeito, a lei estabelece várias alternativas, não se limitando à via por declaração, sendo certo que a Comissão Instaladora ou os seus subscritores não se socorreram das outras formas para a obtenção dos atestados de residência, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 14.º da Lei dos Partidos Políticos.
Porém, a este respeito, a Recorrente nada alega no sentido de lhe ser conferida razão e basta-se com o argumento segundo o qual a informação sobre a não apresentação dos atestados de residência foi deturpada ou inserida de má-fé para ludibriar o Venerando Juiz Conselheiro Presidente.
Do exposto nos parágrafos anteriores, e da prova produzida, é entendimento deste Tribunal que:
Portanto, com ficou amplamente demonstrado e fundamentado, os requisitos que determinam a admissão ou rejeição do pedido de inscrição de um partido político novo, são os previstos, objectiva e inequivocamente pela Constituição da República de Angola e pela Lei dos Partidos Políticos.
O Tribunal Constitucional não pode, como pretende a Recorrente, substituir-se à vontade soberana do Povo Angolano e inscrever, à revelia da recusa popular, um partido político novo.
O Tribunal conclui que o Despacho de rejeição da inscrição do partido político PAND com fundamento na “falta dos elementos essenciais” para a sua criação, nos termos da al. b) do artigo 16.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos e em consequência decretou o cancelamento do credenciamento da sua Comissão Instaladora está em conformidade com a lei.
DECIDINDO
Nestes termos,
Tudo visto e ponderado,
Acordam em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em:
Sem custas nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional).
Notifique.
Tribunal Constitucional, em Luanda, 17 de Novembro de 2015.
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Dr. Rui Constantino da Cruz Ferreira (Presidente)
Dr. António Carlos Pinto Caetano de Sousa
Dr.ª Efigénia M. dos S. Lima Clemente
Dra. Luzia Bebiana de Almeida Sebastião
Dr.ª Maria da Imaculada L. da C. Melo
Dr. Miguel Correia
Dr. Onofre Martins dos Santos
Dr. Raul Carlos Vasques Araújo (Relator)