ACÓRDÃO N.º 500/2018
PROCESSO N.º 622-D/2018
Relativo a Partidos Políticos e Coligações - Recurso para o Plenário
Em nome do povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. RELATÓRIO
A Comissão Instaladora do Partido Pomba Branca – PPB, melhor identificada nos autos, aqui representada pelo seu Coordenador, António Francisco Hebo, veio interpor o presente recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional do despacho do Juiz Conselheiro Presidente, proferido a 19 de Janeiro de 2018, que rejeitou o seu pedido de inscrição e cancelou o seu credenciamento.
O despacho de rejeição proferido pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional tem como fundamento o facto de a Comissão Instaladora não ter apresentado a este Tribunal os elementos essenciais definidos para a inscrição do PPB, nos termos e para efeitos da alínea b) do artigo 16.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro - Lei dos Partidos Políticos (LPP), designadamente:
A Recorrente, inconformada com o despacho de rejeição do pedido, interpôs o presente recurso para o Plenário deste Tribunal, alegando, no essencial, que:
A Recorrente termina afirmando que não está de acordo com a decisão do Juiz Presidente deste Tribunal, e veio interpor o presente recurso pelo facto do despacho de rejeição do pedido conter inverdades, injustiças e clara violação da Constituição e da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro - Lei dos Partidos Políticos (LPP).
O processo foi à vista do Ministério Público.
Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.
II. COMPETÊNCIA
Nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 14.º da LPP, das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 63.º e do n.º 1 do artigo 64.º, ambos da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional – LPC, compete a este Tribunal Constitucional credenciar comissões instaladoras e inscrever partidos políticos mediante despacho do Venerando Juiz Conselheiro Presidente.
Ao abrigo do n.º 1 do artigo 18.º da Lei dos Partidos Políticos, cabe recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional o “ acto do Presidente do Tribunal Constitucional que ordene ou rejeite a inscrição de um partido político”.
A Lei n.º 2/08, de 17 de Junho - Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC) refere, na sua alínea i) do artigo 16.º (com a redacção dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 24/10, de 3 de Dezembro - Lei de Alteração à Lei n.º 2/08), que ao Tribunal Constitucional compete, em geral, administrar a justiça em matéria jurídico-constitucional, nomeadamente “ (...) verificar a legalidade na formação de partidos políticos, bem como declarar a sua extinção, nos termos da Lei dos Partidos Políticos”.
É, pois, competente o Plenário do Tribunal Constitucional para apreciar e decidir sobre o presente recurso, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 64.º da Lei dos Partidos Políticos.
III. LEGITIMIDADE
A Comissão Instaladora do Partido Pomba Branca, enquanto parte vencida, é a interessada em que o Plenário aprecie o seu pedido, pelo que, nos termos do n.º 2 do artigo 18.º da Lei dos Partidos Políticos e do artigo 26.º do Código de Processo Civil (CPC), tem legitimidade para interpor o presente recurso.
IV. OBJECTO
O presente recurso tem por objecto verificar se o Despacho do Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, de 19 de Janeiro de 2018, que rejeitou a inscrição do Partido Pomba Branca e, consequentemente, determinou a extinção da sua Comissão Instaladora, violou ou não a Constituição e a Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro.
V. APRECIANDO
A Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro – Lei dos Partidos Políticos estabelece, no n.º 1 do artigo 14.º que “a inscrição de um partido político é feita a requerimento de, no mínimo 7.500 cidadãos maiores de 18 anos e no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos, devendo, entre os requerentes, figurar, pelo menos, 150 cidadãos residentes em cada uma das 18 províncias que integram o país”.
No n.º 2 do citado artigo estabelece-se o conjunto de documentos que devem acompanhar o requerimento de inscrição de um partido político. Assim, os cidadãos que requeiram a sua inscrição devem remeter ao Tribunal Constitucional os documentos enumerados de forma taxativa e cumulativa no sobredito artigo, dentre os quais, enfatizamos as fotocópias dos bilhetes de identidade ou dos cartões de eleitor dos 7.500 cidadãos subscritores e os respectivos atestados de residência.
Feita a análise aos documentos e às assinaturas apresentadas pela Recorrente, este Tribunal identificou várias irregularidades, relacionadas com vícios na documentação dos subscritores, maxime no que diz respeito a assinaturas diferentes das constantes nos documentos apresentados, assinaturas não correspondentes aos subscritores, bem como à falta de autenticidade dos documentos (fls. 45 a 54).
