ACÓRDÃO N.º469/2017
PROCESSO N.º 546-C/2017
(Recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional)
Em nome do Povo, acordam em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. RELATÓRIO
Prevel - Organizações Joravi Lda, com os demais sinais de identificação nos autos, veio interpor o presente recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional, do Despacho do Venerando Juiz Conselheiro Presidente deste Tribunal, constante de fls.55, proferido no âmbito do processo n.º 538-C/2017, que indeferiu liminarmente o seu recurso extraordinário de inconstitucionalidade, e tem por objecto a mora na prolação de decisão por parte do Tribunal Supremo.
Por douto despacho, proferido pelo Venerando Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional de fls. 55, foi o recurso indeferido, com fundamento no facto de a alegada mora na tomada de decisão pelo Tribunal Supremo, não sendo uma sentença, não poder ser objecto de recurso extraordinário de inconstitucionalidade nos termos do estabelecido na alínea a) do artigo 49.º, da Lei n.º3/08 de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC).
Não se conformando, a Recorrente, veio dele recorrer para o Plenário do Tribunal Constitucional, através do requerimento constante de fls. 2 dos autos, ao abrigo do disposto nos artigos 5.º nºs 3 e 5, 8.º n.º2, ambos da Lei n.º 3/08 (LPC).
Para o efeito, a Recorrente alega, em síntese, que:
1. O Tribunal Constitucional deve promover a defesa jurisdicional do respeito e garantia efectiva dos direitos e liberdades pessoais da Recorrente, dos seus sócios e colaboradores, ainda que de modo oficioso, para que seja útil, célere, prioritária, nos termos em que dispõe o artigo 29.º n.ºs 4 e 5, conjugado com os artigos 27.º, 26.º n.º 3, 108.º n.º 1 e 226.º, todos da Constituição da República de Angola (CRA).
2- O Plenário deste Tribunal Constitucional tem poderes cognitivos de jurisdição plena sobre todas as questões de natureza jurídico-constitucional de harmonia com a concretização das disposições conjugadas dos artigos 1.º, 2.º n.º 2, 13.º, 26.º, 27.º, 105.º, 180.º e 226.º, todos da CRA, e, por isso, solicita uma fiscalização concreta da constitucionalidade de todas as ameaças ou violações dos direitos, liberdades e garantias pessoais da Recorrente, seus sócios, dos então trabalhadores e colaboradores. Porém, o recurso extraordinário de inconstitucionalidade é, no caso concreto, uma garantia adjectiva da ora Recorrente, é uma espécie de recurso de amparo constitucional.
3- O Tribunal Constitucional, ao exigir o esgotamento dos recursos ordinários, num processo que já dura há mais de 12 anos, sem que tenham sido proferidas decisões questionáveis, está a violar os princípios da imodificabilidade das competências constitucionais deste órgão, previstas no artigo 180.º n.º 1 e alínea a) do n.º 2, conjugados com os artigos 29.º nºs 4 e 5 e 72.º da CRA.
4- O Plenário de Juízes do Tribunal Constitucional deve afastar a aplicação da norma prevista no parágrafo único do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, que impõe o respeito pelo princípio do esgotamento dos recursos ordinários legalmente previstos, já que a aplicação deste dispositivo legal favorece a manutenção de ameaças e de violações aos direitos da ora Recorrente, dos seus sócios, e dos então trabalhadores, bem como aos princípios consagrados na CRA.
5- O Plenário do Tribunal Constitucional deve fixar remédios constitucionais concretos, contra a inacção do Tribunal Supremo e contra todas as decisões e manobras que visam extinguir a execução da sentença e fixar um prazo concreto e demais medidas cabíveis a este caso, por forma a colmatar o grande prazo de espera pela decisão final, no que se refere ao recurso de apelação e, aos processos executivos, incluindo os cautelares.
6- A Recorrente solicita ao Plenário deste Tribunal uma simples apreciação da constitucionalidade ou inconstitucionalidade das decisões proferidas no âmbito deste processo, nomeadamente: a sentença n.º117/07 referente à acção principal e especial de manutenção de posse, a providência cautelar de restituição provisória de posse, o Acórdão n.º 434-A/2011 do Tribunal Supremo que alterou o efeito da apelação, o Acórdão n.º 344/2015, proferido no âmbito do processo n.º434-A/2014, que negou provimento ao recurso extraordinário de inconstitucionalidade que tinha sido interposto junto deste Tribunal Constitucional pela ora Recorrente e que seja aferida a validade ou invalidade jurídicas de todas as decisões, ao abrigo do artigo 226.º da CRA.
7- A Recorrente termina pedindo que seja admitido o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, sem afastar o interesse por si manifestado de trazer à colação destas alegações, factos e direitos anteriormente articulados, incluindo provas, pedidos e causa de pedir, nomeadamente nas questões de natureza jurídico-constitucional que interessam para a obtenção da tutela efectiva contra todas as ameaças ou violações dos direitos, liberdades e garantias pessoais.
O processo foi à vista do Ministério Público.
Colhidos os vistos legais, cumpre agora, apreciar para decidir.
