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ACÓRDÃO N.º 631/2020

PROCESSO N.º 768-D/2019

Processo Relativo a Partidos Políticos e Coligações

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

I. RELATÓRIO

Zissala Mamona Mpulu, com os demais sinais de identificação nos autos, veio, no âmbito do processo relativo a Partidos Políticos e Coligações interpôr recurso no Plenário do Tribunal Constitucional do Acórdão n.º 573/2019, prolactado por este Tribunal que negou provimento ao pedido de impugnação da 3.ª Reunião Ordinária do Comité Central do PDP-ANA, realizada em Luanda, no dia 12 de Abril de 2019.

Para o efeito, o Recorrente apresentaram as seguintes alegações:

1. Que requer à apreciação do Tribunal Constitucional não validação da 3.ª Reunião Ordinária do Comité Central, por incumprimento na entrega da convocatória, por inserção na lista do referido comité, por parte do Presidente do Partido, de membros não eleitos pelo Congresso, pela destituição ilegal do Secretário-geral e pela utilização indevida de fundos do Partido.

2. Pelos fundamentos apresentados pelo Tribunal Constitucional para o não atendimento do pedido o Recorrente vem, retorquir, nos seguintes termos: 

  1. Segundo informações do porta-voz da Comissão de Redacção, aquando da leitura das conclusões e recomendações, participaram 111 membros, dos quais 96 do género masculino e 15 do género feminino. Este número decorre da contagem que foi imposta e realizada in situ, depois dos presentes terem, unanimemente, contestado o anúncio da presença de 300 membros;
  2. As conclusões e recomendações, apesar de lidas, não foram distribuídas aos participantes que, não contentes, abandonaram a sala de reuniões;
  3. A lista com o número de 123 membros do Comité Central, que foi entregue ao Tribunal Constitucional, contém nomes duplicados que reduzem o número a um total de 119;
  4. Na reunião em causa estiveram presentes 49 militantes convidados pelo Presidente, mas que participaram na mesma em plenitude, tendo sido apresentados no início do conclave pelo Presidente Simão Makazu, para preenchimento das vagas no Comité Central como membros efectivos e com todos os direitos, pelo que, em homenagem ao princípio da verdade material, requerem que seja analisada a lista dos 123 membros do Comité Central entregue ao Tribunal, bem como a relação nominal de 98 membros que serviram de base do quórum; a acta da 3.ª Reunião do Comité Central; e que seja aferida a data dos registos criminais com a data da reunião;
  5. É reiterado que, dos 98 membros para justificar o quórum, tal como vem no Acórdão, os 49 nomes dos militantes não constam da lista de membros do Comité Central eleitos no Congresso de 2015;
  6. Relativamente à destituição ilegal do Secretário-geral, é reafirmado que foi criada uma Comissão de Inquérito pelo Presidente Simão Makazu, à revelia dos Estatutos do Partido, quando devia recorrer à Comissão Nacional de Disciplina que, estatutariamente tem competências para o efeito (Vide artigos 123.º, 124.º e 127.º);
  7. Que a base do processo disciplinar contra o Secretário-geral foi pelo facto de ter ido à CASA-CE averiguar o recebimento, pelo Presidente da quantia de AKZ. 5 000 000,00 (cinco milhões) que solicitou a esta Coligação sob subterfúgio de custear despesas contraídas com a realização do Congresso de 2015;
  8. Que a Comissão de Inquérito aconselhou o Presidente Simão Makazu a arquivar o processo e ordenar o Requerente a regressar às suas funções, mas a referida Comissão foi simplesmente desconsiderada por não ir ao encontro dos propósitos do mesmo que, a todo o custo, queria livrar-se do ora Recorrente, por constituir obstáculo à dilapidação do erário do Partido;
  9. Que o Comité Central não alterou a medida de “suspensão” para “destituição” como consta no Acórdão do Tribunal Constitucional.
  10. Que o Presidente, de forma unilateral decidiu afastar o Recorrente, afirmando ter perdido a confiança no Secretário-geral e que não poderia continuar a trabalhar com ele, tendo esta posição levado a que membros presentes na reunião manifestassem a sua indignação, que culminou com a presente impugnação da 3.ª Reunião do Comité Central;
  11. A demissão do Secretário-geral do Partido é da competência do Congresso e não do Comité Central, como vem dito no Acórdão. A este propósito, os Estatutos do Partido são claros quanto às competências dos órgãos centrais e, de maneira nenhuma, permitem ao Presidente “se auto atribuir” poderes tendentes a semear a anarquia e o despotismo no seio do Partido;
  12. Que Angelino António Vunge, designado Secretário-geral, não participou no Congresso realizado em 2015 e que esta é mais uma das provas de violações às normas estatutárias que o Presidente Simão Makazu tem perpetrado para afastar do Partido os militantes que tentam criticar a sua gestão e no lugar deles promover os “yes men”;
  13. Que compete ao Bureau Político, nos termos do artigo 42.º, suspender o mandato de todos os membros do Comité Central excepto o do Presidente, do Secretário-geral, dos Delegados provinciais e adjuntos, ouvida a Comissão de Disciplina, e que, no caso vertente, o Presidente suspendeu e exonerou o Secretário-geral à revelia dos Estatutos;
  14. Que o Recorrente sempre procurou exercer o contraditório, no entanto, foi impedido pelo Presidente, ao contrário do que é referido no Acórdão em crise, “… o Secretário-geral, na qualidade de inquirido, não foi impedido de exercer o contraditório”.

