ACÓRDÃO N.º 700/2021
PROCESSO N.º 887-A/2021
Relativo a Partidos Políticos e Coligações
Em nome do Povo, acordam em Conferência no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. RELATÓRIO
Manuel Diogo Pinto Seteco, Domingos Pedro, Cândido Moisés Uasmuene, Wilson Nuno Domingos Gomes, Dino Luís da Silva Chamucassa, Flávio da Costa Mucawa, Madilu Samuel Bandeca, Dombaxe Sebastião Mafuta Garcia, Santo Fonseca Gouveia Diniz e Feliciano Gabriel Castro Kututuma, com os demais sinais de identificação nos autos, na qualidade de militantes da UNITA, vêm impugnar a candidatura de Adalberto Costa Júnior ao cargo de Presidente do Partido Político, a fls. 205 a 222, nos termos da alínea j) do artigo 3.º e da alínea d) do artigo 63.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC) e do n.º 2 do artigo 29.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos (LPP).
Os Requerentes sustentam que o processo de candidatura de Adalberto Costa Júnior, que permitiu a sua eleição a presidente do Partido UNITA, foi eivado de vícios, em razão de facto e de direito, alegando, em síntese, o seguinte:
Os Requerentes terminam as suas alegações solicitando que seja declarada nula a candidatura de Adalberto Costa Júnior a presidente da UNITA, pois, no momento da apresentação da sua candidatura, o referido membro do Partido era inelegível, possuía outra nacionalidade para além da angolana.
Notificado para exercer o seu direito de defesa, veio o Partido Político UNITA, representado pela sua direcção, apresentar, em síntese, os seguintes fundamentos de razão:
O Requerido termina pedindo que seja julgada procedente a contestação; que sejam analisadas e julgadas procedentes as excepções dilatórias e peremptórias invocadas; que seja extinto o processo sem a resolução do mérito ou que seja declarada improcedente a presente demanda.
O processo foi a vista do Ministério Público que, a fls. 331 a 332, em conclusão, promoveu o seguinte:
Os Requerentes são militantes da UNITA e, nessa qualidade, os actos praticados pelos órgãos desse Partido, directa ou indirectamente, se repercutem na sua esfera política.
Nesse sentido, têm interesse processual de impugnar os referidos actos quando, no seu entendimento, violam os regulamentos, os Estatutos do Partido e as leis, independentemente da prova documental da sua qualidade de militante, de cidadão ou de terem sido ou não Delegados ao Congresso.
A União Nacional para a Independência de Angola – UNITA realizou, nos dias 13, 14 e 15 de Novembro de 2019, o seu XIII Congresso para eleição dos novos corpos gerentes, incluindo o Presidente.
Ao cadeirão máximo do Partido concorreram cinco candidatos, entre os quais Adalberto Costa Júnior. Porém, para se candidatar ao cargo de Presidente da UNITA, o militante devia reunir os requisitos legais exigidos, com realce para o da nacionalidade angolana única, nos termos do n.º 3 do artigo 25.º da Lei n.º 22 / 10, de 3 de Dezembro.
Contrariamente, Adalberto Costa Júnior apresentou a sua candidatura ao cargo de Presidente da UNITA sem preencher todos os requisitos imperativos, aliás, a interpretação a contrário sensu do articulado 7 das alegações da UNITA conduz a essa conclusão, pois, na data em que Adalberto da Costa Júnior apresentou a sua candidatura, era titular de dupla nacionalidade, sendo a angolana e a portuguesa.
Até dia 7 de Outubro de 2019, data em que terminou o prazo de apresentação das candidaturas, Adalberto Costa Júnior ainda era cidadão português, mas candidato ao cargo de Presidente da UNITA.
A titularidade de dupla nacionalidade de Adalberto Costa Júnior cessou quando o acto de averbamento n.º 3, de 11 de Outubro de 2019, da Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa, foi notificado ao órgão competente da UNITA. Nesta data, percebe-se que o apuramento das candidaturas terminara, pois é a data do início da campanha eleitoral, que decorreu de 11 de Outubro de 2019 a 11 de Novembro de 2019, ex vi do artigo 33.º do Regulamento Eleitoral do XIII Congresso do Partido UNITA.
Seria a partir dessa data que o averbamento sobre a perda da nacionalidade portuguesa ao Assento de nascimento 870 F, de Adalberto Costa Júnior, teria começado a produzir efeitos.
Porém, à data dessa notificação, o prazo de apresentação de candidaturas já havia terminado, isto é, a candidatura de Adalberto Costa Júnior ao cargo de Presidente da UNITA não chegou de produzir efeitos desejados, por não ser conforme o n.º 3 do artigo 25.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro.
Aliás, o Comité Permanente da Comissão Política reconheceu a situação da inelegibilidade de Adalberto Costa Júnior ao afirmar que: "Em face desta situação, os membros do Comité Permanente decidiram que a candidatura do companheiro Adalberto Costa Júnior ficasse condicionada à apresentação da prova de renúncia da 2.º nacionalidade até 3 dias antes do início do congresso", vide o articulado 10 das alegações da UNITA.
Neste item, questiona-se a legitimidade do Comité Permanente da Comissão Política de estender o prazo para o completamento do processo de candidatura a favor de Adalberto Costa Júnior. É que, tendo cessado o mandato, os órgãos do Partido consideram-se demissionários, limitando-se apenas a praticar actos de gestão corrente.
Daí a razão de criação de órgãos ad hoc para a gestão do processo eleitoral em substituição dos órgãos cessantes que, por conseguinte, perderam legitimidade de tomar decisões importantes para a vida do partido, por um lado. Por outro lado, parece ter sido ferido o princípio de igualdade estabelecido no artigo 23.º da Constituição da República de Angola e no n.º 2 do artigo 24.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro. Pois, dessas normas extrai-se a conclusão de que todos os candidatos ao cargo de Presidente do Partido UNITA gozam dos mesmos direitos e deveres face ao processo eleitoral. Merecem, por isso, o mesmo tratamento. Logo, a prorrogação do prazo a favor de um candidato em detrimento de outros configurou uma violação ao princípio da igualdade.
Deste modo, ficou claro que:
Adalberto Costa Júnior, à data de apresentação da sua candidatura ao cargo de Presidente da UNITA, era cidadão Português.
O Comité Permanente da Comissão Política não tinha legitimidade para prorrogar o prazo de apresentação de candidaturas por ter cessado o seu mandato.
