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ACÓRDÃO N.º 533/2019

 

PROCESSO N.º 680- D/2018

Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade – Habeas Corpus

Em nome do povo, acordam em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

I. RELATÓRIO

José Arsénio Manuel, com os demais sinais de identificação nos autos, vem junto desta instância interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Acórdão do Tribunal Supremo, proferido na 2.ª Secção da Câmara Criminal, no âmbito do Processo n.º 441/18.

O Recorrente requereu junto do Tribunal Supremo uma providência de “habeas corpus”, pedindo a revogação da medida de coacção pessoal (prisão domiciliária) a que foi submetido e, consequentemente, pediu a manutenção das anteriores medidas de coacção pessoal (menos gravosas), ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 315.º e ss do Código de Processo Penal (CPP), 18.º, 19.º e 22.º todos da Lei n.º 25/15 de 18 de Setembro, Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal (LMCPP).

O Tribunal Supremo, por sua vez, negou provimento à providência requerida.

Insatisfeito com a douta decisão veio interpor o presente recurso com base nas seguintes alegações:

  1. A decisão, objecto do presente recurso, viola os artigos 6.º, 23.º, 29.º, 67.º n.º 1 e 2, 68.º,72.º, 175.º e 179.º todos da CRA, conjugados com os artigos 315.º do CPP e 18.º, 19.º e 22.º todos da Lei n.º 25/15, de 18 de Setembro (LMCPP);
  2. Ao negar a providência extraordinária de habeas corpus requerida pelo Recorrente, o tribunal “a quo” não observou os artigos 18.º, 19.º e 22.º, que proíbem a agravação fora dos marcos da lei…;
  3. A decisão recorrida viola, em consequência, princípios e direitos fundamentais constantes na Constituição, v.g., o da legalidade, por violação da lei e o da igualdade, porque, ao manter esta decisão, estaremos perante um tratamento desigual do Recorrente em relação às demais pessoas na mesma situação, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, porque coarctado o seu direito a um julgamento justo e de acordo com a lei, limitado o seu direito de recorrer, impedido de exercer o seu direito fundamental à proveniência de habeas corpus.

O Recorrente termina as suas alegações pedindo que seja declarada a inconstitucionalidade da decisão do Tribunal Supremo e, consequentemente, que seja revogada a decisão que agravou a medida de coacção pessoal anteriormente aplicada.

O processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA

O presente recurso foi interposto nos termos e com os fundamentos das disposições combinadas da alínea m) do artigo 16.º da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho, Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC) e da alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC).

 O artigo 53.º da LPC estabelece que a competência para decidir os recursos extraordinários de inconstitucionalidade previstos no artigo 49.º da presente lei é do Plenário de Juízes do Tribunal Constitucional.

Assim, o Tribunal é competente para conhecer e decidir sobre o presente recurso, por se achar esgotada a cadeia recursória, nos termos do § único do artigo 49.º da LPC. 

III. LEGITIMIDADE

Nos termos da alínea a) do artigo 50.º da LPC, têm legitimidade para interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional “as pessoas que, de acordo com a lei reguladora do processo em que a sentença foi proferida, tenham legitimidade para dela interpor recurso ordinário”.

O Recorrente foi requerente da providência de “habeas corpus” no Processo n.º 441/18, tendo este legitimidade para interpor o presente recurso.

IV. OBJECTO

O presente recurso tem por objecto a apreciação da constitucionalidade do aresto do Tribunal Supremo que negou provimento à providência de “habeas corpus”, prolatado no Processo n.º 441/18.

V. APRECIANDO

O Recorrente sustenta, nas suas alegações, que o Acórdão do Venerando Tribunal Supremo, ao negar provimento à sua providência de “habeas corpus”, violou os princípios da legalidade, da igualdade e do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva.

