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ACÓRDÃO N.º 590/2019

 

PROCESSO N.º 649-A/2018

Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

I. RELATÓRIO

Hamilton Samaloua Abel Ginga, melhor identificado nos autos, veio interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Acórdão de 6 de Março de 2018, da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, proferido no âmbito do Processo n.º 225/18, que negou provimento ao seu pedido de providência de habeas corpus.

Notificado para apresentar alegações de recurso nos termos do artigo 45.º da Lei n.º 3/98, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), o Recorrente nas suas alegações, referiu no essencial o seguinte:

  1. Tendo sido preso no dia 06 de Dezembro de 2016, à data da interposição da providência de habeas corpus estava há 12 meses em prisão preventiva, sem condenação em primeira instância. No entanto o Tribunal ad quem, não obstante ter reconhecido o excesso de prisão preventiva, entendeu não dar provimento ao seu pedido de habeas corpus;
  2. Os fundamentos apresentados no referido acórdão são de todo modo contraditórios com a decisão tomada, pelo que é o referido acórdão nulo, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil;
  3. O referido acórdão não deu provimento ao habeas corpus por extemporaneidade, no entanto à data da interposição ainda não havia condenação em primeira instância, pelo que entende o Recorrente que houve da parte do Juiz da primeira instância uma atitude dilatória propositada, ao não despachar os inúmeros requerimentos apresentados pelo Recorrente;
  4. A privação da liberdade apenas é permitida nos casos e nas condições determinadas por lei, nos termos das disposições conjugadas no n.º 1 do artigo 36.º e artigo 64.º, ambos da Constituição da República de Angola CRA, constituindo a sua violação um atropelo ao princípio da tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 29.º da CRA.

O Recorrente alega, concluindo, que não existe a menor dúvida de que a sua detenção é ilegal, porque foi efectuada ao arrepio dos pressupostos e formalidades impostas pela Constituição e a lei. Como resultado, o arguido ora Recorrente deve aguardar a decisão de segunda instância em liberdade, sob pena de violação do disposto nos artigos 36.º, n.º 2 do 56.º, n.ºs 1 e 2 do 57.º, 58.º, 63.º e do n.º 3 do 64.º, todos da CRA.

O processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL

O Tribunal Constitucional é competente para conhecer e decidir o presente recurso, nos termos e fundamentos da alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC), norma que estabelece o âmbito do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, para o Tribunal Constitucional “as sentenças dos demais tribunais que contenham fundamentos de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição da República de Angola e foi observado o prévio esgotamento dos recursos ordinários legalmente previstos para os tribunais comuns e demais tribunais, conforme estatuído no § único do citado artigo da LPC.

III. LEGITIMIDADE

O Recorrente tendo interposto no Tribunal Supremo uma providência de habeas corpus, nos termos do artigo 36.º, da alínea h) do artigo 64.º, dos n.ºs 3 e 4 do artigo 65.º e do artigo 68.º, todos da CRA, viu o seu pedido ser indeferido.

O Recorrente tem, assim, legitimidade para interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade, conforme prevê a alínea a) do artigo 50.º da LPC.

IV. OBJECTO

O objecto do presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade é apreciar se a decisão vertida no Acórdão da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, que negou provimento ao pedido de habeas corpus formulado pelo Recorrente, no âmbito do Processo n.º 225/2018, viola ou não as garantias do processo criminal previstas no artigo 67.º e o direito à providência de habeas corpus estabelecido no artigo 68.º, ambos da CRA.  

V. APRECIANDO

É submetida à apreciação do Tribunal Constitucional a verificação da constitucionalidade do Acórdão da 1.ª Secção da Câmara Criminal do Venerando Tribunal Supremo, que negou provimento ao pedido da providência de habeas corpus nº 225, formulado pelo ora Recorrente.

O Recorrente alega ainda que a sua detenção é ilegal, devendo ser imediatamente restituído à liberdade, aguardando a decisão da segunda instância, visto que:

  • Foi detido no dia 6 de Dezembro de 2016 em Malanje, onde se encontrava em trânsito, com destino a Lunda-Norte para participar num concurso para enquadramento na Polícia Nacional, embora residindo habitualmente em Benguela (fls 12);
  • A acusação foi feita no dia 3 de Maio de 2017, tendo sido notificado no dia 8 de Julho de 2017 (i.e., 7 meses após a sua detenção);
  • O julgamento pelo Tribunal a quo teve início no dia 23 de Janeiro de 2018 (1ª sessão), continuou a 6 de Fevereiro ( cerca de 1 ano e 2 meses após a sua detenção) e terminou a 3 de Maio de 2018.

Na verdade, o Recorrente já se encontrava detido, sem condenação em primeira instância, há um (1) ano e um (1) mês.

Desde 21 de Março de 2018, até à data da prolação do Acórdão do habeas corpus não tinha havido decisão condenatória.

Entretanto, o Tribunal Constitucional  tomou conhecimento, após diligências efectuadas junto do Tribunal Provincial de Malanje, que a leitura do aresto se efectivou  aos 3 de Maio de 2018,  tendo o ora   Recorrente sido  condenado a 17 anos de prisão maior, ao pagamento de AKZ 70 000  de taxas de justiça e de AKZ 1 000 000  de indemnização aos familiares da vítima.

Contudo, o Recorrente inconformado com a sentença condenatória do Tribunal a quo, interpôs recurso ordinário junto do Tribunal Supremo, que deu entrada no dia 9 de Setembro de 2018, ao qual foi atribuído efeito suspensivo,  devendo o Réu manter-se na situação em que se encontrava à data da condenação.

Neste ínterim, após várias diligências efectuadas junto do Venerando Tribunal Supremo, nos termos do artigo 10º da LPC, recentemente o Tribunal Constitucional tomou conhecimento que o recurso ordinário referente ao Processo nº 1760/18 foi decidido pela 1ª Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no dia 23 de Julho de 2019, tendo sido confirmada a decisão recorrida, excepto a indemnização que foi fixada em AKZ 2 000 000.

O facto acima expendido, torna assim inútil conhecer o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, por ocorrer uma situação de inutilidade superveniente da lide. 

DECIDINDO

Nestes termos,

Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário os Juízes do Tribunal Constitucional em:

Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.o 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional.

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 19 de Dezembro de 2019.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente) 

Dr.ª Guilhermina Prata (Vice-Presidente) – Relatora 

Dr. Carlos Burity da Silva

Dr.  Carlos Manuel dos Santos Teixeira

Dr.ª Josefa Antónia dos Santos Neto

Dr.ª Júlia de Fátima Leite da Silva Ferreira 

Dr.ª Maria da Conceição Almeida Sango 

Dr.ª Maria de Fátima L.A. Baptista da Silva

Dr. Simão de Sousa Victor

Dr.ª Victória Manuel da Silva Izata