Loading…
Acórdãos > ACÓRDÃO 425/2017

Conteúdo

ACÓRDÃO N.º 425/2017

 

PROCESSO Nº 524-A/2016

(Recurso para o Plenário) 

Em nome do Povo, acordam em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

I. RELATÓRIO 

Fernando Liberdade, António Samu, Jesus Mucumbi Muaneno Ngoanhi, Rocha Samafuta e Augusto Cazanguile, com os demais sinais de identificação nos autos, vieram interpor o presente recurso para o Plenário, do douto despacho do Juiz Conselheiro Presidente deste Tribunal proferido a fls. 79 e 79 verso dos autos, que indeferiu o requerimento de interposição do recurso ordinário de inconstitucionalidade, apresentado pelos ora Recorrentes, nos autos do processo n.º 518-C/2016, por inobservância dos requisitos e procedimentos estabelecidos no n.º 1 do artigo 41.º da Lei n.º 3/08 de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC).

Inconformados, os Recorrentes vieram dele recorrer para o Plenário deste Tribunal, alegando, em síntese, que:

  1. Não há qualquer equívoco na interpretação do artigo 41.º da Lei n.º 3/08 de 17 de Junho, na medida em que a Carta Magna de Angola é de cumprimento obrigatório e, as suas superioridades impõem-se às normas anteriores à sua vigência. Além disso as normas constantes da Constituição da República de Angola (CRA) não são de carácter interpretativo, mas sim de tutela efectiva dos seus beneficiários.
  2.  Têm consciência plena da necessidade de obediência aos procedimentos processuais e, por isso, no gozo dos seus direitos, fizeram-no por ser uma garantia constitucional prevista nos artigos 73.º e 67.º n.º 1 ambos da Carta Magna de Angola.
  3. O Tribunal Constitucional, é o órgão competente para conhecer o presente recurso, por entenderem que a rejeição do requerimento de recurso, pela Escrivã do Tribunal, consagrado no artigo 29.º da CRA.
  4. É necessário fazer-se uma interpretação mais pormenorizada do artigo 41.º da Lei n.º 3/08, por, no seu entender, violar o direito à defesa e ao recurso, preceituados constitucionalmente no artigo 67.º da CRA, concluindo mesmo que, o douto despacho de que ora se recorre é uma nova negação do direito de acesso à justiça que assiste aos Recorrentes.
  5. Os Recorrentes terminam as suas alegações solicitando que o Tribunal Constitucional:
    1. julgue improcedente o despacho recorrido, com a consequente manutenção do status quo ante do seu requerimento inicial;
    2. considere a sua petição apta para apreciação.

O processo foi à vista do Ministério Público

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar e decidir. 

II. COMPETÊNCIA

O Plenário do Tribunal Constitucional é competente para conhecer e decidir sobre o presente recurso, nos termos do n.º 3 do artigo 5.º da Lei n.º 3/ 08, de 17 de Junho (LPC). 

III. LEGITIMIDADE

Para intervir no processo como parte, é necessária a existência de um interesse directo em demandar ou em contradizer. Este interesse determina a legitimidade dos Recorrentes que, sendo arguidos nos processos n.s 78/016-CQ e 79/016-CQ que correram seus termos na Sala dos Crimes Comuns do Tribunal Provincial da Lunda Sul, foi-lhes indeferido o recurso ordinário de inconstitucionalidade, de fls. 2 a 4, por despacho proferido pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional.

Têm, assim, os Recorrentes legitimidade para formular o pedido que ora submetem à apreciação do Plenário do Tribunal Constitucional.

 IV.OBJECTO

O presente recurso tem por objecto o despacho do Juiz Conselheiro Presidente proferido a fls. 79 e 79 verso, que indeferiu o recurso ordinário de inconstitucionalidade apresentado pelos Recorrentes.

V. APRECIANDO

Os Recorrentes vieram, directamente ao Tribunal Constitucional, interpor o recurso ordinário de inconstitucionalidade, em virtude de não ter sido recebido o seu requerimento de interposição de recurso de revisão, junto do Tribunal Provincial da Lunda Sul.

O recurso para o Tribunal Constitucional foi indeferido por despacho proferido pelo Juiz Conselheiro Presidente deste Tribunal, por inobservância dos requisitos legais tipificados no n.º 1 do artigo 41.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho (LPC).