Aliás, ainda que tivesse, sendo peremptório o referido prazo, não podia ser reduzido ou prorrogado, nem pelas partes, nem por um acto administrativo ou judicial.
Nestes termos, promovo provimento do pedido.
Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir.
II. COMPETÊNCIA
Na presente acção de impugnação, os Requerentes alegam ser nula a candidatura do actual Presidente da UNITA, pois, no momento da sua submissão e admissão, o pré-candidato Adalberto Costa Júnior detinha a nacionalidade portuguesa adquirida, violando, com isso, a Constituição, a lei, os Estatutos e os regulamentos do Partido Político.
Assim sendo, este Tribunal é competente para, à luz das regras e princípios jus-constitucionais, dirimir o presente conflito interno, nos termos e para efeitos da alínea c) do n.º 2 do artigo 181.º da Constituição da República de Angola (CRA), do artigo 30.º da Lei n.º 2/08, de 17 de Junho, Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC), da alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º, da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC) e do n.º 2 do artigo 29.º da Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos (LPP).
III. LEGITIMIDADE
A legitimidade processual activa é aferida mediante o interesse directo que o autor da acção tem em litigar na justiça, porque a questão demandada lhe diz respeito e a legitimidade passiva decorre do interesse directo que a contraparte tem em contradizer. Assim, o interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da acção intentada e o interesse em contradizer revela-se pela necessidade de acautelar o prejuízo que a decisão pode vir a produzir.
O regime jurídico do processualismo civilístico em vigor ainda defende que, na falta de indicação legal contrária, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito de legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.
Os Requerentes são militantes da UNITA, tal como demonstram as provas dos autos de fls. 167 a 197, logo, têm legitimidade pelo interesse demonstrado em impugnar a candidatura eleitoral, ou seja, demandar o conflito interno que surgiu, e o Requerido tem legitimidade enquanto Partido Político, representado pelo seu Presidente, pelo interesse directo em contradizer as acusações que pesam sobre si, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 26.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º da LPC.
IV. OBJECTO
O objecto da presente acção é a verificação da conformidade legal e estatutária do processo de candidatura do Presidente eleito do Partido Político UNITA, no âmbito do XIII Congresso Ordinário, realizado nos dias 13, 14 e 15 de Novembro de 2019.
V. APRECIANDO
A procedência ou improcedência da impugnação sub iudice carece, em termos decisivos, da apreciação jurídico-constitucional das matérias relacionadas com questões prévias e questões de fundo levantadas pelos Requerentes e pelo Requerido, conforme se seguem:
A) QUESTÕES PRÉVIAS
O Requerido vem, inicialmente, a fls. 231, 234 e 235, invocar a ilegitimidade e a incapacidade dos Requerentes para demandarem, assim como a incapacidade do mandatário para os representar, uma vez que a excepção dilatória de falta de legitimidade e de capacidade dá lugar à absolvição da instância.
As excepções dilatórias invocadas pelo Requerido são inerentes: a) ao facto de os Requerentes não terem sido Delegados ao Congresso; b) ao facto de não terem participado na disputa do cargo de Presidente da UNITA; c) ao facto de a filiação partidária dos Requerentes não poder ser aferida, por não juntarem aos autos os respectivos cartões de membro; d) ao facto de as procurações terem sido reconhecidas com bilhetes de identidade caducados; e) ao facto de os Requerentes juntarem aos autos cartão de membro fora de prazo de validade; f) ao facto de não pagarem quotas de membro; e g) ao facto de o Mandatário Legal juntar aos autos o Cartão de Identidade de Advogado com validade vencida.
Nesta perspectiva, por excepção, são invocadas pelo Requerido a ilegitimidade (ausência de interesse processual) e a incapacidade dos Requerentes para demandarem e a incapacidade do mandatário judicial para o exercício da actividade de advocacia neste processo. ddos Requerenteslicado em Diidade, Polibunal a
As excepções dilatórias são pressupostos processuais subjectivos, relativos às partes, que abrangem a sua personalidade e capacidade judiciárias, assim como a sua legitimidade, o interesse processual e o patrocínio judiciário sempre que obrigatório. E tais excepções são relativas ao Tribunal quando este tem competência para apreciar a impugnação.
Assim, nestas questões prévias, para além da apreciação da ilegitimidade e da incapacidade dos Requerentes, as contra-alegações do Requerido suscitam da parte deste Tribunal o dever de analisar a tempestividade da impugnação da candidatura de Adalberto Costa Júnior e a anotação do XIII Congresso Ordinário junto do Tribunal Constitucional, passados cerca de um ano e meio desde a eleição do actual Presidente do Partido Político UNITA.
Desta feita, passamos a discorrer sobre o seguinte:
1. Sobre a alegada ausência de interesse processual dos Requerentes
O Requerido veio, a fls. 234 e 235, defender, por excepção, que os Requerentes (Feliciano Gabriel Castro Katutuma e outros) estão isentos de interesse processual para demandarem em sede da presente acção de impugnação da candidatura de Adalberto Costa Júnior, por não serem membros da UNITA, uma vez que não juntaram aos autos os cartões de militante e por não terem sido Delegados ao XIII Congresso Ordinário.
Porém, consultados os autos, verifica-se que tal alegação não é de acolher, sendo contrariada, desde logo, pelo facto de Feliciano Gabriel Castro Kututuma ter sido Delegado ao Congresso, ocupando a posição 49 na lista de presenças (fls. 471), sendo inequívoca a sua legitimidade por ser militante efectivo.
Relativamente aos demais Requerentes, quanto ao facto de não terem sido Delegados, o Requerido não só questiona, a fls. 234, a ausência de interesse processual deles, mas também a sua legitimidade propriamente dita, matéria que este Tribunal vai analisar mais adiante.
O facto aqui levantado pelo Requerido, sobre a ausência de interesse processual dos Requerentes, não se confunde com a legitimidade das partes, nem com os restantes pressupostos processuais, tais como a personalidade e capacidade judiciárias das partes e o patrocínio judiciário, quando obrigatório.
Portanto, a legitimidade, embora presente no interesse em demandar ou em contradizer, não se apõe ao interesse processual, que está incluso nos pressupostos processuais referentes às partes, embora não tenha uma consagração legal expressa, uma vez que a norma do n.º 1 do artigo 494.º do CPC não é taxativa quando usa a expressão “entre outras…excepções”, reflectindo isto a existência do referido interesse processual ou interesse em agir.
