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ACÓRDÃO N.º 577/2019

 

PROCESSO N.º 708-D/2019

(Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade)

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

I. RELATÓRIO 

Mateus Sateleia, melhor identificado nos autos, veio interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Acórdão da 2.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, proferido a 14 de Fevereiro de 2019, no âmbito do Processo n.º 041/19, que considerou improcedente o seu pedido de habeas corpus.

Inconformado com o referido Acórdão, o Recorrente apresentou a este Tribunal as seguintes alegações:

  1. Ao recurso indeferido pelo Tribunal Supremo, se deveria dar provimento, considerando a fundamentação do n.º 1 do artigo 68.º da Constituição (CRA), pelo facto da prisão preventiva constituir uma medida excessiva e, por isso, se ter verificado abuso de poder e prisão ilegal.
  2. Foi violado o disposto na alínea b) do artigo 315.º, do Código de Processo Penal, na medida em que a prisão ou detenção deve partir de fortes indícios que levem a aferir o cometimento ou a participação no delito não sendo o caso do Recorrente.
  3. Importa salientar que sobre o Recorrente recai uma acusação de ter participado num delito sem a existência de prova documental, pericial ou testemunhal que comprove a sua intervenção no crime em referência.
  4. O Recorrente mantém a convicção de que a medida de coacção pessoal de prisão preventiva aplicada está eivada de inconstitucionalidade e de ilegalidade, e a prisão preventiva foi motivada por facto pela qual a lei não admite a prisão.
  5. O artigo 8.º da Lei n.º 25/15, de 18 de Setembro, Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal (LMCPP), dispõe que a detenção só é permitida quando houver razões suficientes para crer que a pessoa a deter não se apresentaria voluntária e espontaneamente perante a autoridade judiciária no prazo que lhe fosse fixado.
  6. É evidente que, não sendo em flagrante delito, o Ministério Público não tem razões para ordenar a prisão imediata do Recorrente.
  7. O Recorrente reconhece que consentiu a estadia do raptor numa das suas casas mas, como ele, várias outras pessoas também foram enganadas ao longo do trajecto deste raptor.
  8. Aquando da detenção do Recorrente, este foi inicialmente identificado pelo raptor como sendo o mandante, tendo o referido raptor posteriormente prometido que o iria desresponsabilizar, uma vez que o mandante era outro senhor, que vive na província do Uíge.
  9. Apesar destas evidências, o Ministério Público não efectuou diligências no sentido de averiguar a veracidade ou não dos factos ora narrados.
  10. Dada a importância que a Constituição dá aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, a sua restrição deve ser devidamente fundamentada e o Ministério Público não pode aproveitar-se de comandos jurídicos legais para sustentar a prisão que não se adequa ao caso em concreto.
  11. A medida de coacção pessoal de prisão preventiva, nos termos da lei, é a última ratio, e não se pode fazer dela, a fundamentação de quaisquer fins.
  12. É evidente que a medida de coacção aplicada, inobservou os princípios da adequação, proporcionalidade e subsidiariedade, estabelecido no n.º 1 do artigo 18.º da LMCPP.
  13. Importa realçar que o artigo 36.º, da CRA estabelece o princípio geral do direito à liberdade e segurança, que só pode ser excepcionada em circunstâncias restritas.

Termina as suas alegações, pedindo que seja dado provimento ao recurso, considerando inconstitucional o Acórdão proferido pelo Tribunal Supremo e conduzindo o Recorrente a liberdade, onde deverá aguardar a tramitação processual.  

O processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA

O Tribunal Constitucional é competente para julgar o presente recurso, nos termos da alínea a) e do § único do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC). 

III. LEGITIMIDADE

O Recorrente é arguido no Processo n.º 041/19, que correu termos na 2.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, em que lhe foi indeferido a providência de habeas corpus, pelo que tem legitimidade para apresentar o presente recurso, nos termos da alínea a) do artigo 50.º da LPC e do n.º 1 do artigo 26.º do CPC, ex vi do artigo 2.º da LPC.

IV. OBJECTO

O objecto do presente recurso é saber se o Acórdão da 2.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, de fls. 22 dos autos, que julgou

improcedente o pedido de providência de habeas corpus formulado pelo Recorrente, violou algum princípio, direito ou garantia constitucional.  

V. APRECIANDO

O Recorrente veio interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Acórdão da 2.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, proferido a 14 de Fevereiro de 2019, que considerou improcedente o seu pedido de habeas corpus.

Por existirem indícios suficientes da co-autoria material do crime de associação criminosa previsto e punível pelo n.º 1 do artigo 8.º da Lei n.º 3/14, de 10 de Fevereiro, Lei sobre a Criminalização das Infracções Subjacentes ao Branqueamento de Capitais e crime de rapto previsto na alínea d) do artigo 16.º e punível pela conjugação do n.º 2 in fine do artigo 16.º e n.º 4 do artigo 15.º do mesmo diploma legal, agravando a sua responsabilidade criminal as circunstâncias 1.ª, 7.ª, 10.ª, 29.ª e 34.ª do artigo 34.º do Código Penal, lhe foi aplicada a medida de coacção de prisão preventiva, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 39.º e artigo 19.º, da Lei n.º 25/25, de 18 de Setembro, Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal.

No entanto, nos termos do artigo 10.º da LPC, este Tribunal soube, oficiosamente, que, no decurso do Processo n.º 46/19, que correu trâmites na Sala de Competência Genérica de Ambaca do Tribunal Provincial do Cuanza Norte, o Recorrente foi absolvido dos factos de que vinha acusado, por sentença datada de 5 de Setembro de 2019.

Assim, torna-se inútil conhecer o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, cujo fim e objectivo já foram realizados.

Nestes termos, tendo em conta o disposto no § único do artigo 315.º do CPP a contrario sensu e da alínea e) do artigo 287.º do CPC, aqui aplicado subsidiariamente por força do artigo 2.º da LPC, verifica-se a inutilidade superveniente da lide.

 DECIDINDO

Nestes termos,                   

Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário os Juízes do Tribunal Constitucional em:

Sem custas, nos termos do artigo 15.o da Lei n.o 3/08, de 17 de Junho.

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos  29 de Outubro de 2019.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente) 

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente) 

Dr. Carlos Alberto Burity da Silva

Dr. Carlos Magalhães (Relator) 

Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira

Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto

Dra. Júlia de Fátima Leite da Silva Ferreira

Dra. Maria de Fátima L. A. B da Silva

Dr. Simão de Sousa Victor

Dra. Victória Manuel da Silva Izata