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ACÓRDÃO N.º 645/2020

PROCESSO N.º 777-A/2019

Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

 I. RELATÓRIO 

Manuel Dembo Bartolomeu, melhor identificado nos autos, veio interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade do Acórdão datado de 20 de Agosto de 2019, proferido pela 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no âmbito do Processo n.º 260/19, que negou provimento à providência de habeas corpus, requerida pelo impetrante.

O Recorrente foi detido no dia 24 de Março de 2020, indiciado pelo crime de burla por defraudação, previsto e punível pelo artigo 451.º do Código Penal (CP).

O Recorrente, tendo sido notificado para apresentar alegações de recurso, nos termos do artigo 45.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), asseverou, no essencial que:

  1. Encontra-se privado da sua liberdade desde o dia 8 de Janeiro de 2019, alegadamente pela prática de um crime de burla por defraudação, p.p. nos termos do n.º 3 do artigo 451.º e do n.º 2 do artigo 421.º, ambos do Código Penal (CP);
  2. Decorreram mais de 12 meses desde a data da detenção sem que tenha sido formalmente notificado da pronúncia e sem culpa formada, violando assim o seu direito à liberdade e à segurança pessoal, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 36.º da Constituição da República de Angola (CRA);
  3. O despacho de acusação foi exarado aos 20 de Fevereiro de 2019, porém, somente aos 3 de Junho de 2019 o Recorrente foi notificado do referido despacho, quando já se haviam passado mais de 26 dias sobre o prazo legal para a prática de tal acto, o que prefigura um excesso de prisão preventiva, nos termos do que vem estabelecido na alínea c), do n.º 1 do artigo 40.º da Lei n.º 25/15, de 18 de Setembro, Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal (LMCPP);
  4. O despacho de pronúncia foi notificado ao Recorrente aos 25 de Novembro de 2019, documento que além de extemporâneo contém uma irregularidade processual, ao não cumprir com os requisitos formais previstos no n.º 7 do artigo 365.º do Código de Processo Penal (CPP), por estar em falta a data e a assinatura do Juiz;
  5. Tal documento, nos termos apresentados, lesa o princípio da igualdade, na medida em que ninguém pode ser prejudicado, privilegiado ou privado de qualquer direito. No entanto, tal vício lesa o direito do Recorrente à igualdade de tratamento em sede do processo e a beneficiar de economia processual, nos termos do n.º 1 do artigo 29.º da CRA;
  6. A prisão do Recorrente é ilegal, nos termos definidos pelo artigo 315.º do CPP, por se manter além dos prazos legais para apresentação em juízo e para a formação de culpa.

O Recorrente terminou requerendo que fosse declarada a inconstitucionalidade da prisão preventiva, por inobservância do direito à liberdade e do princípio da igualdade, nos termos dos artigos 23.º, 29.º e 36.º, todos da Constituição da República de Angola (CRA) e se declarasse a nulidade do acórdão proferido pela 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo e, em consequência, fosse o Recorrente absolvido e mandado em liberdade, fazendo-se assim a acostumada JUSTIÇA.

O processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais dos Juízes Conselheiros, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL

O presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade foi interposto nos termos e com os fundamentos da alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), norma que estabelece o âmbito do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, para o Tribunal Constitucional, de “as sentenças dos demais tribunais que contenham fundamentos de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição da República de Angola”.

Ademais, foi observado o prévio esgotamento dos recursos ordinários legalmente previstos, nos tribunais comuns e demais tribunais, conforme estabelecido no parágrafo único do artigo 49.º da LPC, pelo que, tem o Tribunal Constitucional competência para apreciar o presente recurso.

III. LEGITIMIDADE

O Recorrente, tendo interposto no Tribunal Supremo uma providência de habeas corpus, nos termos do artigo 36.º, da alínea h) do artigo 64.º, dos n.ºs 3 e 4 do artigo 65.º e do artigo 68.º, todos da CRA, viu o seu pedido ser indeferido.

Assim, tem legitimidade para interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, conforme prevê a alínea a) do artigo 50.º da LPC, ao estabelecer a legitimidade de recorrer extraordinariamente para “…as pessoas que, de acordo com a lei reguladora do processo em que a sentença foi proferida, tenham legitimidade para dela interpor recurso ordinário”.  

IV. OBJECTO

O objecto do presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade é   verificar a constitucionalidade do acórdão datado de 20 de Agosto de 2019, prolactado pela 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no âmbito do Processo n.º 260/2019 que negou provimento à providência de habeas corpus apresentada pelo então Requerente e ora Recorrente.  

V. APRECIANDO

É submetida à apreciação do Tribunal Constitucional a constitucionalidade do Acórdão datado de 20 de Agosto de 2019, prolactado pela 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no âmbito do Processo n.º 260/2019

 que negou provimento ao pedido de habeas corpus formulado pelo Recorrente.

Perante o indeferimento da providência cautelar de habeas corpus por via do Acórdão sob o Processo nº 260/19, proferido pela 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, o ora Recorrente interpôs o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade.  

 O Recorrente alega que está privado da sua liberdade há mais de 12 meses sem que tenha sido formalmente notificado do despacho de pronúncia e sem culpa formada, destarte violando-se o seu direito à liberdade e à segurança pessoal, previsto nos nºs 1 e 2 do artigo 36.º da CRA.

Sucede que, no decurso da tramitação dos presentes autos nesta instância, o Tribunal Constitucional tomou conhecimento, por intermédio de uma informação prestada pelo Digníssimo Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, constante de fls. 79 a 81 dos presentes autos, datada de 4 de Novembro de 2020, de que a Meritíssima Juíza da causa ordenou, a restituição do ora Recorrente à liberdade mediante caução e prestação de termo de identidade e residência, por se encontrarem excedidos os prazos da prisão preventiva, nos termos do previsto nos artigos 40.º n.º 1 alínea a) e 42.º da LMCPP.

Encontrando-se actualmente o Recorrente em liberdade, torna-se despiciendo o pronunciamento deste Tribunal sobre o objecto do presente recurso por inutilidade superveniente da lide.

 Assim, este Tribunal declara a extinção da instância, nos termos da alínea e) do artigo 287.º do Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao processo constitucional por força do artigo 2º da Lei nº 3/08, de 17 de Junho. 

DECIDINDO

Nestes termos, tudo visto e ponderado, acordam em Plenário os Juízes do Tribunal Constitucional em:

Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.o3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional.

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 9 de Novembro de 2020

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente e Relatora) 

Dr. Carlos Alberto Burity da Silva

Dr. Carlos Magalhães

Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira

Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto

Dra. Júlia de Fátima Leite da Silva Ferreira

Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango

Dr. Simão de Sousa Victor

Dra. Victória Manuel da Silva Izata