Antunes Varela, J. Miguel Bizerra e Sampaio e Nora explicitam que “o interesse processual consiste na necessidade de usar do processo, de instaurar ou fazer prosseguir a acção. O autor tem interesse processual, quando a situação de carência, em que se encontre, necessite da intervenção dos tribunais. O demandante pode ter personalidade judiciária, gozar de capacidade judiciária ou estar devidamente representado ou assistido, e, todavia, não ter interesse processual, por não estar necessitado de recorrer à acção. Os primeiros pressupostos referem-se à qualidade ou atributos inerentes à situação objectiva de carência em que ele se encontra. E também se não identifica a legitimidade, embora assente no interesse em demandar ou em contradizer, com o interesse processual”. In Manual de Processo Civil de Acordo com o Dec-Lei 242/85, 2.ª Edição (Reimpressão), Coimbra Editora, 2004, págs. 179 a 181.
Assim, e porque os Requerentes exprimiram, quer no seu requerimento quer nas suas alegações, a necessidade justificada, razoável e fundada de lançar mão do presente processo, expressaram os mesmos validamente o interesse processual em demandar nesta jurisdição constitucional.
2. Sobre a alegada incapacidade e ilegitimidade dos Requerentes para demandarem e do Mandatário Judicial para advogar no processo
O Requerido veio, a fls. 234 e 235, alegar que os Requerentes padecem de incapacidade para demandar, porque todos eles não cumprem com o dever estatutário de pagamento de quotas ordinárias e extraordinárias há mais de dois anos; porque apresentaram cartões de membro da UNITA fora do prazo de validade; porque utilizaram bilhetes de identidade caducados no acto de reconhecimento das procurações conferidas ao mandatário judicial; e porque o mandatário judicial juntou Cartão de Identidade de Advogado com validade vencida.
Este Tribunal verifica que o Requerido, ao enunciar as excepções dilatórias nas contra-alegações, a fls. 231 a 257, refere-se à figura jurídica da incapacidade para contra-arguir a pretensão dos Requerentes de verem apreciado o mérito da presente acção de impugnação da candidatura de Adalberto Costa Júnior no XIII Congresso Ordinário.
De facto, a incapacidade é um pressuposto processual que inibe os tribunais de conhecerem os fundamentos substanciais de uma matéria controvertida colocada em juízo, pelo que, a ser afirmativa a existência de tal excepção dilatória, torna-se extinta a instância.
No caso em concreto, o Requerido demonstra um equívoco no que respeita à interpretação da distinção entre ilegitimidade e incapacidade, porquanto, em vários momentos das suas contra-alegações usa ambas expressões para formular as suas excepções sem delimitação clara de tais pressupostos processuais.
Ora, o termo incapaz refere-se normalmente à pessoa afectada por uma incapacidade de exercício. Neste caso, fala-se em menoridade, interdição, inabilitação ou, mesmo, em incapacidade acidental.
Segundo Luís A. Carvalho Fernandes as limitações à capacidade das pessoas singulares têm na sua origem a falta de certos requisitos ou qualidades - elementos da capacidade - que o Direito tem como atributos condicionantes da sua adequada actuação jurídica. In Teoria geral do direito civil, Vol. 1, 2009, pág. 234.
Para se aferir se um cidadão tem ou não personalidade jurídica, a lei angolana utiliza o critério da correspondência, ou seja, uma coincidência ou equiparação entre a personalidade jurídica da pessoa singular, a capacidade de gozo de direitos e a personalidade judiciária da mesma.
A personalidade jurídica, consiste na aptidão para ser titular autónomo de direitos e obrigações, sendo-lhe inerente a capacidade jurídica ou capacidade de gozo de direitos.
A capacidade jurídica de um cidadão, isto é, a medida de direitos e obrigações de que é susceptível uma pessoa, vem consagrada nos artigos 67.º e 69.º do CC. O artigo 67.º supra referenciado, traduzindo a inerência de capacidade jurídica à personalidade, estatui que as pessoas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição legal em contrário: nisto consiste a sua capacidade jurídica.
De acordo com Abílio Neto a capacidade jurídica é vista como uma possibilidade ou potencialidade de, bem ou mal, lícita ou ilicitamente, desencadear efeitos jurídicos. Por este motivo é tomada como capacidade e não como direito. In Código Civil Anotado, 20.ª Edição actualizada, 2018, pág. 51.
Existindo capacidade de exercício de direitos, via de regra, existe capacidade judiciária que, nos termos do n.º 1 do artigo 9.º do CPC, consiste, pois, na possibilidade da pessoa estar, por si, em juízo.
Em face de carência de personalidade judiciária, o Tribunal Constitucional deve abster-se de conhecer do pedido formulado pelo proponente e absolver a contraparte da instância, com fundamento na alínea c) do n.º 1 do artigo 288.º do CPC, que determina que o juiz deve abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância quando entenda que alguma das partes é destituída de personalidade judiciária ou que, sendo incapaz, não está devidamente representada ou autorizada.
Quanto aos menores, interditos ou inabilitados, embora tendo personalidade judiciária, não podem estar por si mesmos em juízo, nem por meio de representante por eles designado. Necessitam da intervenção de um representante legal ou de um curador para a prática em juízo dos actos relativos ao âmbito da sua incapacidade. São, portanto, incapazes, que devido à sua capacidade de exercício limitada, a sua capacidade judiciária sofre concomitantemente restrições.
Desta feita, os factos narrados pelo Requerido não permitem a este Tribunal qualificar os Requerentes e o Mandatário Judicial de incapazes, pois são maiores de idade e podem fazer-se representar em juízo pelo seu mandatário, nos termos e para efeitos dos artigos 5.º, 9.º e 32.º, todos do CPC.
Assim sendo, as matérias relativas ao facto de os Requerentes não pagarem quotas, apresentarem cartões de membro da UNITA fora do prazo de validade, utilizarem bilhetes de identidade caducados para formalizarem o patrocínio judiciário e o mandatário judicial juntar aos autos Cartão de Identidade de Advogado com validade vencida, serão analisadas nos pontos a seguir, com base na verificação da legitimidade, que é o pressuposto processual correcto para os devidos efeitos julgados legais nesta acção.
2.1. Sobre o facto de os Requerentes não terem sido Delegados ao Congresso
Os Requerentes dizem que têm legitimidade, mas o Requerido contradiz alegando, a fls. 232, que apenas dois dos Requerentes (Cândido Moisés Uasmuene e Madilu Samuel Bandeca) têm legitimidade, por terem sido Delegados ao XIII Congresso Ordinário. Os restantes oito (Manuel Diogo Pinto Seteco, Wilson Nunes Domingos Gomes, Dombaxi Sebastião Mafuta Garcia, Santo Fonseca Gouveia Diniz, Feliciano Gabriel Kututuma, Domingos Pedro, Dino Luís da Silva e Flávio da Costa Mucawa) não foram Delegados.
