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ACÓRDÃO N.º 602/2020

PROCESSO N.º 767-A/2019

Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional: 

I. RELATÓRIO 

Silva José Correia, melhor identificado nos autos, veio interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Acórdão proferido pela 3.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no Processo n.º 305/19, que negou provimento ao seu pedido de habeas corpus.

Notificado para apresentar alegações de recurso nos termos do artigo 45.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), o Recorrente alegou, no essencial, que:

  1. O acórdão objecto do presente recurso viola o princípio da fundamentação, tal como resulta do disposto nos artigos 158.º e 659.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC);
  2. O acórdão impugnado circunscreveu a sua fundamentação ao parágrafo único do artigo 315.º do Código de Processo Penal (CPP), como se o referido artigo se sobrepusesse aos preceitos constitucionais sobre a matéria em causa;
  3. A decisão acima referida viola igualmente a Constituição da República de Angola (CRA) e a orientação jurisprudencial do Tribunal Constitucional relativa a ilegalidade da prisão preventiva enquanto medida de coacção;
  4. Ao contrário do que resulta do acórdão recorrido, os requisitos previstos no § único do artigo 315.º do CPP nas suas alíneas a), b), c) e d) não podem ser considerados taxativos;
  5. Tal entendimento pode ser considerado inconstitucional pois, nos termos do n.º 1 do artigo 68.º da CRA, este meio é sempre admitido quando haja prisão ilegal, independentemente das causas;
  6. Neste domínio, importa referir que as normas processuais penais admitem interpretação extensiva;
  7. O Tribunal Supremo, no seu acórdão, limitou a sua abordagem à questão do excesso de prisão preventiva que, entretanto, não tinha sido suscitada por si, porquanto o seu pedido fundamentou-se na ilegalidade da prisão preventiva com fundamento na apresentação ao Ministério Público fora dos prazos e na detenção fora do flagrante delito e sem o competente mandado de detenção, na medida em que:
  8. Foi detido no dia 29 de Junho de 2019, indiciado no crime de homicídio voluntário simples, p.p. pelo artigo 349.º do Código Penal (CP), porém apresentado ao Ministério Público no dia 4 de Julho de 2019, isto é, cinco dias após a detenção, quando a lei prevê apenas a detenção como medida precária de privação de liberdade por tempo não superior a 48 horas (dois dias);
  9. Outro aspecto que deve ser considerado, devido à sua ilegalidade, tem a ver com a sua prisão fora do flagrante delito e sem apresentação do competente mandado de detenção, situação que contraria o disposto na alínea a) do artigo 63.º da CRA e o disposto no artigo 8.º da Lei n.º 25/15 de 18 de Setembro, Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal (LMCPP);
  10. Foi detido no dia 29 de Junho de 2019 e até ao preciso momento são decorridos mais de 4 meses, sem que para tal tenha sido notificado da acusação formal, ou de qualquer despacho fundamentando a prorrogação do prazo de prisão preventiva, conforme dispõe o n.º 1, alínea a) e n.º 2, todos do artigo 40.º da LMCPP.

Com efeito, o acórdão recorrido viola os seguintes artigos:

  • Nºs 1 e 2 do artigo 36.º da CRA, no que diz respeito à liberdade física;
  • Alíneas a) e h) do artigo 63.º da CRA, referente aos direitos dos detidos e dos presos;
  • Nºs 1 do artigo 4.º; 1,2 e 4 do artigo 8.º; alínea a) do n.º 1.º do artigo 40.º e n.º 1 do artigo 42.º, todos da LMCPP, por se ter excedido o prazo para apresentação ao Ministério Público e pela falta do mandado de detenção;
  • Alínea c) do artigo 315.º do CPP por ter sido presente ao Ministério Público para além do prazo, legalmente previsto, de 48 horas.

Termina requerendo que seja dado provimento ao presente Recurso, declarando-se inconstitucional o acórdão recorrido e, em consequência, que o Recorrente seja restituído à liberdade.

O processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA

O presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade foi interposto nos termos e com os fundamentos da alínea a) do artigo 49.º da LPC, norma que estabelece o âmbito do recurso extraordinário de inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional, de “sentenças dos demais tribunais que contenham fundamentos de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição da República de Angola”.

Ademais, foi observado o pressuposto do prévio esgotamento dos recursos ordinários legalmente previstos, nos tribunais comuns e demais tribunais, conforme estatuído no parágrafo único do artigo 49.º da LPC, pelo que tem o Tribunal Constitucional competência para apreciar o presente recurso. 

III. LEGITIMIDADE

O Recorrente, encontrando-se actualmente na condição de arguido preso no âmbito do Processo n.º 3880/19-C, havia intentado no Tribunal Supremo uma providência de habeas corpus que foi indeferida por aquela instância judicial.

O Recorrente tem, assim, legitimidade para interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, conforme prevê a alínea a) do artigo 50.º da LPC, ao estabelecer que têm legitimidade para interpor recurso extraordinário “as pessoas que, de acordo com a lei reguladora do processo em que a sentença foi proferida, tenham legitimidade para dela interpor recurso ordinário”. 

IV. OBJECTO

O objecto do presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade é a verificação da constitucionalidade da decisão vertida no acórdão da 3.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, que negou provimento ao pedido de habeas corpus formulado pelo Recorrente, no âmbito do Processo n.º 305/2019.  

V. APRECIANDO

É submetida à apreciação do Tribunal Constitucional o Acórdão da 3.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, que negou provimento ao pedido de habeas corpus formulado pelo Recorrente.

Todos têm o direito à providência de habeas corpus contra o abuso de poder em virtude de prisão ou detenção ilegal, nos termos do artigo 68.º da CRA, conjugado com a alínea c) do parágrafo único do artigo 315.º do Código de Processo Penal (CPP), sendo o único caso de garantia específica e extraordinária constitucionalmente prevista para a defesa do direito à liberdade, enquanto direito fundamental.

O instituto do habeas corpus nasceu da necessidade de se opôr ao arbítrio estatal, limitando a actuação indevida dos detentores do poder. Por conseguinte, o habeas corpus é um instrumento de protecção de direitos fundamentais, concretamente o direito fundamental à liberdade de locomoção que, inevitavelmente, se coloca na relação que os cidadãos mantêm com o Estado. Com efeito, podemos mesmo concluir que o habeas corpus é um limite à actuação do Estado.

A origem do habeas corpus costuma ser associada à promulgação da Magna Carta de 1215, outorgada pelo Rei João Sem Terra, nos termos do artigo 39.º do documento, que enuncia:

“Nenhum homem livre será detido ou sujeito a prisão, ou privado dos bens, ou colocado fora da lei, ou exilado, ou de qualquer modo molestado e nós não procederemos nem mandaremos proceder contra ele senão mediante um julgamento regular pelos seus pares ou de harmonia com a lei do país.”

Com o habeas corpus Act, de 1679, o writ foi regulamentado, concebendo o “direito ao mandado” (right to writ), importante peça contra prisões arbitrárias. Na sequência, em 1816, o ato teve seu texto ampliado, passando a abranger todo tipo de constrangimento ilegal, sobretudo para evitar prisões por motivos diferentes da acusação criminal.(https://thaisantunes01.jusbrasil.com.br/artigos/339884800/aspectos-gerais-do-habeas-corpus).

Modernamente não restam dúvidas sobre o papel da Constituição a nível dos ordenamentos jurídicos. A Lei Suprema resolve qualquer tipo de problema que se coloque acerca da posição da Constituição e o seu relacionamento com as demais leis. É esta summa quaestio que subjaz a nível dos vários países para a criação de tribunais constitucionais: institucionalizar uma entidade cuja função principal é avaliar se a legislação ordinária está a materializar da melhor forma as normas constitucionais; verificar se o estatuto de Lei Suprema está a ser respeitado.