Entretanto, identificadas as insuficiências, o Juiz Conselheiro Presidente cessante proferiu um despacho de aperfeiçoamento no processo convidando a Recorrente a suprir as irregularidades detectadas (fls. 13 a 15).
Para tanto, foi prorrogado o prazo inicialmente concedido por mais (3) três meses, com a finalidade de, nesse horizonte temporal, colmatarem-se todas as insuficiências de que padecia o acervo documental - os símbolos (bandeira e insígnia), que apresentavam semelhanças flagrantes com os de outras comissões instaladoras e de partidos políticos existentes ou já extintos, o que levou a Recorrente a proceder à sua correcção (fls. 30).
Ora, do despacho de aperfeiçoamento, em momento algum do processo a Recorrente reclamou, só o faz em sede do presente recurso, pelo que, aferindo as razões expostas se depreende a sua convicção e aquiescência quanto às suscitadas anomalias. Daí que, em obediência ao cumprimento do referido despacho supriu parcialmente as irregularidades detectadas, com a entrega de 3.659 assinaturas no dia 4 de Agosto de 2017 (fls. 16).
A questão a apreciar é a de saber se estão preenchidos os requisitos e pressupostos legais para a inscrição do PPB.
a. Sobre a Recontagem e Reverificação das Assinaturas
Cabe dizer que este formalismo da entrega das assinaturas foi feito faseadamente, sendo que as últimas foram entregues em decorrência do convite de aperfeiçoamento feito por este Tribunal que culminou com um processo de recontagem de 12.239 assinaturas, realizado em Janeiro do corrente ano, tendo a Recorrente apresentado no total 5.132 assinaturas conforme e 7.107 não conforme, como ilustra o quadro abaixo:
PROVÍNCIA |
CONFORME |
NÃO CONFORME |
BENGO |
163 |
202 |
MALANJE |
182 |
268 |
LUANDA |
3.015 |
4.356 |
CABINDA |
103 |
184 |
HUÍLA |
86 |
243 |
NAMIBE |
67 |
118 |
LUNDA-SUL |
114 |
149 |
LUNDA-NORTE |
97 |
129 |
BIÉ |
115 |
129 |
BENGUELA |
95 |
122 |
HUAMBO |
204 |
169 |
MOXICO |
97 |
178 |
CUANZA-SUL |
140 |
141 |
CUANZA-NORTE |
157 |
113 |
UÍGE |
99 |
178 |
ZAIRE |
132 |
121 |
CUANDO-CUBANGO |
152 |
137 |
CUNENE |
114 |
170 |
TOTAL |
5.132 |
7.107 |
Como se pode verificar a partir do quadro supra, das 7.107 assinaturas consideradas não conforme, 3.233 contêm nomes que não pertencem aos titulares dos bilhetes de identidade ou cartões de eleitores juntos ao processo e 3.874 fichas de subscrição contêm assinaturas que não correspondem aos documentos de identificação, muitos dos quais repetidos, rasurados e ilegíveis (fls. 45 a 54).
Pode-se também verificar que a Comissão Instaladora do Partido Pomba Branca só preencheu os requisitos legalmente estabelecidos de apresentação de 150 assinaturas em 6 províncias, nomeadamente, Bengo (163), Malange (182), Luanda (3.015), Huambo (204), Cuanza-Norte (157) e Cuando-Cubango (152), deixando de fora as demais.
Assim, não se deixa de reconhecer, com acerto, que pese embora a oportunidade oferecida à Recorrente, por este Tribunal, para aperfeiçoamento das peças documentais, esta não foi suficientemente zelosa no sentido de prover integralmente a sua correcção, ferindo, deste modo, os princípios da legalidade, da representatividade mínima e da subscrição única fixada na Constituição da República de Angola (CRA) e na Lei dos Partidos Políticos.
b. Sobre a Autenticidade Documental
In casu, a Recorrente não fez junção dos atestados individuais de residência, pelo contrário, apresentou declarações colectivas de residência de cidadãos das províncias do Bengo, Luanda, Cuanza-Norte, Cuanza-Sul, Malange, Uíge, Benguela, Lunda-Sul, Lunda-Norte, Moxico, Cunene, Cuando-Cubango, Huíla, Zaire, Namibe, Huambo, Bié e Cabinda.
