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ACÓRDÃO N.º 573/2019

 

PROCESSO N.º 711-C/2019

Processo Relativo a Partidos Políticos e Coligações

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

I - RELATÓRIO

Zissala Mamona Pululu e outros, devidamente identificados nos autos, vieram ao Tribunal Constitucional impugnar e requerer a nulidade da  Reunião Ordinária do Comité Central do PDP-ANA, convocada e presidida por Simão Makazu, Presidente do Partido PDP-ANA, realizada no dia 12 de Março de 2019, em Luanda, por alegadas irregularidades jurídico- estatutárias. 

Os Requerentes apresentaram, em síntese, as seguintes alegações:

  1. O Presidente do Partido PDP-ANA convocou, para o dia 12 de Março de 2019, a realização da III Reunião Ordinária do Comité Central.
  2. A Convocatória só foi distribuída na data da realização do evento, desrespeitando a formalidade prevista nos seus Estatutos, porquanto a informação foi passada de boca-a-boca, impossibilitando que muitos dos seus membros tomassem conhecimento.
  3. No Congresso realizado no ano de 2015 foram eleitos 123 membros para o Comité Central, trinta (30) encontravam-se presentes e cinco (5) falecidos na altura, o que impossibilitou que fosse atingido o quorum de 2/3, conforme estipula o artigo 40.º dos Estatutos do Partido.
  4. Para encobrir a desconsideração dos Estatutos e usando da sua posição de Presidente do Partido, Simão Makazu desrespeitou o artigo 29.º dos Estatutos, ao incorporar no Comité Central, militantes que convidou à reunião para fazerem parte da lista de membros sob sua obediência.
  5. No decorrer da reunião, suspendeu à revelia o Secretário-Geral, por um período de 12 meses contrariando os artigos 123.º e 128.º dos Estatutos, por se tratar de um acto da competência da Comissão Nacional de Disciplina, que não foi tida nem achada;
  6. E, sem motivo aparente, um ano depois, alega de viva voz “quebra de confiança” e decide arrogantemente exonerar o Secretário-Geral criando descontentamento aos membros do Partido.
  7. Na senda das violações dos Estatutos, indicou para ocupar o cargo um militante não membro do Comité Central, o senhor Angelino António Vunge.
  8. O relatório financeiro apresentado não justifica o uso dado às verbas provenientes da Coligação CASA-CE, estando a escamotear valores avultados, alegando falsos motivos para receber valores junto da CASA-CE que o Partido desconhece (trata-se de um soma de Kz. 5 000 000), montante que diz ter pago dívida contraída pelo Partido para a realização do Congresso, no ano de 2015, o que não corresponde com a verdade.
  9. Constam do relatório financeiro incongruências, referentes ao período de 2016 a 2018, e ao empossamento do Comité Provincial do Bengo, ocorrido no mês de Março de 2019.
  10. O propósito alegado é o facto de não se ter mencionado a verba de Kz 8 049 512,50 (oito milhões, quarenta e nove mil quinhentos e doze kwanzas e cinquenta cêntimos) referente ao mês de Janeiro, nunca revelado ao Partido.

Os Requerentes concluem requerendo que seja declarada a nulidade da III Reunião Ordinária do Comité Central, realizada aos 12 de Março de 2019;

E averiguado junto da CASA-CE os valores atribuídos ao Partidos PDP-ANA, para aferição do declarado no Relatório Financeiro apresentado.

O processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir. 

II - COMPETÊNCIA

O Tribunal Constitucional tem competência para conhecer processos de impugnação de deliberações de órgãos de partidos políticos ou de resolução de quaisquer conflitos internos que resultem da aplicação de Estatutos e Convenções Partidárias, conforme as disposições combinadas da alínea c) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República de Angola (CRA), do artigo 30.º da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho – Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC) da alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC) e do n.º 2 do artigo 29.º da Lei n.º 22/10 de 3 de Dezembro - Lei dos Partidos Políticos (LPP).

 III – LEGITIMIDADE

Nos termos do artigo 26.º do Código do Processo Civil (CPC), aplicável ex vi do artigo 2.º da LPC, os Requerentes na qualidade de militantes do PDP - ANA e membros do Bureau Político e do Comité Central, têm interesse directo de demandar e contradizer, pelo que se lhes assiste legitimidade no presente processo. 

IV - OBJECTO

O objecto do presente recurso é a verificação da conformidade jurídico-legal e estatutária da III Reunião Ordinária do Comité Central do PDP-ANA, realizada no dia 12 de Março de 2019. 

V – APRECIANDO

Os Requerentes Zissala Mamona Pululu e outros, na qualidade de membros do Bureau Político do Comité Central do Partido PDP-ANA, impugnaram a validade da III Reunião Ordinária do Comité Central e deliberações saídas daquela reunião.

Os Requerentes invocam sistemáticas violações aos Estatutos, cuja enunciação sintética passa pelos seguintes fundamentos:

  1. A não validade da III Reunião Ordinária do Comité Central, de 12 de Março de 2019 e incumprimento de formalidade na entrega da convocatória;
  2. Inserção na lista do Comité Central, por parte do Presidente do Partido, de membros não eleitos pelo Congresso;
  3. Destituição ilegal do Secretário-Geral do Partido;
  4. Utilização indevida dos fundos do Partido.

A. Sobre a não validade da III Reunião Ordinária do CC, de 12 de Março de 2019, e incumprimento de formalidade na entrega da convocatória

Os Requerentes alegam que a referida reunião registou a presença de apenas 30 membros do Comité Central, o que impossibilitou que fosse atingido o quórum de 2/3.