Independentemente do tribunal em que o juiz esteja inserido, este deve interpretar as normas ordinárias tendo como respaldo a Constituição e nunca o contrário; deve, antes de recorrer à legislação ordinária, verificar e escrutinar as normas e os princípios constitucionais sobre a matéria.

Assim, de acordo com a doutrina, “O juiz no processo de aplicação do direito determina não apenas o significado objectivo de um texto, mas ainda os valores incorporados neste texto” (Cristina Queiroz, Justiça Constitucional, Petrony, 2017, pág. 4). É dentro deste contexto que as normas constitucionais que regulam o instituto do habeas corpus devem ser interpretadas: de modo sistemático, particularmente em consonância com as que regulam os princípios e os direitos fundamentais estruturantes do Estado de direito.

Para o efeito, o ponto de partida analítico deve ser o artigo 68.º da CRA que estabelece “Todos têm o direito à providência de habeas corpus contra o abuso de poder, em virtude de prisão ou detenção ilegal, a interpor perante o tribunal competente.”

Contudo, em circunstâncias constitucionalmente determinadas, a liberdade dos cidadãos pode ser restringida, valendo neste sentido o disposto nos artigos 57.º, 58.º e 64.º, todos da CRA. Ainda assim, nestes casos impõe-se que esta restrição esteja dentro dos limites constitucional ou legalmente consagrados.

Na análise dos pedidos de habeas corpus realçam-se, pelo menos, dois valores a serem atendidos no juízo de ponderação a ser feito pelo juiz: por um lado, o poder de punição do Estado, como elemento de garantia de certeza, de paz e de estabilidade social e, por outro lado, os direitos fundamentais do cidadão. Assim, o Tribunal deverá ponderar os valores e adoptar uma solução em que um dos valores irá circunstancialmente ceder face ao outro.

O acórdão recorrido, objecto do presente processo, expende que os fundamentos do habeas corpus são taxativos, conforme consta do § único do artigo 315.º do CPP. Não é isso que resulta do texto vertido no n.º 1 do artigo 68.º da CRA. Com efeito, desde que haja prisão ou detenção ilegal, ainda que a ilegalidade não esteja prevista no mencionado artigo 315.º do CPP, a vítima do constrangimento tem direito a se socorrer do habeas corpus.

Na verdade, o vestuto Código de Processo Penal é anterior à CRA, sendo que, nesta matéria, a nossa Lei Magna consagra uma vertente  mais personalista, tendo a pessoa como centro; de acordo com o disposto no seu artigo 1º, que consagra a dignidade da pessoa humana como princípio estruturante do Estado angolano. Assim, a vertente defendida no acórdão recorrido é incompatível com o sistema de direitos fundamentais que a CRA consagra, havendo, neste sentido,  a necessidade de os juízes aplicarem correctivamente o referido artigo.

Não obstante o que acima se despende,  importa esclarecer que a redação do parágrafo único do artigo 315.º do CPP permite efectivamente  que várias situações sejam enquadradas no seu conteúdo, valendo para o efeito o fundamento utilizado no presente caso concreto. Até porque não se pode ignorar a inserção sistemática do referido § único do artigo 315.º do CPP para adequadamente se poder compreender e interpretar a ratio legis referente à matéria em análise. E no proémio do artigo consta que “pode usar-se da providência extraordinária do habeas corpus… a favor de qualquer indivíduo que esteja ilegalmente detido…”.

Ora, a Constituição determina que havendo abuso de poder, em virtude de prisão ou detenção ilegal, emerge o direito ao habeas corpus; ao passo que o CPP vem restringir os motivos pelos quais haverá o direito à referida providência. Se não bastasse,  o facto de a Constituição ser hierarquicamente superior, igualmente é posterior, pelo que são chamados à colacção princípios gerais do direito, nomeadamente,  lex superiori derrogat lex inferiori e lex posteriori derrogat lex priori.

