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ACÓRDÃO N.º 675/2021

 PROCESSO N.º 861-A/2020

Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade

Em nome do Povo, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

 I. RELATÓRIO 

Filipe Gonçalves da Cruz Mota, com melhor identificação nos autos, não se conformando com o Acórdão de 29 de Outubro de 2020, no âmbito do processo n.º 666/2020 (habeas corpus), proferido pela 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, veio interpor ao Tribunal Constitucional o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade.

Em síntese das suas alegações, o Recorrente vem arguir o seguinte:

  1. O Recorrente está actualmente preso com base no Despacho de Pronúncia do Processo n.º 011/20–J datado de 27 de Maio de 2020, exarado pelo Juiz da causa com fundamento na alínea g) do artigo 16.º da Lei n.º 25/15 de 18 de Setembro “Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal” (LMCPP) e, assim, pronunciado do Crime de Corrupção Activa, p. e p. pelos artigos 38.º e 39.º, n.º 2 da Lei n.º 3/14 de 10 de Fevereiro “Lei Sobre a Criminalização das Infracções Subjacentes ao Branqueamento de Capitais”.
  2. Contrariamente ao previsto no artigo 315.º alínea b) do então Código de Processo Penal (CPP), a prisão aplicada ao Réu/Recorrente foi motivada por facto pelo qual a lei não autoriza a prisão, não tendo sido observados os direitos fundamentais e garantias constitucionais do Réu, quanto à presença do seu Mandatário legal previamente constituído, nos termos do n.º 2 do artigo 29.º, da alínea d) do artigo 63.º, dos artigos 67.º º 3, 193.º e 194.º, todos da Constituição da República de Angola (CRA).
  1. Não foi exibido ao Réu e ao seu Mandatário legal o Mandado de detenção, facto que constitui violação do previsto na alínea a) do artigo 63.º da CRA.
  1. O Despacho que ordenou a prisão, ao excluir da condição de Réus a Empresa AES e o seu representante legal Sr. Morten Eriksen, uma vez que os mesmos se encontravam em igualdade de circunstância em relação ao Recorrente, violou o princípio da igualdade, estabelecido pela CRA, no artigo 23.º n.º 1.
  1. O acto de prisão do Réu/Recorrente constitui violação dos princípios do julgamento justo e conforme a lei, previsto no artigo 72.º: da legalidade, previsto no n.º 1 do artigo 64.º e no n.º 1 do artigo 67.º, todos da CRA.
  1. A medida de coacção aplicada ao Recorrente mostra-se em grande medida desproporcional e excessiva, violando os n.ºs 1 e 2 do artigo 18.º e n.ºs 1 e 2 do artigo 19.º, ambos da LMCPP.

Finaliza, requerendo o provimento da presente providência extraordinária de habeas corpus e, consequentemente, que lhe seja concedida a liberdade provisória, substituindo-se a medida de coacção de prisão preventiva por Termo de Identidade e Residência ou outra menos gravosa que a actual.

O Processo foi à vista do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.

II. COMPETÊNCIA

 O presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade foi interposto nos termos e com os fundamentos da alínea a) do artigo 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho – Lei do Processo Constitucional (LPC), norma que estabelece o âmbito do recurso extraordinário de inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional como “as sentenças dos demais tribunais que contenham fundamentos de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstas na Constituição da República de Angola”.

Ademais, foi observado o prévio esgotamento dos recursos ordinários legalmente previstos para os tribunais comuns, conforme estatuído no parágrafo único do artigo 49.º da LPC, pelo que tem o Tribunal Constitucional competência para apreciar o presente recurso.

III. LEGITIMIDADE 

O Recorrente é Réu no Processo n.º 666/2020, que correu trâmites na 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo pelo que é parte legítima, nos termos da alínea a) do artigo 50.º da LPC que preceitua, “no caso de sentenças, podem interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional, o Ministério Público e as pessoas que, de acordo com a lei reguladora do processo em que a sentença foi proferida, tenham legitimidade para dela interpor recurso ordinário”.

IV. OBJECTO 

O objecto do presente recurso é apreciar se o Aresto prolactado pela 1ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, em sede do Processo n.º 666/2020, violou ou não princípios e direitos constitucionalmente garantidos.

V. APRECIANDO 

O Recorrente veio interpor o presente recurso extraordinário de inconstitucionalidade, alegando que o Acórdão do Tribunal Supremo ao negar provimento à providência de habeas corpus violou o n.º 1 do artigo 23.º, n.º 2 do artigo 29.º, a alínea d) do artigo 63.º, o n.º 1 do artigo 64.º, o n.º 3 do artigo 67.º e o artigo 72.º, todos da CRA.

A Constituição da República de Angola consagra, no seu artigo 68.º, o direito à providência de habeas corpus a todo cidadão, enquanto uma providência extraordinária para de forma especial, garantir o direito à liberdade, contra o abuso de poder, em virtude de prisão ou detenção ilegal. No entanto, o mesmo preceito constitucional remete para Lei própria a regulação do processo de habeas corpus.

 Ora, o § único do artigo 315.º do CPP, em vigor na época dos factos, prévia, para que houvesse ilegalidade da prisão ou detenção, os seguintes pressupostos:

  1. Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;
  2. Ser motivada por facto pelo qual a lei não autorizava a prisão;
  3. Manter-se além dos prazos legais para apresentação em juízo e para formação de culpa;
  4. Prolongar-se para além do tempo fixado por decisão judicial.

O Recorrente afirma que não se observou o disposto na alínea b) do artigo 315.º do então CPP, uma vez que a sua prisão foi motivada, por facto pelo qual a lei não autoriza a prisão, porquanto não foram respeitados os direitos fundamentais e garantias constitucionais, mormente, a falta de exibição do mandato de prisão, nos termos da alínea a) do artigo 63.º da CRA.

Entretanto, o Tribunal Constitucional tomou conhecimento, por intermédio da informação do Digno Magistrado do Ministério Público, junto desta Corte, conforme a fls. 145 – 147 dos autos, segundo a qual, o Meritíssimo Juiz de Direito do Tribunal da Comarca do Dande, ordenou por meio do Mandado de soltura, emitido no dia 03 de Março de 2021, a restituição à liberdade ao Recorrente, por ter sido a pena de um (1) ano a que lhe tinha sido condenado, suspensa por um período (3) de três anos, por ter cometido o crime de corrupção activa e passiva p.e.p pelos artigos 358.º n.º 1, e 359.º n.º 1, do Código Penal vigente.

Em face do exposto supra, seria despiciendo escalpelizar os argumentos e fundamentos apresentados pelo Recorrente, visto que o desiderato que esteve na base do presente recurso foi alcançado. Pelo que, nos termos da alínea e) do artigo 287.º do Código Processo Civil, aplicado ex. vi pelo artigo 2.º da LPC, estamos perante uma inutilidade superveniente da lide e, consequentemente, extingue-se a instância.

DECIDINDO

Neste termos,

Tudo visto e ponderado, acordam, em Plenário, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional em: 

 Sem custas, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho (Lei do Processo Constitucional).

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 6 de Abril de 2021.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

 

Dr. Manuel Miguel da Costa Aragão (Presidente) 

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente) 

Dr. Carlos Alberto B. Burity da Silva 

Dr. Carlos Magalhães 

Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira 

Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto

Dr. Maria da Conceição de Almeida Sango 

Dra. Maria de Fátima de Lima d´A. B da Silva (Relatora) 

Dr. Simão de Sousa Victor

Dra. Victória Manuel da Silva Izata