Alberto dos Reis explicita que “a verdade é que, sob o ponto de vista técnico e científico, a questão da legitimidade das partes é, na essência, uma questão de posição das partes em relação ao objecto da demanda, no tocante à relação jurídica substancial que se controverte. Há um interesse em conflito ou em litígio. Quando se põe o problema da legitimidade das partes, o problema, ou não tem sentido, ou tem este: Qual a posição das partes em relação a esse interesse? As partes são os titulares do interesse? São as pessoas a quem o interesse respeita? Em caso afirmativo, são legítimas; em caso negativo, ilegítimas. A questão da legitimidade é essencialmente uma questão de posição das partes em relação à lide, isto é, quanto à relação jurídica material, quanto ao conflito que o tribunal é chamado a resolver”. In Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 3.ª Edição, 1948, Reimpressão, Coimbra Editora, 2004, pág. 74. A legitimidade acima doutrinalmente considerada tem reflexo no artigo 26.º do CPC, conjugado com o artigo 2.º da LPC, determinando-se pela averiguação dos fundamentos da acção e pela posição das partes em relação a esses fundamentos.
Consultados os autos, a fls. 163 e 164, nota este Tribunal que, para além dos dois Delegados reconhecidos pelo Requerido, outros quatro Requerentes foram também Delegados e constam da lista nominal de presenças.
Verifica-se, pois, que, para além dos dois militantes alegadamente legítimos (Cândido Moisés Uasmuene, na posição 60, a fls. 460, e Madilu Samuel Bandeca, na posição 24, a fls. 487), na lista de presença dos Delegados ao Congresso constam, também, Dino Luís da Silva Chamucassa, na posição 44, a fls. 466, Feliciano Gabriel Castro Kututuma, na posição 49, a fls. 471, Domingos Pedro, na posição 65, a fls. 467, e Flávio da Costa Mucawa, na posição 94, a fls. 473, perfazendo o total de seis Requerentes que foram Delegados.
O Partido Político UNITA depositou neste Tribunal a lista de presenças no âmbito da anotação do XIII Congresso Ordinário e em obediência ao disposto na alínea k) do n.º 1 do artigo 21.º da LPP, visando provar o quórum através da participação de tais Delegados, pelo que os Requerentes aqui referidos gozam, assim, de legitimidade (fls. 446 a 502).
2.2. Sobre o facto de os Requerentes não terem participado na disputa ao cargo de Presidente da UNITA
O Requerido considera, a fls. 235, que os Requerentes não gozam de legitimidade para demandar por não terem participado no pleito eleitoral do XIII Congresso Ordinário, que culminou com a eleição de Adalberto Costa Júnior no cargo de Presidente da UNITA.
Este Tribunal constata que o direito dos militantes do Partido Político UNITA, de elegerem e de serem eleitos para os órgãos centrais ou intermédios, tem consagração estatutária, devidamente expressa na alínea b) do artigo 11.º dos Estatutos.
O referido articulado normativo também atribui aos militantes o direito de participarem da vida activa do Partido, de acordo com o respectivo grau de responsabilidade e no órgão em que estiverem enquadrados, bem como de beneficiarem de um cartão de identidade de membro da UNITA.
A condição de militante da UNITA adquire-se com o enquadramento do novo membro nos núcleos do Partido Político, após declaração livremente expressa. Com efeito, o princípio de uma sociedade alicerçada na igualdade de oportunidades defendido pela UNITA, ao abrigo da alínea a) do artigo 6.º e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos dos Estatutos de 2015, protege os seus militantes de qualquer injustiça interna no acesso aos tribunais.
Os princípios do Estado democrático de direito e do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, constitucionalmente consagrados nos artigos 2.º e 29.º da CRA, asseguram também a todos os cidadãos filiados em quaisquer partidos políticos o direito de apelarem à justiça diante da constatação da violação de normas estatutárias da sua respectiva formação política.
Deste modo, a legitimidade em demandar contra os actos ilegais dos órgãos de direcção não resulta de nenhuma obrigação dos Requerentes serem antes concorrentes ao cargo de presidente do Partido, mas dos Estatutos que, por imperativo do disposto na alínea c) do artigo 11.º, preveem que os militantes da UNITA gozam de proteção jurídica, para efeitos de acesso aos tribunais.
2.3. Sobre o facto de os Requerentes juntarem cartões de membro caducados
O Requerido veio dizer, a fls. 234, que Cândido Moisés Uasmuene, Flávio da Costa Mucawa, Madilu Samuel Bandeca e Santo Fonseca Gouveia Diniz não têm legitimidade, por terem apresentado cartões de membro da UNITA fora do prazo de validade.
Afirmativamente, os cartões de membro de Santo Fonseca Gouveia Diniz, Madilu Samuel Bandeca e Flávio da Costa Mucawa perderam validade formal antes do dia 11 de Maio de 2021, data em que intentaram, em situação de litisconsórcio voluntário, a presente acção. Mas este facto não é susceptível de ilidir a legitimidade, uma vez que, materialmente, o início da filiação e a sua cessação não dependem da validade do cartão de militante, conforme estabelece o artigo 9.º e o § único do artigo 19.º, ambos dos Estatutos da UNITA.
Por outro lado, Manuel Diogo Pinto Seteco, Madilu Samuel Bandeca, Flávio da Costa Mucawa, Domingos Pedro, Dino Luís da Silva Chamucassa, Wilson Nuno Domingos Gomes e Cândido Uasmuene, fls. 172, 175, 179, 182, 192, 195, 196 e 197, apresentaram os cartões de membros actualizados.
Em suma, o prazo vencido dos cartões de membro da UNITA não extingue a filiação partidária dos seus portadores, pelo que os militantes em causa gozam de legitimidade nos presentes autos, à semelhança do que ocorre em outros partidos políticos.
2.4. Sobre o facto de os Requerentes juntarem procuração reconhecida com bilhetes de identidade caducados
O Requerido alega que o cidadão Manuel Diogo Pinto Seteco tem o Bilhete de Identidade (BI) caducado desde 29 de Setembro de 2019, tal como Santo Fonseca Gouveia Diniz tem o BI caducado desde 25 de Agosto de 2020 e que, com estes mesmos documentos, procederam ao reconhecimento da Procuração conferida ao Advogado da causa.