Neste exercício, refira-se o princípio da aplicabilidade imediata dos preceitos constitucionais atinentes aos direitos, liberdades e garantias fundamentais, cfr. artigo 28.º da CRA,  que se manifesta nas seguintes dimensões: (i) concede eficácia directa aos direitos fundamentais, indiferente à existência de normas infraconstitucionais; (ii) caso existam as referidas normas, devem obrigatoriamente ser interpretadas em conformidade ao direito fundamental em questão; (iii) a partir de sua consagração, chega-se aos limites imanentes aos direitos fundamentais, ou seja, à aplicabilidade imediata de vários direitos ainda que concorrentes; e, com isso, (iv) enaltece a ponderação de interesses, pressuposto de qualquer sociedade pluralista. (Fábio Victorino, Princípio da Aplicação Imediata dos Direitos Fundamentais, https://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/ 41579/o-principio-da-aplicacao-imediata- dos- direitos- fundamentais).

Ademais, o princípio da máxima efectividade dos direitos fundamentais exige que o intérprete sempre tente fazer com que o direito fundamental atinja plena realização. (Ingo Sarlet, A Eficácia dos Direitos Fundamentais, 9ª Edição, Porto Alegre, Livraria do Advogado Editora Lda, 2008, pág. 286).

Na base do princípio acima referido subjaz o princípio da dignidade da pessoa humana que surge como primeira referência, quando se trata de direitos fundamentais e exige que se criem meios para a sua concretização.

Na verdade, o parâmetro de controlo mais utilizado para o preenchimento do conteúdo normativo da dignidade da pessoa humana, é a ideia da proibição da coisificação da pessoa, (Jorge Reis Novais, Princípios Estruturantes de Estado de Direito, Almedina 2019,  pág. 52),  que geralmente pode ocorrer quando a esta são negados meios para se proteger de eventuais agressões provenientes dos poderes públicos.

De tal modo, que o juiz, mesmo que esteja inserido nos tribunais comuns, participa activamente na construção e concretização das normas constitucionais.  Fundamentalmente, porque existem normas sobre direitos fundamentais que não constam do texto e normas que os concretizam que igualmente não constam da Carta Magna (Luís Pedro Pereira Coutinho, Autoridade Moral da Constituição, Coimbra Editora, 2009, pág. 626). Nesta situação, o juiz deve utilizar os instrumentos necessários para garantir que a Constituição seja materializada na sua máxima efectividade. 

Para o caso concreto do presente recurso, verifica-se que a interpretação do Tribunal Supremo não foi conforme à Constituição da República de Angola que, nesta matéria, alarga e pretende conferir a máxima efectividade aos direitos fundamentais. Assim, estamos perante  um acórdão que viola normas consagradas na CRA.

Senão vejamos:

O Recorrente foi detido no dia 29 de Junho de 2019, tendo sido apresentado ao Ministério Público 5 dias depois, quando, para as situações de detenção, o artigo 4.º da LMCPP estabelece o prazo de 48 horas.

A violação do prazo acima referido pode justificar a interposição do habeas corpus, por se configurar numa violação de um direito fundamental e, ao mesmo tempo, numa detenção ilegal, porquanto os fins que justificaram a detenção não foram cumpridos por factos imputáveis às autoridades públicas. Logo, o ora Recorrente não deve ser lesado pela inércia das autoridades competentes; como resultado, não haveria outra alternativa: o Recorrente deveria ter sido solto, como forma de efectivar e fazer valer o direito fundamental à liberdade.

No caso concreto verifica-se uma irregularidade que poderia ter sido resolvida ao abrigo do disposto no artigo 100.º do CPP. O Recorrente deveria ter suscitado esta questão na altura devida, caso pretendesse que a sua detenção fosse declarada nula. A esta altura, hodiernamente, a declaração de nulidade não terá o efeito desejado pelo Recorrente, porquanto o processo foi tramitado e a situação carcerária do Recorrente regularizada de acordo com a LMCPP.