Não concordando com o aresto do Tribunal Supremo, o Recorrente veio junto desta instância, interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade pedindo que seja declarada a inconstitucionalidade do Acórdão e, concomitantemente, revogada a decisão que agravou a medida de coacção pessoal e, consequentemente, que o Recorrente seja colocado em liberdade ou, em alternativa, que seja substituída a prisão domiciliar por outra ou outras mais brandas.

Nos termos do artigo 68.º da Constituição da República de Angola (CRA) “todos têm direito à providência de habeas corpus contra abuso de poder, em virtude de prisão ou detenção ilegal…”

O “habeas corpus” é um meio jurisdicional de defesa do direito à liberdade individual, a lançar mão, em caso de prisão ou detenção ilegal e tem carácter de urgência, que se traduz numa das garantias dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos.

O § único do artigo 315.º do Código de Processo Penal (CPP) estabelece que: “Só pode haver lugar à providência referida neste artigo quando se trate de prisão efectiva e actual, ferida de ilegalidade por qualquer dos seguintes motivos”;

  1. Ter sido efectuado ou ordenado por quem para tanto não tenha competência legal;
  2. Ser motivada por facto pelo qual a lei não autoriza a prisão;
  3. Manter-se além dos prazos legais para a apresentação em juízo e para a formação de culpa;
  4. Prolongar-se além do tempo fixado por decisão judicial para a duração da pena ou medida de segurança ou da sua prorrogação.

Compulsados os autos, constata-se que, no caso em apreço, não se verifica nenhum dos requisitos estabelecidos no § único do artigo supracitado.

Como já foi acima referido, o “habeas corpus”, traduz-se numa providência extraordinária e excepcional, todavia, os seus pressupostos e requisitos são estabelecidos taxativamente pelo legislador ordinário, de modo a evitar o desvirtuamento da sua natureza excepcional, “ipso facto” não é procedente a referida providência quando os fundamentos estejam “extra murus” do § único do artigo 315.º do CPP.

Ora, visto que os requisitos para se desencadear a providência extraordinária de “habeas corpus” não estão presentes, a pretensão do Recorrente não é acolhível.

A- Sobre a violação do princípio da igualdade

O princípio da igualdade consubstancia-se no dever de dar tratamento jurídico idêntico a situações iguais e tratamento diferente a situações desiguais.

Ainda que hajam co-arguidos a beneficiar de medidas de coacção pessoal mais brandas, isto não significa que tenha havido violação do princípio em causa.

Importa referir que as medidas de coacção a aplicar devem ser as necessárias e adequadas às exigências do caso concreto e proporcionais à gravidade da infracção. As medidas de coacção pessoal podem ser agravadas quando se considerem inadequadas ou insuficientes e existirem fortes indícios da prática de um crime doloso, punível com pena de prisão superior a 3 (três) anos.

B- No que respeita à violação do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva.

Alega o Recorrente que houve violação do seu direito de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, porém, não curou de precisar em que medida lhe foi negado este direito.

No âmago daquele direito, está a necessidade de os cidadãos terem o acesso à informação jurídica, aos tribunais, ao patrocínio judiciário e o direito a que a decisão da sua causa seja tomada em tempo razoável e útil.

Consta dos autos que o Recorrente requereu a providência de “habeas corpus” junto do Venerando Tribunal Supremo, tendo este Tribunal decidido dentro dos parâmetros da lei e de forma imparcial, sem lhe terem criado nenhum empecilho.

Assim o Tribunal Constitucional entende que não houve violação do seu direito de acesso, bem como de nenhum princípio, direito, liberdade e garantia constitucional.

Conclui este Tribunal que o Venerando Tribunal Supremo não incorreu em nenhuma inconstitucionalidade, ao contrário do que o Recorrente suscita nas suas alegações.

DECIDINDO

Nestes termos,

Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário o Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional em:

Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional.

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 26 de Fevereiro de 2019.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS 

Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente) 

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente) 

Dr. Américo Maria de Morais Garcia

Dra. Júlia de Fátima Leite Silva Ferreira

Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango (Relatora) 

Dr. Raul Carlos Vasques Araújo

Dra. Teresinha Lopes