Consultados os autos (fls. 167-168 e 170-171), verifica-se que, efectivamente, estes Requerentes tinham os seus bilhetes de identidade caducados na data em que reconheceram as procurações conferidas ao Mandatário Judicial.
É, decerto, por o BI constituir documento bastante para provar a nacionalidade angolana do seu titular perante quaisquer autoridades públicas e privadas (artigo 6.º da Lei n.º 4/09, de 30 de Junho, Sobre o Regime Jurídico da Identificação Civil e Emissão do Bilhete de Identidade de Cidadão Nacional), que os próprios estatutos da UNITA, na alínea o) do artigo 12.º, consideram ser um dever dos membros do Partido Político possuírem o referido documento de identificação civil.
No âmbito da representação voluntária, prescreve o artigo 262.º do CC que a procuração é o acto pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente, poderes representativos. E, salvo disposição legal em contrário, a procuração deve revestir a forma exigida para o acto que o procurador deve realizar.
Também de acordo com Ana Prata, in Código Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2017, pág. 318, a procuração é um acto jurídico unilateral, realizado por um sujeito que atribui por ele a outra pessoa poderes para o representar na prática de um acto ou na celebração de um negócio.
A procuração forense, prevista no artigo 35.º do CPC, vem estabelecer que o mandato judicial pode ser conferido por meio de instrumento público ou de documento particular, com intervenção notarial nos termos da respectiva legislação. Também pode ser conferido por declaração verbal da parte no auto de qualquer diligência que se pratique no processo (artigo 36.º do CPC).
Contudo, a forma solene de emissão da procuração forense não é obrigatória, inclusive pode ser verbal, com fundamento nos artigos 26.º e 87.º do CPC.
A lei permite, ainda, que a procuração seja emitida mediante outros documentos. E caso haja alguma irregularidade, ser notificado o procurador para efeitos de ratificação dos actos praticados, no espírito da gestão de negócios consagrada no artigo 464.º e segs. do CC e na alínea b) do n.º 1 do artigo 64.º do Código Notariado.
No exercício do direito de requisição de elementos, previstos nos termos conjugados do artigo 10.º e da alínea e) do n.º 2 do artigo 66.º, ambos da LPC, este Tribunal acorreu aos serviços de registos e notariado do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos para se pronunciar sobre a validade da procuração posta em causa pelo Requerido.
Por sua vez, este Órgão, através de ofício (fls. 440 e 441), respondeu que, “efetivamente, no dia 10 de Maio do corrente ano, neste Cartório Notarial, foi feito o reconhecimento por semelhança de uma procuração forense, registada nos nossos livros sob o n.º 08. O documento particular, que nos foi apresentado, teve intervenção e assinatura do Notário Adjunto (...), com elevada capacidade diligencial. O utente teve no cartório com a pretensão de reconhecer a assinatura aposta no documento. Para tal, apresentou cópia do Bilhete de Identidade, carta de condução e o recibo de revalidação do Bilhete de Identidade. Diante dos factos, verificou-se que os elementos acima descritos eram bastantes para a prática do referido acto, não obstante a isso, o mesmo fazia-se presente. Aliás, tinha o praticante do acto na altura a legitimidade para proceder ao reconhecimento de assinatura, por conhecimento pessoal, conforme alude a alínea a) do artigo 64.º do Código do Notariado Angolano. Porém, não o fez porque entendeu que a carta de condução é um documento equivalente, nos termos da alínea b) do artigo 64.º do Código do Notariado”.
Em face da informação oficial acima exposta, este Tribunal considera que as procurações foram devidamente reconhecidas com outros documentos de identificação admissíveis para o efeito, pelo que possuem validade jurídica, assegurando a legitimidade dos aqui Requerentes.
2.5. Sobre o facto de os Requerentes não pagarem quotas de membro
Noutro caso, o Requerido vem, a fls. 234, considerar que os Requerentes são ilegítimos com base no argumento de que não respeitaram o dever estatutário de pagarem as quotas há quase dois anos.
As quotas são contribuições pecuniárias estatutariamente fixadas, que os membros dos partidos políticos estão pontualmente obrigados a pagar, constituindo-se em fontes de financiamento e fundos de reforço da sustentabilidade financeira para a manutenção dos objectivos funcionais dos entes partidários.
Os Estatutos do Partido Político UNITA definem o pagamento de quotas como um dever de membro, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 12.º, mas não cominam com a medida disciplinar de suspensão ou expulsão os militantes que não pagam quotas.
Em regra, o não pagamento de quotas de membro de um partido político pode ter como consequência a restrição do direito de acesso aos congressos e conferências, a não admissão do militante a um processo de candidatura ou a não designação deste a cargos electivos ou de nomeação junto dos órgãos centrais, intermédios e de base.
Não existindo nenhuma disposição estatutária, que sancione com a medida de expulsão os militantes do Partido Político UNITA por falta de pagamento de quotas, este Tribunal não entrevê razões de base jurídica ou estatutária para afastar a legitimidade dos Requerentes, que decorre do facto de serem militantes.
Em síntese, observando as explanações que antecedem, resta a este Tribunal enunciar que nos processos de partidos políticos e coligações, a legitimidade é aferida, ab initio, pela junção nos autos processuais de cartão de militante, substituível por outros meios idóneos, nomeadamente o passe fiável e legível de delegado, a assinatura da lista de presença para aferição do quórum participativo ou a assinatura de documentos oficiais das comissões de trabalho especializadas do congresso.
Não obstante esta conclusão, a excepção dilatória, alegada pelo Requerido, a fls. 234 e 235, seria útil caso o processo relativo a partidos políticos dependesse de litisconsórcio necessário, que é uma situação regulada no artigo 28.º do CPC em que, por lei ou prévio acordo, é exigível a intervenção do primeiro até o último militante que a formação política possua no acto da propositura da impugnação, pelo que, faltando um requerente, o tribunal deixaria de ter a obrigação de conhecer do mérito da causa.
Diferente disso, a legitimidade dos requerentes nos processos relativos a partidos políticos é informada pelo litisconsórcio voluntário, consagrado no artigo 27.º do CPC. Este tipo de litisconsórcio traduz a situação em que, por o conflito interno de um partido respeitar a todos os seus militantes, a acção pode ser proposta por um ou vários membros e, de entre eles, se houver um proponente que não tenha legitimidade, o processo continua para que o Tribunal se ocupe da matéria controvertida, em respeito dos impugnadores que possuam legitimidade.