O Recorrente conclui pedindo, que se revogue a decisão e se considere nula a 3.ª Reunião do Comité Central que destituiu o Secretário-geral.

O Processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA

O Tribunal Constitucional é competente para conhecer processos de impugnação de deliberações de órgãos de partidos políticos ou de resolução de quaisquer conflitos internos que resultem da aplicação de estatutos e convenções partidárias, nos termos das disposições combinadas da alínea c) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República de Angola (CRA), da alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC) e do n.º 2 do artigo 29.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro – Lei dos Partidos Políticos (LPP).

III. LEGITIMIDADE

O Recorrente é parte vencida no Processo n.º 711-C/2019, pelo que, nos termos do artigo 26.º do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no artigo 2.º da LPC, tem legitimidade para recorrer do Acórdão n.º 573/2019.

 IV. OBJECTO

O objecto do presente recurso é o Acórdão n.º 573/2019, prolactado pelo Tribunal Constitucional, que negou provimento ao pedido de impugnação da 3.ª Reunião Ordinária do Comité Central do PDP-ANA (Partido Democrático para o Progresso de Aliança Nacional Angolana), realizada no dia 12 de Abril de 2019.

V. APRECIANDO

Da decisão proferida pelo Plenário deste Tribunal que negou provimento do seu pedido, veio o ora Recorrente impugnar a referida decisão do Acórdão n.º 573/2019, declarando válida a 3.ª Reunião Ordinária do Comité Central, realizada em Luanda no ano transacto.

O Recorrente nas suas alegações de recurso requer que seja revogado o citado Acórdão e, consequentemente, considerada nula a reunião do Comité Central que destituiu o Secretário-geral do Partido PDP-ANA.

Sobre as questões suscitadas, vale, ab initio, apreciar os requisitos da conformidade legal e estatutária da 3.ª Reunião Ordinária do Comité Central e da legalidade do acto de destituição do Secretário-geral da formação partidária.

  1. Sobre a participação de membros não eleitos e a base do

A Constituição da República de Angola (CRA) na sua alínea f) do n.º 2 do artigo 17.º e a Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos (LPP), na alínea n) do n.º 2 do artigo 20.º, estabelecem o dever de os partidos políticos respeitarem a organização e funcionamento democráticos na definição, em sede dos seus estatutos, de regras e critérios referentes à observância da democraticidade interna.

O Estatuto do PDP-ANA define no seu artigo 40.º, a validade da reunião do Comité Central (CC) com a presença de, pelo menos, 2/3 (dois terços) dos seus membros. Para que haja esta aferição, vigora no actual contexto a deliberação emanada do II Congresso Extraordinário realizado de 27 a 29 de Março de 2015, que elegeu 123 membros efectivos ao referido órgão.

O Recorrente alega que a lista com o número de 123 membros do Comité Central, que foi entregue ao Tribunal Constitucional, contém nomes duplicados que reduzem o número a um total de 110 membros.

Ora, não assiste razão ao Recorrente, porquanto, nos autos a fls. 10 a 13 este juntou uma lista informatizada de 123 membros do CC que não têm correspondência com a composição do referido órgão colegial registada neste Tribunal. Ademais, na lista original anotada e registada, diferente da relação nominal apresentada pelo Recorrente, não existe duplicação de nomes e o CC é composto por 123 membros efectivos.

