ACÓRDÃO N.º 630/2020
PROCESSO N.º 698-B/2019
Arguição de Nulidade do Acórdão n.º 566/2019
Em nome do Povo, acordam em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. RELATÓRIO
Bricomil – Construção Civil e Obras Públicas, SA, melhor identificada nos autos, veio arguir a nulidade do Acórdão n.º 566/2019, do Plenário do Tribunal Constitucional, proferido a 31 de Julho de 2019, que negou provimento ao seu recurso extraordinário de inconstitucionalidade.
Neste Acórdão, o Tribunal deliberou que o Aresto recorrido, prolactado pelo Tribunal Supremo, não contrariou princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na CRA.
A Reclamante vem agora arguir a nulidade do Acórdão, com os seguintes fundamentos:
O Processo foi à vista do Ministério Público.
Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar, para decidir.
II. OBJECTO
O objecto da presente reclamação é a alegada nulidade do Acórdão n.º 566/2019, proferido por este Tribunal, que não deu provimento ao recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Acórdão prolactado pelo Tribunal Supremo, em 21 de Setembro de 2017, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável subsidiariamente por força do disposto no artigo 2.º da LPC.
III. APRECIANDO
A Reclamante alega que o Acórdão posto em causa padece de nulidade por violação da competência material do Tribunal Constitucional, uma vez que, segundo o disposto no n.º 5 do artigo 21.º da LOTC, o recurso extraordinário de inconstitucionalidade deve ser restrito à apreciação da constitucionalidade levantada.
Compulsada a alegação da Reclamante de fls. 275 e seguintes dos presentes autos de recurso extraordinário de inconstitucionalidade, verifica-se que a Reclamante defende que o Acórdão do Tribunal Supremo violou os seus direitos fundamentais de acesso à justiça, à tutela jurisdicional efectiva, respeito pela dignidade humana, à igualdade e outras normas e princípios constitucionais previstos nos artigos 2.º, 6.º n.º 2, 175.º, 177.º n.º 1 e 226.º, todos da CRA.
Assim sendo, o agora Reclamante propugna que o Tribunal Constitucional nada disse sobre a questão que constitui objecto do citado Acórdão, quando cabia julgar se, face ao argumento da manifesta inexistência de falta de patrocínio judiciário, a decisão do Tribunal Supremo está ou não correcta, e se constitui ou não uma violação aos seus direitos fundamentais.
No caso em análise, vale referir que o Tribunal Constitucional circunscreveu toda a sua apreciação à questão da constitucionalidade suscitada, tendo em consequência decidido não ser inconstitucional a decisão do tribunal ad quem que julgou procedente a excepção dilatória da falta de patrocínio judiciário. Considerou que a razão de o mérito da causa não ter sido conhecido com a decisão recorrida era imputável à Reclamante, já que poderia e deveria ter sanado a irregularidade processual verificada, mas não o fez. Concluiu, assim, que não existia qualquer violação aos seus direitos fundamentais de acesso à justiça, à tutela jurisdicional efectiva, respeito pela dignidade da pessoa humana, à igualdade e outras normas e princípios constitucionais.
É necessário esclarecer à Reclamante que este Tribunal não está restringido aos argumentos e razões apresentados pelas partes na apreciação da constitucionalidade das decisões judiciais que constituem objecto dos recursos extraordinários de inconstitucionalidade. Na verdade, está apenas limitado às (in) constitucionalidades suscitadas, como claramente enunciado no n.º 5 do artigo 21.º da LOTC, e bem refere a Reclamante na sua arguição.
Ademais, nos recursos extraordinários de inconstitucionalidade, a apreciação das violações aos princípios, direitos, liberdades e garantias constitucionais impõem ao julgador constitucional a necessidade de se proceder à análise dos fundamentos de direito contidos na decisão, o que não configura excesso de pronúncia.
Por outro lado, no que à omissão de pronúncia diz respeito, são pertinentes os ensinamentos de Alberto dos Reis, que traduzem a posição dominante na doutrina e jurisprudência, que citamos: “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.” – in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 143.
Esse é o entendimento que também foi seguido pelo nosso legislador, com a disposição do artigo 11.º da LPC, nos termos da qual “O Tribunal apenas deve conhecer a inconstitucionalidade de norma cuja apreciação tenha sido requerida, mas pode declará-la com fundamentação na violação de normas ou princípios constitucionais diversos daqueles invocados pelo requerente”. Este Tribunal tem entendido, de forma reiterada, que a interpretação deste preceito legal deve contemplar as decisões judiciais e os actos administrativos, que constituem objecto do recurso extraordinário de inconstitucionalidade.
Concluindo, o Tribunal Constitucional apreciou a questão que lhe foi colocada, a da constitucionalidade da decisão recorrida, e sobre ela produziu o acórdão arguido de nulo no sentido do não provimento ao recurso, por considerar que a decisão cuja constitucionalidade havia sido suscitada não contrariou princípios, direitos, liberdades e garantias previstas na CRA. Ou seja, nada mais fez do que dar resposta a questão suscitada pela, ora, Reclamante.
Assim sendo, entende este Tribunal que não procede a presente reclamação, uma vez que o Acórdão n.º 566/2019 não padece de omissão ou excesso de pronúncia.
DECIDINDO
Nestes termos,
Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em:
Custas pela Reclamante, nos termos da segunda parte do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho (LPC).
Notifique.
Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 30 de Junho de 2020.
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente)
Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente)
Dr. Carlos Alberto Burity da Silva
Dr. Carlos Magalhães
Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira
Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto
Dra. Júlia de Fátima Leite da Silva Ferreira
Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango
Dra. Maria de Fátima de Lima d´A. B. da Silva
Dr. Simão de Sousa Victor
Dra. Victória Manuel da Silva Izata (Relatora)