II. COMPETÊNCIA
O Tribunal Constitucional é competente para conhecer e decidir o presente recurso, nos termos do n.º 3 do artigo 5.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho (LPC).
III. LEGITIMIDADE
Para intervir no processo como parte, afigura-se necessária a existência de um interesse sério em demandar ou em contradizer. É este interesse que, nos termos da alínea a) do artigo 50.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, (LPC) determina a legitimidade da Recorrente.
A ora Recorrente é parte no processo n.º1660/10 que corre os seus termos na Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo.
Foi-lhe indeferido o recurso extraordinário de inconstitucionalidade pelo que tem, assim, a Recorrente, legitimidade para apresentar o presente pedido.
IV. OBJECTO
O presente recurso tem por objecto a apreciação do despacho do Juiz Conselheiro Presidente deste Tribunal, de fls. 55 dos autos, que indeferiu o pedido da Recorrente.
Ao Plenário do Tribunal Constitucional cabe analisar se o referido despacho preteriu ou não o direito da Recorrente ao recurso.
V. APRECIANDO
A Recorrente veio interpor o presente recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional contra o Despacho do Venerando Juiz Conselheiro Presidente deste Tribunal, que indeferiu “in limine” o seu pedido de recurso extraordinário de inconstitucionalidade, com fundamento na alínea a) do artigo 49.º da LPC (vide fls. 55 dos autos), de que discorda.
O recurso apresentado pela ora Recorrente junto deste Tribunal, na forma de recurso extraordinário de inconstitucionalidade, não tinha por objecto uma decisão concreta que contrariasse princípios constitucionais e que pudesse ser objecto deste tipo de recurso, conforme preceitua o artigo 49.º da LPC, mas tão somente, a mora na prolação da decisão por parte do Tribunal Supremo, que segundo a Recorrente, não decide o seu recurso de apelação há mais de 12 anos, afirmando mesmo que esta inacção viola uma série de princípios constitucionais por si elencados, entre os quais, o da tutela jurisdicional efectiva em tempo útil e o da celeridade processual, todos previstos no artigo 29.º da CRA. Por esta razão, a Recorrente pede ao Plenário deste Tribunal que afaste a aplicação do artigo 49.º da LPC, na parte que exige o esgotamento dos recursos ordinários.
Entende o Plenário que os factos alegados pela Recorrente criam indignação, até mesmo desespero, a qualquer interessado em obter uma decisão judicial, o que legitima a sua reclamação, conforme já o referiu o douto despacho do Venerando Juiz Conselheiro Presidente. Porém, a Lei do Processo
Constitucional impõe limites ao objecto do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, que, impreterivelmente, deve ser uma sentença ou outras decisões que violem direitos, liberdades e princípios constitucionais e desde que tenham sido esgotados os recursos ordinários a nível dos tribunais comuns (vide alinea a) e § único do artigo 49.º da LPC).
No caso sub judice, não é uma sentença de que se recorre, não estando por isso, preenchidos os requisitos legais e essenciais para que o pedido da ora Recorrente possa ser atendido nos moldes em que o pretende. Por imperativo constitucional, o Tribunal Constitucional não pode ignorar o princípio da reserva da Constituição, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 105.º da CRA, que fixa as competências dos órgãos de soberania.
Acontece que a pretensão da Recorrente afecta a tipicidade de competências na medida em que o objecto do recurso extraordinário de inconstitucionalidade é estipulado por lei, nos termos do citado artigo 49.º da LPC.
Assim sendo, a pretensão da Recorrente apresenta-se desconforme com a Constituição, na medida em que atribuiria competência processual ao Tribunal Constitucional, contrariando a sua natureza jurisdicional.
Com efeito, da análise feita aos fundamentos que determinaram a interposição do recurso para este Plenário do Tribunal Constitucional, bem como dos elementos probatórios que a sustentam, denota-se, claramente que a Recorrente carece de fundamentos legais e constitucionais para recorrer a este Tribunal, não se mostrando, assim, verificadas as condições para admissão do recurso extraordinário de inconstitucionalidade.
Entretanto, como se estabelece na alínea n) do artigo 23.º da Lei n.º 14/11, de 18 de Março – Lei do Conselho Superior da Magistratura Judicial, nada obsta a que a Recorrente apresente a competente reclamação ao Conselho Superior da Magistratura Judicial.
Contudo, considera o Plenário que o Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional andou bem, ao indeferir liminarmente o recurso apresentado pela Recorrente.
DECIDINDO
Nestes termos,
Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em:
Custas pela Recorrente nos termos artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho (Lei do Processo Constitucional).
Notifique.
Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 5 de Dezembro de 2017.
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente)
Dr. Américo Maria de Morais Garcia (Relator)
Dr. António Carlos Pinto Caetano de Sousa
Dra. Guilhermina Prata
Dra. Júlia de Fátima Leite S. Ferreira
Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango
Dra. Maria da Imaculada Lourenço C. Melo
Dr. Raul Carlos Vasques Araújo
Dr. Simão Sousa Victor
Dra. Teresinha Lopes