O Recorrente requer, ainda, que, em homenagem ao princípio da verdade material, seja analisada a presença de 98 membros que serviram de base ao quórum, em virtude da alegada participação na reunião do CC, de 49 militantes convidados pelo Presidente do Partido e apresentados para preencherem as vagas deixadas no CC.

Vale aqui referir, que os dados depositados neste Tribunal reconduzem-nos à prova da presença de 98 membros do CC, constituindo número visivelmente confortável do quórum verificado, nos termos da alínea b) do artigo 8.º e do artigo 40.º, ambos dos Estatutos do PDP-ANA.

Portanto, não assiste mais uma vez razão aos Requerentes quando alegam que, dos 98 membros para justificar o quórum, 49 nomes não constam da lista de membros do CC, na medida em que os 98 subscritores da lista de presença da reunião encontram-se anotados neste Tribunal e foram estes os únicos habilitados para a formação do quórum que esteve na base da validação da 3.ª Reunião Ordinária do CC do PDP-ANA.

 

  1. Destituição ilegal do Secretário-Geral do Partido

O Recorrente reafirma que, à revelia do Estatuto, foi criada uma Comissão de Inquérito pelo Presidente do Partido para destituir, ilegalmente, o Secretário-geral, quando devia recorrer à Comissão de Disciplina.

O processo disciplinar nos termos do artigo 123.º dos Estatutos cabe à Comissão de Disciplina (CD), órgão encarregue de organizar, instruir e dirigir processos disciplinares instaurados contra membros do Secretariado Geral, coordenada pelo Secretário-geral.

À luz da alínea e) do n.º 1 do artigo 49.º do Estatuto, compete ao Presidente do Partido tomar a iniciativa da acção disciplinar, que o fez ao exarar o Despacho n.º 07/GP/2017, com fundamento na prática dos crimes de difamação, injúria, calúnia, anarquia em negociações de assuntos relacionados com o Partido e a Coligação CASA-CE, agressão a um militante e incumprimento de tarefas atinentes ao cargo de Secretário-geral.

Vale referir que, no caso sub judice, os Requerentes foram submetidos a um processo disciplinar promovido pela Comissão de Disciplina que, para garantir a validade do processo disciplinar, teve em linha de conta as fases da leitura e análise das queixas apresentadas no despacho, auscultação, pedido de explicações, conclusões finais, elaboração do relatório condenatório, aplicação da sanção, recurso e finalização do processo.

Portanto, é mister observar que, apesar de os Recorrentes alegarem que a Comissão de Disciplina aconselhou o Presidente a arquivar o processo e ordenar o regresso do Secretário-geral às suas funções e que o Presidente de forma unilateral decidiu afastá-lo por perda de confiança, o que se verificou na realidade é que, efectivamente, o mesmo foi inicialmente sancionado com a pena de 6 meses de suspensão e, em momento posterior, foi esta sanção agravada pelo Comité Central para afastamento do cargo.

Todavia, é importante referir que a alínea e) do n.º 2 dos Estatutos do PDP-ANA obriga a que todas as decisões do Comité Central sejam ratificadas pelo Congresso.

Assim, face à medida sancionatória aplicada e o Estatuto do Partido assegurarem aos Recorrentes o acesso ao direito e tutela efectiva do Congresso, o qual competirá ratificar ou não a decisão do Comité Central, deve o Secretário-geral aguardar que o conclave se pronuncie sobre a medida disciplinar aplicada.

Assim sendo, entende este Tribunal que não há fundamentos para que seja revogada a decisão do Acórdão n.º 573/2019 e, consequentemente, considerar nula a 3.ª Reunião Ordinária do Comité Central do PDP- ANA, de 12 de Abril de 2019.

DECIDINDO

Nestes termos,

Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário os Juízes do Tribunal Constitucional em NEGAR PROVIMENTO AO PEDIDO FORMULADO PELO REQUERENTE, E, CONSEQUENTEMENTE, MANTER O ACÓRDÃO RECORRIDO.

Sem custas, nos termos do artigo 15.o da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional.

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 30 de Junho de 2020.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS 

Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente)

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente)

Dr. Carlos Alberto Burity da Silva

Dr. Carlos Magalhães

Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira

Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto

Dra. Júlia de Fátima Leite da Silva Ferreira

Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango

Dra. Maria de Fátima de Lima A. B. da Silva

Dr. Simão de Sousa Victor

Dra. Victória Manuel da Silva Izata (Relatora)