Portanto, é ao abrigo da natureza da legitimidade, inerente ao litisconsórcio voluntário, e com base nas provas de militância juntas nos autos do presente processo de impugnação da candidatura de Adalberto Costa Júnior, que a ordem jurídica constitucional reserva aos Requerentes o direito de litigar nesta instância jurisdicional especializada.
3. Sobre o facto de o mandatário judicial juntar cartão de advogado fora do prazo de validade
O Requerido defende-se, por excepção, que a constituição de advogado não está conforme, porquanto o mandatário judicial apresentou nos autos o Cartão de Identidade de Advogado emitido a 7 de Janeiro de 2017 e, regra geral, a sua validade é de apenas dois anos. Assim, entende o Requerido que a carteira do mandatário está fora do prazo de validade.
Em Angola, para desempenhar a advocacia e praticar actos próprios inerentes ao exercício da profissão, os mandatários devem estar inscritos na Ordem dos Advogados de Angola (OAA), nos termos do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 8/17, de 13 de Março, Lei da Advocacia.
Na vigência da Lei Constitucional de 1992, que perdurou até a aprovação da Constituição, em 2010, o Acordão n.º 112/2009, de 17 de Novembro, do Tribunal Constitucional, firmou uma jurisprudência no sentido de indeferimento do recurso por inobservância do pressuposto processual da legitimidade, pois o requerente não respeitou a obrigatoriedade de constituição de advogado.
Contudo, com o advento da Constituição de 2010, este Tribunal decidiu, nos Acórdãos n.º s 140/2011, de 25 de Agosto, 471/2017, de 14 de Dezembro, e 543/2019, de 16 de Abril, relativamente a processos de partidos políticos e coligações, conhecer do mérito da causa sem que houvesse constituição de advogado, devido às exigências dos princípios da adequação funcional e do direito de acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, previsto no n.º 1 do artigo 181.º e no artigo 29.º, ambos, respectivamente, da CRA.
A par disso, este Tribunal indagou a OAA sobre a condição de exercício de advocacia por parte do mandatário judicial dos Requerentes do presente processo, ao que esta respondeu, através do Ofício N/Ref.ª N.º 00659/OA-B/2021, de 20 de Junho, a fls. 338, que “o Sr. (...) inscrito nesta Ordem, tem o seu domicílio profissional na província de Luanda (...). Está regularmente inscrito na Ordem dos Advogados de Angola”.
Deste modo, a alegada ilegitimidade do mandatário judicial para advocare, que foi aqui levantada pelo Requerido, a fls. 233 e 234, fica ilidida pela confirmação da sua inscrição regular na OAA, tornando-se, assim, admissível o patrocínio judiciário conferido aos Requerentes.
4. Sobre a anotação do XIII Congresso Ordinário pelo Tribunal Constitucional
O Requerido, a fls. 236, defende, e com razão, que, no caso vertente, para efeitos de impugnação, os Estatutos reguladores da realização do XIII Congresso Ordinário são aqueles que o precedem, isto é, aqueles que foram aprovados antes, no XII Congresso Ordinário, realizado em Dezembro de 2015, já que os Estatutos de 2019 só foram publicados no Diário da República (III SÉRIE, N.º 87) a 18 de Junho de 2020.
É oportuno salientar que este Tribunal também publicou neste mesmo Diário da República (DR) o Despacho n.º 3/20, de 18 de Junho, que anotou a direcção dos órgãos singulares e colegiais do Partido Político UNITA, o seu Programa, bem como reputou por depositados e registados as listas dos membros dos órgãos de direcção, as actas e demais documentos do Congresso.
A publicação oficial dos Estatutos e do Despacho teve como objectivo tão somente, como se lê no DR referido pelo Requerido, a fls. 17, "anotar e registar" o Congresso e as respectivas deliberações.
De facto, a validade dos congressos depende do respeito pela Constituição e pela lei, e não do acto administrativo de anotação e registo, que, após 45 dias, a contar da realização de um conclave, o Tribunal pratica com base nos documentos entregues pelos partidos e coligações, no cumprimento apenas dos seguintes requisitos exigidos no artigo 21.º da LPP: a) lista geral dos militantes eleitos para os órgãos de direcção; b) cópia do Bilhete de Identidade dos militantes eleitos para os órgãos de direcção; c) Certificado de Registo Criminal; d) convocatória; e) actas eleitorais provinciais dos delegados ao Congresso; f) actas eleitorais do Congresso; g) programa com as alterações produzidas; h) estatutos alterados com a indicação das disposições estatutárias alteradas; i) composição (número de membros) dos órgãos colegiais de direcção do partido; j) lista contendo os nomes dos membros; e lista de presenças assinadas pelos presentes para aferição do quórum.
Como se pode conferir no elenco dos requisitos do artigo 21.º da LPP, entre os elementos para anotação e registo de congressos não perfila a obrigação de o candidato eleito presidente provar, mediante junção de documento autêntico, que respeitou a filiação única ou que não possuía outra nacionalidade além da angolana no momento da sua candidatura ou eleição.
Daí que, relativamente a este Tribunal, o seu menor nível de intervenção origine um maior grau de autonomia e protecção do funcionamento dos partidos e dos seus actos de democraticidade interna, enquanto que o maior nível de intervenção, ao ponto de validar ou invalidar um congresso por via de despacho administrativo, resulte numa menor protecção da densidade dos propósitos político-partidários, podendo condicionar a qualidade institucional, a liberdade e a estabilidade das formações políticas.
Este critério, na sua vertente proibitiva da excessiva acção interventiva do Tribunal, tem, ainda, como objectivo acautelar que, com a anotação e o registo, o poder administrativo torne ineficiente a aplicação da lei quanto ao direito dos militantes e órgãos do partido de intentarem acções de impugnação de eleições ou de qualquer outro conflito interno, mesmo havendo suspeita de violação de princípios, como, por exemplo, da filiação única ou da condição de dirigente partidário, ínsitos nos artigos 23.º, 25.º e no n.º 2 do artigo 29.º, todos da LPP.
A violação destes princípios sugere uma nulidade somente apreciável em sede de processos que venham a ser despoletados por militantes no exercício do seu direito basilar de acesso ao Tribunal. E este direito, no rigor jus-constitucional, não se veta sob argumento de que, por um acto administrativo, o Tribunal suprimiu da Constituição a garantia de queixa jurisdicional, único instrumento de denúncia das inobservâncias dos partidos políticos à lei, aos estatutos, às convenções partidárias e aos regulamentos internos.