O despacho de que se recorre, elencou os requisitos em falta, dos quais se salientam os seguintes:

  1. O facto do recurso ter sido interposto directamente no Tribunal Constitucional, sem se fazer acompanhar da decisão condenatória que lhe serviria de fundamento, para verificação das supostas normas constitucionais violadas;
  2. O recurso deveria ter dado entrada no Tribunal onde correu o processo principal, neste caso, no Tribunal Provincial da Lunda Sul;
  3. Não foi indicada a diligência processual em que suscitaram a questão da inconstitucionalidade.

Com efeito, no requerimento que deu entrada neste Tribunal, no dia 8 de Agosto de 2016, os Recorrentes interpuseram uma acção de recurso ordinário de inconstitucionalidade (vide fls. 2, página 1) contra uma decisão que, a priori, não consta do processo e não se configura como objecto deste tipo de recurso, uma vez que só as sentenças dos demais Tribunais, nas quais se verifiquem os requisitos definidos no artigo 36.º da Lei n.º3/08 de 17 de Junho (LPC), podem ser objecto deste tipo de recurso.

No caso em análise, houve uma alegada recusa da admissão do recurso pelo Tribunal Provincial da Lunda Sul. Contra esta decisão, deveria ter sido feita uma reclamação para o Juiz Presidente daquela mesma instância ou, ainda, para o Venerando Tribunal Supremo e nunca o recurso deveria ser dirigido directamente para o Tribunal Constitucional, nos termos em que os Recorrentes o fizeram.

Em todo o caso, considerando o efeito suspensivo previsto nas alíneas a) e c) do artigo 44.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho (LPC), os Recorrentes poderão estar ainda em tempo de reclamar junto da entidade competente, do não recebimento no Tribunal Provincial da Lunda Sul do seu recurso referido a fls.66, nos termos previstos no artigo 688.º do CPC.

O direito ao recurso e o acesso à justiça previstos nos artigos 67.º e 29.º da CRA, constituem garantias fundamentais dos cidadãos, contudo, a sua efectivação implica a observância dos trâmites e procedimentos legais, em obediência ao princípio da legalidade que vincula todos os cidadãos e instituições (artigos 2.º e 6.º da CRA), sendo que, o próprio Tribunal Constitucional está sujeito a este mesmo princípio.

A aplicabilidade imediata das normas constitucionais relativas a direitos fundamentais, invocada pelos Recorrentes, não afasta a necessidade de aplicação simultânea das formalidades processuais quando estas, como é o caso presente, estão funcionalmente adequadas ao conteúdo e sentido dos referidos direitos fundamentais.

Nas suas conclusões, os Recorrentes invocam a desarmonia constitucional da interpretação dada pelo Tribunal Constitucional, ao artigo 41.º da Lei n.º 3/08, dizendo que a mesma norma foi aprovada antes da Constituição.

Entende este Tribunal que não se verifica qualquer desarmonia, entre a norma mencionada e a CRA, pelo que andou bem o Juiz Conselheiro Presidente deste Tribunal ao indeferir o pedido, por falta de requisitos legais. O Tribunal Constitucional não pode pronunciar-se sobre uma decisão condenatória que desconhece, e à margem da lei, só pelo facto de ser o órgão competente para defesa dos direitos fundamentais. 

CONCLUSÃO 

Por tudo acima exposto, o Plenário conclui que não existem fundamentos para deferir a pretensão dos Recorrentes, sendo, por consequência, confirmado o despacho recorrido e indeferido o pedido. 

DECIDINDO

Nestes termos

Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em:

Sem custas nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08 de 17 de Junho (Lei do Processo Constitucional).

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 12 de Maio de 2017.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dr. Rui Constantino da Cruz Ferreira (Presidente)

Dr. Américo Maria de Morais Garcia (Relator) 

Dr. António Carlos Pinto Caetano de Sousa 

Dr. Carlos Magalhães 

Dra. Guilhermina Prata 

Dra. Luzia Bebiana de Almeida Sebastião

Dra. Maria da Imaculada L. da C. Melo 

Dr. Onofre Martins dos Santos

Dr. Raul Carlos Vasques Araújo 

Dra.Teresinha Lopes