ACÓRDÃO N.º 657/2020
PROCESSO N.º 754-B/2019
Processo Relativo a Partidos Políticos e Coligações de Partidos Políticos - (Providência Cautelar Não Especificada)
Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. RELATÓRIO
Borges Marcos e outros, com os demais sinais de identificação nos autos, vieram ao Tribunal Constitucional interpor a presente providência cautelar não especificada contra os Senhores Lucas Benghim Gonda, Presidente do Partido Político FNLA, e Pedro Mocombe Dala, militante do mesmo Partido, ao abrigo dos artigos 29.º da Constituição da República de Angola (CRA), 30.º da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho – Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC), e 399.º do Código de Processo Civil (CPC).
Os Requerentes expuseram os factos e as razões de direito que fundamentam a presente providência, invocando, em síntese, o seguinte:
Os Requerentes juntaram procuração (fls. 245), e terminam pedindo a procedência da presente providência cautelar não especificada, de modo a que o Presidente Lucas Benghim Gonda seja impedido de realizar o V Congresso Ordinário Não Electivo, marcado para os dias 12, 13 e 14 de Dezembro de 2019.
Os Requeridos, regularmente notificados, juntaram procuração (fls. 506) e contestaram alegando, no essencial, o seguinte:
1.Por Excepção:
2.Por Impugnação:
Os Requeridos terminam pedindo a procedência da contestação e que a presente providência cautelar não especificada seja julgada improcedente e não provada e, em consequência, absolvidos da instância e do pedido.
II. COMPETÊNCIA
Nos termos do artigo 30.º da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho – Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC), e da alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC), em conjugação com o n.º 2 do artigo 29.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro – Lei dos Partidos Políticos (LPP), o Tribunal Constitucional é competente para conhecer e julgar os conflitos internos resultantes da aplicação dos estatutos ou convenções de partidos políticos. Tratando-se este processo de um conflito partidário, é o Tribunal Constitucional competente para apreciar a presente providência cautelar.
III. LEGITIMIDADE
Os Requerentes são militantes e membros do Partido FNLA, conforme provado através de cópias dos respectivos cartões de militantes juntos aos autos, pelo que podem demandar. Os Requeridos estão devidamente representados nos autos, nos termos da lei. Os Requerentes têm, assim, interesse directo e legitimidade para requer a presente providência cautelar não especificada, e os Requeridos têm legitimidade em contradizer, conforme o previsto no artigo 26.º do CPC, subsidiariamente aplicável por força do artigo 2.º da LPC.
IV. OBJECTO
O objecto do presente processo é verificar se estão ou não reunidos os fundamentos invocados na providência cautelar não especificada intentada pelos Requerentes, nomeadamente a prova sumária da existência de um direito ameaçado, o receio da sua lesão e desconformidade com a CRA, a lei e os estatutos do Partido FNLA.
V. APRECIANDO
Os Requerentes pretenderam, com a presente providência cautelar não especificada, intimar o Presidente do Partido Político FNLA, Lucas Benghim Gonda, a abster-se de realizar o V Congresso Ordinário, não electivo, previsto para aos dias 12, 13, e 14 de Dezembro de 2019, invocando, para tanto, não terem sido observados os requisitos jurídico-legais e estatutários previstos para a sua realização.
Entrementes, pese embora os Requeridos tivessem contestado, a (fls. 503 a 505), requerendo a improcedência do pedido, a posteriori, apresentaram ao Tribunal Constitucional um ofício (fls. 507), donde se extrai a informação de que a Comissão Nacional Preparatória do V Congresso Ordinário adoptou a Resolução n.º 01/CNP/FNLA/2019 (fls. 508), de 4 de Dezembro de 2019, em que deliberou o adiamento do congresso sub judice, facto que converge com a pretensão dos Requerentes, manifestada na presente providência, intentada para dissuadir a realização do acto e buscar soluções para os conflitos no seio do Partido Político FNLA.
Ora, vislumbra-se, na petição inicial (fls.1 a 19), que o fundamento do pedido, ou seja, da impetração da presente providência cautelar não especificada é o receio de o Presidente da FNLA realizar o V Congresso Ordinário em desconformidade com a CRA e a lei.
Porém, com a aprovação da Resolução supra mencionada, fica o dito Congresso adiado sine die (sem data marcada), dissipando o receio dos Requerentes quanto a um potencial prejuízo grave iminente (periculum in mora), que, de imediato, deve ser evitado para afastar o risco e eliminar eventuais danos irreparáveis, caso se tivesse verificado a sua ocorrência.
Desta feita, uma vez que se verifica o adiamento do conclave, este Tribunal entende que se torna despicienda a intervenção da tutela constitucional no tratamento do processo em causa, pelo que se afigura inoportuno, inútil e jurisdicionalmente irrelevante a análise dos fundamentos de razão e de direito esgrimidos pelos Requerentes e Requeridos na presente providência cautelar não especificada, produzindo uma inutilidade superveniente da lide.
Sob essa perspectiva, Abílio Neto, na sua obra Novo Código de Processo Civil Anotado, pág. 392, 4.ª Edição, Revista e Ampliada Março/2017, Ediforum, Edições Jurídicas, Lda., Lisboa, assevera que: “A inutilidade superveniente da lide, prevista no artigo 287.º, alínea e), do CPC, ocorre quando a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida”.
Em face dos factos verificáveis nos autos da presente providência, o Tribunal Constitucional conclui que deve ser extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, preceituada na alínea e) do artigo 287.º do CPC, aplicável a título subsidiário ao processo constitucional, por força do artigo 2.º da LPC.
DECIDINDO
Nestes termos,
Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário, os Juízes do Tribunal Constitucional, em: DECLARAR EXTINTA A INSTÂNCIA, POR INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE., NOS TERMOS DA ALÍNEA E) DO ARTIGO 287.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E DO ARTIGO 2.º DA LEI DO PROCESSO CONSTITUCIONAL.
Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional.
Notifique.
Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 15 de Dezembro de 2020
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente)
Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente)
Dr. Carlos Alberto Bravo da Silva Burity
Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira
Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto
Dra. Júlia de Fátima Leite da Silva Ferreira (Relatora)
Dra. Maria da Conceição de Almeida Sango
Dra. Maria de Fátima de Lima d`A. B. da Silva
Dr. Simão de Sousa Victor
Dra. Victória Manuel da Silva Izata