O despacho de anotação dos congressos, propondo-se a concretizar a prossecução pública dos fins dos partidos políticos através do reconhecimento, pelos cidadãos, da identidade dos membros ou titulares dos órgãos de direcção e da publicação oficial dos Estatutos em DR, conforme prevê o artigo 9.º da LPP, não tem como objectivo limitar direitos dos cidadãos protegidos na Constituição.
É propício ainda assinalar que, enquanto a anotação e registo, previstos no n.º 3 do artigo 20.º e no artigo 21.º da LPP, dependem apenas da entrega dos documentos acima enumerados – sobretudo nos casos em que violações graves à lei e aos estatutos não podem ser conhecidas oficiosamente pelo Tribunal –, a sustentabilidade da validade dos congressos depende dos partidos políticos agirem no quadro da Constituição e da lei.
Neste contexto, é salvaguardada a prerrogativa constitucional e legal dos militantes arguirem contra práticas opostas à legalidade, fazendo com que a validade dos actos dos partidos políticos apenas subsista se tiverem sido praticados com reverência a regras fundamentadas na Lei Magna e na legislação ordinária aplicável.
Isto pressupõe a compreensão de que só havendo respeito pela ordem constitucional, como fim último das instituições políticas, por assim dizer, é que a validade dos actos partidários estará acautelada ad aeternum, independentemente de surgirem eventuais impugnações contra actos dos órgãos singulares ou colegiais de direcção.
É por isso que a nulidade opera por força da lei, é invocável a todo o tempo por qualquer militante interessado, é, em regra, insanável, e constitui um facto impeditivo da eficácia dos actos partidários, e também pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal, nos termos e para efeitos do artigo 286.º do CC.
Em resumo, a anotação administrativa do XIII Congresso Ordinário do Partido UNITA nos arquivos deste Tribunal e a publicação dos Estatutos no DR não têm efeitos legais de validação, mas correspondem a um registo a que a lei atribuiu eficácia jurídica, sem prejuízo dos actos a si relacionados, padecendo de ilegalidades, poderem ser constitucionalmente apreciados por via judiciária.
5. Sobre a tempestividade da presente impugnação da candidatura de Adalberto Costa Júnior
O Requerido afirma, a fls. 247, que o XIII Congresso Ordinário teve lugar há quase dois anos e que não se justifica a presente impugnação, porque os Requerentes sabem que a certidão de renúncia foi apresentada na reunião do Comité Permanente do dia 21 de Outubro de 2019.
Assim, e porque a ocorrência de prescrição ou caducidade determina a absolvição do pedido nas acções jurisdicionais, importa a este Tribunal sindicar, aqui, no âmbito das excepções, se, por um lado, havia um prazo dentro do qual o direito dos Requerentes devia ser exercido (caducidade) ou se, por outro, os Requerentes impugnaram tempestivamente a candidatura do presidente eleito do Partido Político UNITA (prescrição).
A caducidade é uma forma de extinção de direitos (e dos correspondentes deveres), em consequência do não exercício de um direito de acção ou omissão durante um determinado período de tempo, e a prescrição é a perda da pretensão ao exercício do direito de acção, por deixar passar o prazo para a prática de um específico acto.
Relativamente ao exercício tempestivo do direito de acção para impugnar actos das formações políticas, o n.º 3 do artigo 29.º da LPP, sem indicar um prazo, vem estabelecer apenas que a impugnação de qualquer acto pelos militantes e membros dos órgãos de direcção dos partidos políticos deve estar sujeita a prazos expressamente previstos na lei.
As normas reguladoras do funcionamento judiciário deste Tribunal não preveem prazos de impugnação de conflitos internos de partidos políticos e coligações. Para tudo, quanto não seja expressamente previsto na legislação deste Tribunal, o artigo 2.º da LPC estabelece que são aplicáveis aos processos, com necessárias adaptações, as normas do Código de Processo Civil.
Os termos do n.º 1 do artigo 205.º do CPC defendem que, “quanto às outras nulidades, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o acto não terminar (…)”. Embora esta disposição sobre o prazo de arguição retrate mais uma acção que já esteja a correr termos dentro de um tribunal é uma regra geral que melhor se aplica, mutatis mutandis, aos casos de partidos políticos.
É que, não havendo normas precisas sobre regulação de prazos das acções contra actos nulos que tenham sido praticados pelos membros de direcção de partidos políticos, o prazo de impugnação de candidatura de um congresso electivo só pode ser contado a partir do momento da prática do acto até à realização do acto seguinte que lhe der fim.
Isto significa dizer que, enquanto os órgãos eleitos num congresso cujos actos de candidatura foram postos em causa não terminarem funções, prevalece o direito de acção, ou seja, mantém-se o prazo de impugnação por parte dos respectivos militantes.
Assim, é impugnável a candidatura do presidente de um partido político, a eleição dos demais órgãos de direcção ou a validade de um congresso, se os órgãos ainda se encontrarem no decurso do mandato, sob pena de, não estando em exercício de função, a acção de impugnação resultar numa decisão que declare a existência de inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do artigo 287.º do CPC.
Portanto, uma vez que os Requerentes vieram arguir de nula a candidatura de Adalberto Costa Júnior a presidente da UNITA (fls. 222), a nulidade, sendo uma sanção civil para o acto em relação ao qual faltem alguns dos requisitos exigidos por lei para a validade do mesmo, permite a sua arguição sem limite de tempo, nos termos do artigo 286.º do CC.
B) QUESTÕES DE FUNDO
Após o desenvolvimento da fundamentação em torno da questão prévia, torna-se oportuno responder a um conjunto de questões que sustentam as alegações dos Requerentes e do Requerido em matéria de inelegibilidade, prazos de apresentação, verificação e apuramento de candidaturas, competência do Comité Permanente da Comissão Política do Partido UNITA e regulação legal de prazos.
A lei reserva ao Tribunal Constitucional o direito de, ao dirimir os conflitos internos de partidos políticos, fazer recurso à legislação constitucional, infraconstitucional e estatutária que melhor assegurem a fácil interpretação de cada facto de relevância jurídica existente no presente processo e a justa realização da justiça quanto aos direitos das partes, protegendo a Constituição como um todo (artigo 177.º da CRA, artigo 1.º da LOTC e artigo 3.º da LPC).
