Loading…
Acórdãos > ACÓRDÃO 563/2019

Conteúdo

ACÓRDÃO N.º 563/2019

 

PROCESSO N.º 640-B/2016

(Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade) 

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional: 

I. RELATÓRIO

Cláudia Cristina Brandão e Silva Flora interpôs recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Despacho proferido a fls. 107 dos autos de Intervenção Principal Provocada com o n.º 57/2017, da Sala do Cível e Administrativo do Tribunal Provincial de Benguela, alegando, no essencial, que:

  1. Pretende, com o presente recurso, buscar o amparo do Tribunal Constitucional para decisões judiciais tomadas pelo Tribunal Provincial de Benguela que afectaram, de forma irremediável e definitiva, a sua meação (no imóvel objecto da acção principal e que é propriedade de Rogério Paulo Colaço Flora e da aqui Recorrente) e o seu direito de propriedade;
  2. O Tribunal Provincial de Benguela cometeu omissões graves que resultaram na penhora da sua meação no imóvel já mencionado na alínea anterior e na promoção da venda judicial da sua morada de família, nomeadamente:
    1. A fls. 51 dos autos de intervenção provocada, decidiu, erradamente, que o bem imóvel oferecido como garantia real na hipoteca voluntária constituída é propriedade de seus sogros Rogério Vital Flora e Maria Helena Colaço Flora;
    2. Indeferiu, a fls.77 e verso, o requerimento de recurso ao Tribunal Supremo por alegada extemporaneidade, contrariando jurisprudência firmada pelo Venerando Tribunal Constitucional sobre a matéria, a 8 de Junho de 2016;
    3. Prosseguiu com os autos até à execução: sem liquidar a dívida, fixar o seu valor ou observar os requisitos da livrança avalizada por seu cônjuge; sem separar as garantias oferecidas por cada contrato de mútuo; sem permitir a moratória constante do n.º 1 do artigo 64.º do Código de Família (CF) ou possibilitar a realização da previsão legal no n.º 2 do artigo 825.º do Código de Processo Civil (CPC);

c. O princípio do esgotamento dos recursos ordinários como condição precedente para este tipo de recurso não se pode aplicar ao caso sub judice por este direito ter sido negado à aqui Recorrente com fundamento em extemporaneidade;

d. A justiça só poderá ser feita se os direitos violados e os princípios ofendidos forem, por via do amparo, apreciados pelo Venerando Tribunal Constitucional, único órgão que tem legitimidade para conceder esse amparo.

A Recorrente concluiu requerendo que seja revitalizado o requerimento de fls. 58, objecto do despacho de indeferimento de fls. 77, porque o fundamento utilizado para o substanciar da alegada extemporaneidade configura negação do acesso à justiça, uma vez que o fundo da causa pretendida com o requerimento de recurso não chegou a ser analisado pelo Tribunal por impedimentos relativos ao ritual do processo.

E, ainda, que seja anulada a hipoteca voluntária que impende sobre a sua meação no imóvel, porque constituída contra legis e registada sem o seu consentimento expresso.

O processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA

 O presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade foi impetrado nos termos e com os fundamentos da alínea a) do artigo 49.º da LPC, que estabelece:

“Podem ser objecto de recurso extraordinário de inconstitucionalidade, para o Tribunal Constitucional:

  1. as sentenças dos demais tribunais que contenham fundamentos de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição da República de Angola;
  2. actos administrativos definitivos e executórios que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição da República de Angola
  • "Único: O recurso extraordinário de inconstitucionalidade tratado na presente secção só pode ser interposto após prévio esgotamento nos tribunais comuns e demais tribunais, dos recursos ordinários legalmente previstos”.

Assim, da alínea a) e do § único do artigo 49.º da LPC infere-se que somente as sentenças finais dos demais tribunais que contenham fundamentos de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias e que tenham esgotado, previamente, os recursos ordinários legalmente previstos (nos Tribunais comuns) podem ser objecto de recurso extraordinário de inconstitucionalidade.

No caso sub judice, a Recorrente, inconformada com o Despacho proferido a fls. 107 dos autos de Intervenção Principal Provocada, por extemporaneidade, intentou recurso directamente ao Tribunal Constitucional, quando o esgotamento do presente recurso verificar-se-ia com a decisão que fosse proferida pelo Tribunal Supremo, sobre o recurso interposto, por ser este o Tribunal de última instância da jurisdição comum.

De enfatizar que relativamente ao despacho que indeferiu o requerimento de interposição de recurso, tinha a Recorrente a possibilidade de reclamar, nos termos do n.º 1 do artigo 688.º do CPC, para fazer valer a sua pretensão, o que a aqui Recorrente não fez.

Em boa verdade, o recurso não foi admitido por inércia da Recorrente que, não só incumpriu os prazos legais como, em momento algum, invocou justo impedimento ou procedeu ao pagamento das multas devidas, pelo que não pode pretender que este Tribunal substitua o Tribunal Supremo, em matérias que escapam à sua competência, sob o pretexto de alegada violação de direitos fundamentais constitucionalmente consagrados.

Dito isto, importa frisar que o desrespeito do prévio esgotamento dos recursos cabíveis torna o Tribunal Constitucional incompetente para apreciar o presente recurso. 

DECIDINDO

Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional em: 

Custas pela Recorrente nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, LPC.

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 31 de Julho de 2019.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente) 

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente e Relatora) 

Dr. Américo Maria de Morais Garcia 

Dr. António Carlos Pinto Caetano de Sousa

Dr. Carlos Magalhães

Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto

Dra. Teresinha Lopes (declarou-se impedida)