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ACÓRDÃO N.º 470/2017

 

PROCESSO Nº 529-B/2016

(Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade)

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

I. RELATÓRIO

Ana Maria Martins Pinto de Andrade, com os demais sinais especificados nos autos, interpôs, com fundamento na alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08 de 17 de Junho - Lei do Processo Constitucional, LPC, o presente Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade, tendo como base a seguinte argumentação:

  1. Por concessão do Estado Angolano, a Recorrente é legítima concessionária e possuidora de um prédio rústico com a dimensão de seis (6) hectares, situado em Viana, no perímetro do Gabinete de Desenvolvimento e Aproveitamento Hidráulico do Kikuxi (GADAHKI).
  2. Em atenção à finalidade para a qual foi cedido o espaço, a Recorrente transformou-o em quinta, com plantações de vários produtos e um pomar. Edificou no terreno uma pequena residência para os funcionários da quinta e seus familiares.
  3. O retro-mencionado espaço foi alvo de tentativas de invasão durante anos, como resultado e após ter apenas uma parte vedada, a Recorrente decidiu cercar todo o perímetro que compõe o imóvel, colocou portões e um corpo de seguranças para evitar futuras invasões e não só.
  4. Entretanto, no dia 14 de Maio de 2014, a Recorrente foi surpreendida, com uma diligência judicial de restituição de posse, tendo por objecto o espaço então transformado em quinta por si.
  5. Tal diligência devidamente acompanhada de força pública, conduziu à retirada dos funcionários que habitavam a quinta, bem como do corpo de segurança que a protegia.
  6. Nesta ocasião, ficou a saber que tal procedimento era resultado de uma providência cautelar de restituição provisória de posse que corria os seus trâmites na 4.ª Secção do Cível e Administrativo do Tribunal Provincial de Luanda.
  7. A referida providência cautelar, então deferida, foi requerida pelo cidadão Sampaio António que, por força daquela, passou a exercer a posse sobre o terreno.
  8. Face ao quadro, a Recorrente lançou mão aos mecanismos jurídicos a seu dispor para proteger os seus direitos.
  9. Intentou uma providência cautelar de embargo de obra nova, porquanto, segundo os fundamentos aduzidos nos articulados, o senhor Sampaio António estava a realizar obras no espaço em litígio;
  10. A providência acima referida foi indeferida liminarmente pelo Tribunal Provincial de Luanda (fls. 45 e ss), ao que a Recorrente interpôs recurso no Tribunal Supremo.
  11. O Tribunal Supremo julgou deserto o recurso referido no ponto anterior e declarou extinta a instância pois, apesar de notificada, a Recorrente não pagou os preparos, nem mesmo quando foi estabelecido o pagamento em dobro, contrariando desta forma o disposto no artigo 134.º do Código de Custas Judiciais.
  12. Como consequência, interpôs junto do Tribunal Constitucional o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade apresentando para tal a seguinte fundamentação:
  1. Pagou os preparos iniciais acrescidos de multa dentro do prazo, isso a 22 de Fevereiro de 2016, na medida em que tinha sido notificada para tal durante o período de férias judiciais;
  2. O prazo de 5 dias para o pagamento dos preparos, consagrado no artigo 134.º do Código de Custas Judiciais, é processual, e como tal, está sujeito às regras contidas no artigo 144.º do Código de Processo Civil adiante CPC;
  3. O disposto no artigo 144.º do CPC é aplicável ao prazo para pagamento de encargos processuais que seja condição de seguimento de recurso;
  4. Por aplicação dos artigos 296.º e 279.º, todos do CPC, existe uma equiparação legal das férias judiciais aos domingos e feriados, há que transferir, por isso, para o primeiro dia útil após as férias judicias, o prazo para o pagamento dos preparos;
  5. A Recorrente foi notificada para pagar os preparos iniciais a 18 de Janeiro de 2016, como consequência, o pagamento deveria ser efectuado até ao primeiro dia útil após o término das férias judiciais. Ao decidir como decidiu, o Juiz Conselheiro praticou um acto ilegal;
  6. Tal despacho configura uma má aplicação das normas em causa e viola normas consagradas na Constituição da República de Angola, doravante CRA;
  7. Particularmente as normas que impõem a conformação da actuação dos Tribunais à lei e a CRA;
  8. Assim sendo, o despacho proferido pelo Venerando Tribunal Supremo, afigura-se ilegal e inconstitucional, por violação do n.º 2 do artigo 6.º, n.ºs 1 e 2 do artigo 177.º, 175.º e 226.º todos da CRA.

A Recorrente termina pedindo ao Tribunal Constitucional, a revogação do Despacho impugnado.

O processo foi à vista do Ministério Público.

Foram colhidos os vistos legais.

II. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL

O presente recurso foi interposto nos termos e com os fundamentos na alínea a) do artigo 49.° da Lei n.° 3/08, de 17 de Junho, LPC, segundo o qual “podem ser objecto de recurso as sentenças dos demais tribunais que contenham fundamentos de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstas na Constituição da República de Angola”, recurso que, nos termos do parágrafo único do artigo 49.° da LPC, estabelece o “prévio esgotamento nos tribunais comuns e demais tribunais, dos recursos ordinários legalmente previstos”, o que não se verificou.

O artigo 679.º do Código do Processo Civil, CPC, elenca os despachos que não admitem recursos. Pela leitura deste artigo se pode facilmente concluir que o despacho ora impugnado (n.º 3 do artigo 292.º do CPC) foi proferido pelo Relator do processo (no Venerando Tribunal Supremo) e, nesses casos, quando a parte se considere prejudicada por esse despacho pode requerer que sobre a matéria recaia um Acórdão para esgotar a cadeia de recurso da jurisdição comum, conforme o disposto nos nºs 3 e 4 do artigo 700.º do CPC.

Assim, a Recorrente tinha à sua disposição mais um mecanismo judicial para fazer valer a sua pretensão e não o fez. Como resultado não está esgotada a cadeia de recursos ordinários cabíveis, como pressuposto para a interposição de um recurso extraordinário de inconstitucionalidade (vide Acórdão n.º 331/2014).

Nestes termos, o Tribunal Constitucional considera-se incompetente em razão da hierarquia para analisar o pedido apresentado pela Recorrente (vide Acórdão n.º 397/2016).

DECIDINDO

Neste termos,

Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em:  

Custas pela Recorrente nos termos do regime geral de custas (Código das Custas Judiciais e artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional).

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 12 de Dezembro de 2017.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dra. Guilhermina Prata (Vice-presidente) 

Dr. Américo Maria de Morais Garcia

Dr. António Carlos Pinto Caetano de Sousa (Relator) 

Dr. Carlos Magalhães

Dra. Júlia de Fátima Leite da S. Ferreira

Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango

Dra. Maria da Imaculada Lourenço da C. Melo (declarou-se impedida).

Dr. Raul Vasques Araújo

Dr. Simão de Sousa Vítor

Dra. Teresinha Lopes