Ora, a acta da III Reunião Ordinária do Comité Central, que foi entregue neste Tribunal, faz prova bastante de que estiveram presentes 98 membros, dos 123 efectivos, o que permite concluir que foi observado o quorum de participação e deliberação, nos termos da alínea b) do artigo 8.º e do artigo 40.º, ambos dos Estatutos do Partido.

Em relação à formalidade no envio das convocatórias, este Tribunal constata que os Estatutos do Partido nada referem quanto a esta questão, sendo competência do Congresso regulamentar sobre essa matéria.

Todavia, o modo de convocação às reuniões do Comité Central pode obedecer a critérios convencionais, que melhor se ajustem ao propósito do Partido, tanto é assim que, no caso presente, se verifica a participação da maioria dos membros do Comité Central na respectiva reunião convocada. 

Portanto, é de considerar que não houve desrespeito aos Estatutos, quer quanto ao quorum necessário para a validade da III Reunião Ordinária do Comité Central, quer quanto à concretização da mesma, com a participação dos seus legítimos membros.

B. Sobre a inserção na lista do CC, por parte do Presidente do Partido, de membros não eleitos pelo Congresso

Um dos princípios essenciais à constituição e funcionamento dos partidos políticos é o da sua organização e funcionamento democráticos. Isto é, a obrigatoriedade do respeito dos pressupostos da estrutura democrática dos partidos políticos: da não discriminação de qualquer espécie, no acesso ao partido, na aprovação dos estatutos e programas pelos órgãos representativos e pela eleição periódica dos titulares dos órgãos de direcção, nos seus vários escalões, nos termos da alínea f) do n.º 2 do artigo 17.º da CRA, conjugado com a alínea c) do artigo 8.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos.

Ora, não assiste razão aos Requerentes quando alegam que o Presidente do Partido incluiu no Comité Central membros não eleitos no conclave, pois, é competência do Congresso, como órgão colegial e supremo, eleger os seus membros, nos termos e para efeitos da alínea a) do n.º 2 do artigo 29.º dos Estatutos. 

Para além de este Tribunal não ter encontrado, nos autos, provas das alegadas inserções irregulares de militantes na lista do Comité Central, não se verifica actos implícitos ou explícitos do Presidente do Partido que tenham transformado os militantes convidados a membros efectivos do Comité Central.

Ademais, neste Tribunal encontram-se registados e anotados 123 membros do Comité Central do Partido PDPA-ANA, eleitos no II Congresso Extraordinário, realizado nos dias 27 a 29 de Março de 2015, o que contraria as alegações dos Requerentes, da integração de membros não eleitos.

C. Destituição ilegal do Secretário-Geral do Partido

No âmbito das denúncias e acusações contra o Secretário-Geral do Partido, o Presidente do PDP-ANA exarou o Despacho n.º 07/GP/2017, que orienta a Comissão de Disciplina para aferição dos factos imputados.

A Comissão de Disciplina instaurou o competente processo disciplinar contra o Secretário-Geral, por alegadas práticas: de difamação, injúria, calúnia, de anarquia em negociação de assuntos relacionados ao partido, agressão a um militante e incumprimento das suas atribuições.

O Secretário-Geral, na qualidade de inquirido, foi ouvido em processo disciplinar, no dia 18 de Junho de 2017, não demonstrou que foi impedido de exercer o contraditório das acusações que pesavam contra si. 

Segundo o Relatório da Comissão de Disciplina, que é composta por cinco membros, decidiu por unanimidade suspender o Requerente do cargo, por um período de seis (6) meses.

No dia 12 de Abril de 2019, um ano depois, o Comité Central decidiu alterar a medida disciplinar, de suspensão para destituição, nos termos do n.º 1 do artigo 123.º, artigo 125.º e da alínea d) do artigo 127.º dos Estatutos e do artigo 8.º do Regimento Interno do Comité Central de 2015.

Todavia, a exoneração do Requerente não é definitiva, atendendo à modalidade de provimento do cargo (electivo), compete ao Congresso ratificar as decisões emanadas pelo Comité Central, nos termos da alínea e) do n.º 2 do artigo 29.º dos Estatutos.

Portanto, o Secretário-Geral deve aguardar que o Congresso se pronuncie e poder a posteriori voltar a exercer o contraditório. 

D. Utilização indevida dos fundos do Partido

Em relação ao pedido dos Requerentes, referente aos valores transferidos pela CASA-CE para o Partido PDP-ANA para comparar com o Relatório Financeiro apresentado, importa aduzir que não é da competência deste Tribunal sindicar a questão supra levantada.

De facto, os conflitos internos sobre a utilização indevida dos fundos competem ao Tribunal de Contas apreciar, nos termos do n.º 2 do artigo 29.º da LPP, pelo que podem sempre os Requerentes exercer o direito de intentar a respectiva acção. Assim sendo, este Tribunal entende que não há fundamento para que se declare a nulidade da reunião do Comité Central, na medida em que não foi verificada a inobservância da Constituição, da lei e dos Estatutos.

DECIDINDO

Nestes termos,

Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em 

Sem custas, artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional.

 

Tribunal Constitucional em Luanda, 2 de Outubro de 2019

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente) 

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente) 

Dr. Américo Maria de Morais Garcia 

Dr. António Carlos Pinto Caetano de Sousa (Relator) 

Dr. Carlos Magalhães 

Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto

Dra. Júlia de Fátima Leite Ferreira 

Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango 

Dr. Raul Carlos Vasques Araújo 

Dr. Simão de Sousa Victor