Contudo, das 18 declarações colectivas de residência apresentadas, apenas 3 contêm supostas assinaturas dos Administradores Municipais e Governadores de Províncias, sendo que as restantes foram supostamente assinadas por Secretários dos Governos provinciais, “Coordenadores Adjuntos” e Chefes de Secretaria, sem, no entanto, terem competência para a prática destes actos.
Constatou-se, ainda, que algumas declarações colectivas de residência, contêm selos brancos contrafeitos de uma suposta Administração Municipal do Cazenga.
Porém, trazendo à colação a matéria dos autos, verifica-se a existência de fortes indícios de falsificação das assinaturas constantes da Declaração n.º 12201/2016, emitida pelo Governo da Província do Bengo e da assinatura e carimbo da Declaração n.º 432/2016, emitida pela Administração do Cazenga (Luanda), tendo o Ministério Público sido notificado pelo Tribunal Constitucional para a instauração do competente procedimento de averiguação (fls. 62).
De acordo com as disposições conjugadas da alínea a) do n.º 2 do artigo 17.º da CRA e do artigo 5.º da Lei dos Partidos Políticos, os partidos políticos devem possuir carácter e âmbito nacionais.
É por causa desta obrigação jurídico-constitucional e legal, que os partidos políticos devem fazer prova, no momento da sua inscrição, da recolha válida e fiel de assinaturas recolhidas nas 18 províncias do País, com vista à validação das respectivas subscrições. Porém, a Recorrente não cumpriu esse imperativo legal.
Em boa verdade, a Recorrente, em sua defesa, apresenta argumentos equivocados, como por exemplo, confundir atestado de residência com declarações de residências referindo ainda que apresentou 21 declarações colectivas de residência, sendo 17 declarações provenientes das 17 províncias e 4 declarações provenientes de 4 municípios de Luanda, nomeadamente do Cazenga, Cacuaco, Kilamba Kiaxi e Viana, que todas são verdadeiras, sem apresentar provas idóneas.
Ora, na situação presente são particularmente relevantes e notórios os fortes indícios de falsidade suscitados por este Tribunal Constitucional, em face dos documentos inválidos, não fiáveis, arrolados pela Recorrente carecendo, por isso, de real autenticidade, designadamente em relação à Declaração n.º 432/2016, emitida pela Administração Municipal do Cazenga, em que manifestamente vem esta instituição rejeitar, in limine, ter emitido a referida declaração (fls. 74), esclarecendo que em documentos do género utiliza carimbos e não selos brancos. Do mesmo modo, em relação à Declaração n.º 12201/2016, emitida pelo Governo da Província do Bengo (fls. 49).
Depois do exposto, supra, e das provas arroladas, é entendimento deste Tribunal que:
Assim, tendo em linha de conta o artigo 14.º da Lei dos Partidos Políticos, que estabelece os requisitos necessários para a constituição de um partido político, estes devem ser observados cumulativamente, sendo que a falta de um deles implica o não reconhecimento do direito requerido, pelo que bem andou o Juiz Conselheiro Presidente ao exarar o despacho recorrido, nos termos da alínea b) do artigo 16.º da citada Lei.
Como ficou demonstrado e fundamentado, os requisitos que determinam a admissão ou rejeição do pedido de inscrição de um partido político novo, são os previstos na CRA e na Lei dos Partidos Políticos. Neste contexto lógico, é indubitável que o despacho recorrido assentou o seu juízo observando o disposto nos referidos diplomas legais sobre esta matéria.
Pelo exposto, o Tribunal Constitucional conclui que o despacho de rejeição do pedido de inscrição do Partido Pomba Branca com fundamento na “falta dos elementos essenciais” para a sua constituição nos termos da alínea b), do artigo 16.º da Lei dos Partidos Políticos e, em consequência, decretou o cancelamento da sua Comissão Instaladora está em conformidade com a CRA e com a lei.
Nestes termos, resulta evidente que não existe violação da Constituição, da Lei nem situações de injustiça ou inverdades que lesem os direitos, liberdades e garantias constitucionais da Recorrente, tal como a mesma pretendeu fazer crer nas suas alegações.
DECIDINDO
Nestes termos
Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em:
Sem custas nos termos do artigo 15.º, da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional.
Notifique
Tribunal Constitucional, em Luanda, 19 de Setembro de 2018.
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente)
Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente)
Dr. Américo Maria de Morais Garcia
Dr. Carlos Magalhães
Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto
Dra. Júlia de Fátima Leite Silva Ferreira (Relatora)
Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango
Dr. Simão de Sousa Victor
Dra. Teresinha Lopes