A detenção é um meio precário de privação de liberdade e só pode ser admissível se estiverem reunidos determinados pressupostos, sem os quais esta não pode ser operada, sob pena de violação grave às normas constitucionais sobre direitos, liberdades e garantias.

O artigo 8.º da LMCPP estabelece as condições em que se deve operar a detenção fora do flagrante delito. Da análise deste artigo percebe-se logo que houve uma detenção ilegal na medida em que o Recorrente se apresentou às autoridades e, estas efectuaram a sua detenção, sem que se preenchessem os requisitos estabelecidos no artigo em referência, com destaque para o seu nº 2. Portanto, a detenção tornou-se ilegal pelo facto de se terem esgotado os prazos para apresentação do Recorrente ao Ministério Público.

Além disso, verificou-se outra ilegalidade.

A detenção efectuada fora do flagrante delito e sem mandado de captura constitui uma ilegalidade grave, podendo mesmo ser declarada inconstitucional (Afonso Comidando, Estudo sobre a Problemática da Prisão Preventiva Sem Culpa Formada, 2ª edição revista, actualizada e aumentada, 2013, pág 40). Esta situação pode ser tratada como irregularidade, porquanto não consta do leque de situações às quais se possa aplicar a nulidade; logo, por exclusão, aplicamos o regime das irregularidades. Face à questão acima aduzida, o Ministério Público deveria ter restituído imediatamente a liberdade ao Recorrente.

Ainda assim, não está afastada a possibilidade de responsabilização de quem ordenou a detenção, a ser efectuada por iniciativa do Ministério Público junto ao Comando da Polícia Nacional de Cacuaco. Quanto ao representante do Ministério Público, diante da situação, a ele não restava outra alternativa: deveria restituir imediatamente a liberdade ao Recorrente quando este lhe foi apresentado para efeitos da legalização da detenção (Manuel Simas Santos e Flávia Noversa Loureiro, Medidas Cautelares em Processo Penal, Lei n.º 25/15 de 18 de Setembro, anotada e comentada, Rei dos Livros, 2016, pág. 59). O Procurador deveria antes revogar a prisão com fundamento em ilegalidade e, em seguida, porque havia indícios suficientes da prática do crime, praticar os actos legalmente exigíveis para que a prisão fosse regular, ou seja exarar dois despachos.

Refira-se que, neste momento, decorridos seis meses, o Recorrente ainda não foi formalmente acusado, verificando-se por isso uma violação flagrante da alínea a) do artigo 40.º da LMCPP, nomeadamente a que estabelece, como máximo admissível, o prazo de quatro meses sem acusação, o que, ainda assim, é subsumível ao vertido na alínea c) do parágrafo único do artigo 315.º do CPP.

Concluindo, o Tribunal Constitucional considera que a situação acima referida viola o disposto nas normas constitucionais sobre a liberdade, particularmente a que determina que esta só pode ser restringida em casos legalmente determinados. Esgotados os prazos, a prisão torna-se ilegal, havendo neste sentido uma violação ao disposto no nº 1 do artigo 64º da CRA e uma restrição inconstitucional do direito à liberdade, que se consubstancia na violação do princípio da proibição do excesso.

 Em decorrência, o Recorrente deve ser restituído à liberdade.

DECIDINDO

Nestes termos,

 Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário os Juízes do Tribunal Constitucional, em: 

Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.o 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional.

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 19 de Fevereiro de 2020.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente) 

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente) Relatora 

Dr. Carlos Alberto Burity da Silva

Dr. Carlos Magalhães

Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira 

Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto

Dra. Júlia de Fátima Leite da Silva Ferreira 

Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango 

Dr. Maria de Fátima da Silva

Dr. Simão de Sousa Victor