Desta feita, seguem-se os seguintes pressupostos de apreciação:
i) Sobre o requisito da inelegibilidade segundo a CRA
Os Requerentes alegam (fls. 207 e 208) que o facto de o Presidente eleito possuir dupla nacionalidade, aquando da apresentação da sua candidatura às eleições do XIII Congresso, tornou-o inelegível por falta de capacidade eleitoral passiva ao cargo de Presidente da República, nos termos do artigo 110.º da CRA.
A Constituição prevê, na alínea a) do n.º 2 do artigo 110.º, que são inelegíveis ao cargo de Presidente da República "os cidadãos que sejam titulares de alguma nacionalidade adquirida". Mas a inelegibilidade do candidato a presidente do Partido Político UNITA não resulta desta norma constitucional.
Em termos gerais, a Constituição de 2010 e a Lei n.º 36/11, de 21 de Dezembro, Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais, vêm elucidar, nos seus artigos 111.º e 31.º, respectivamente, que as candidaturas para Presidente da República, a par de serem propostas pelos partidos políticos e coligações análogas, podem incluir cidadãos não filiados nas formações políticas concorrentes.
Na verdade, a candidatura de militantes ao cargo de presidente de partido político não tem relação directa com o concurso eleitoral para Presidente da República, por serem actos politicamente distintos e passíveis de inferência de posições solúveis: no caso da candidatura para presidente de partido político, o candidato sujeita-se ao princípio da representatividade democrática interna, para ocupar o principal cargo partidário, ao passo que "a chefia do Estado passa por estar subordinada ao princípio representativo e, em princípio, à igualdade de acesso dos cidadãos aos cargos políticos...", conforme explica Raul Carlos Vasques Araújo, in O Presidente da República no Sistema Político de Angola - 1975-2010, 2.ª Edição, Almedina, 2017, pág. 44.
Todavia, vem o disposto no n.º 3 do artigo 13.º dos Estatutos da UNITA, aprovados no XII Congresso Ordinário de 2015, enfatizar que o “Presidente da UNITA é o candidato do Partido às eleições gerais para o cargo de Presidente da República de Angola”.
Em face desta realidade, quanto à verificação das condições de inelegibilidade dos militantes da UNITA ao cargo de direcção presidencial do Partido, é impreterível ter em linha de consideração a condição de possuir nacionalidade angolana originária e de não ser titular de qualquer nacionalidade adquirida.
O fundamento desta exigência está enraizado, entre outras razões, na problematização da exteriorização do pensamento do presidente de um partido político. Em termos práticos, o ponto crítico é a impossibilidade de autonomização, na pessoa do presidente da formação política, de duas situações concretas com que se depara, a saber: uma situação, política ou funcional de legitimidade originária, referente à sua actuação enquanto cidadão angolano de nacionalidade originária que dirige o partido político; outra situação, política ou funcional de legitimidade adquirida, referente à gestão do mesmo partido político enquanto cidadão estrangeiro com nacionalidade adquirida.
Diante deste conflito, a solução do legislador ordinário, por maioria de razão, foi instituir o princípio da condição de dirigente partidário, por meio do qual assevera que a qualidade de presidente de partido político ou coligação de partidos políticos é exclusiva dos cidadãos angolanos de nacionalidade originária e que não possuam outra nacionalidade além da angolana, ao abrigo do n.º 3 do artigo 25.º da LPP.
Com este sentido, é mister concluir que a inelegibilidade do candidato para o cargo de presidente do Partido Político UNITA deriva do disposto na alínea a) do artigo 22.º do Regulamento Eleitoral do XIII Congresso Ordinário de 2019 e no n.º 3 do artigo 25.º da LPP, e não propriamente da norma do artigo 110.º da CRA.
Neste sentido, o Tribunal considera que não assiste razão aos Requerentes.
ii) - Sobre a violação do prazo de apresentação da candidatura
Alegam os Requerentes que, na reunião do Comité Permanente, do dia 8 de Outubro de 2019, foram prestadas informações das candidaturas formalizadas e o candidato Adalberto Costa Júnior, até 7 de Outubro, dia do encerramento da fase de apresentação das candidaturas, não tinha certidão de renúncia da nacionalidade portuguesa. Contudo, o mesmo defendeu-se dizendo que já havia submetido o documento à Comissão dos Assuntos Jurídicos e Estatutários.
Os Requerentes acrescentam (fls. 210) que o presidente eleito faltou à verdade, de forma dolosa, porque a renúncia à nacionalidade portuguesa só ocorreu no dia 11 de Outubro, e os membros do Comité Permanente receberam os respectivos documentos e tomaram conhecimento da renúncia apenas no dia 21 de Outubro, conforme Acta n.º 51/EXTRA/2019, a fls. 293, através de um ofício datado do dia 18 do mesmo mês.
Por sua vez, o Requerido veio sustentar que, por deliberação do Comité Permanente, ínsita na Acta n.º 50/EXTRA/2019, a fls. 280, do dia 11 de Outubro, o prazo de apuramento definitivo da candidatura de Adalberto Costa Júnior foi prorrogado até três (3) dias antes do início do congresso, data limite para a apresentação da prova de renúncia da outra nacionalidade adquirida.
Terá esta deliberação do Comité Permanente respeitado as fases do processo eleitoral comuns em todas as instituições partidárias?
Vejamos:
Os partidos políticos, na realização dos seus congressos, para a legitimação democrática dos seus órgãos internos, praticam actos nas seguintes fases do processo eleitoral:
Aliás, no mesmo sentido vem o Requerido referir, a fls. 243, que “a eleição é um processo que comporta, pelo menos, três fases, que ocorrem em momentos distintos (transversal a todos os processos eleitorais). A 1.ª fase, que é a de manifestação e formalização de candidaturas; a 2.ª fase, que é a de apuramento de candidaturas; e a 3.ª, última fase, que é a do suffragium, ou seja, o exercício do voto passivo e activo”.
O Regulamento Eleitoral do XIII Congresso Ordinário da UNITA, apresentado pelo Requerido em sua própria defesa, estabelece (fls. 352), no artigo 33.º, que “a campanha eleitoral tem a duração de trinta dias, com início no dia 11 de Outubro de 2019, terminando no dia 11 de Novembro de 2019, às 24 horas”. Esta fase é autónoma e pressupõe o término da fase de candidaturas, pois a calendarização das fases de um Congresso rege-se por normas claras e objectivas de um regulamento.
Atento ao facto de que a campanha eleitoral iniciou no dia 11 de Outubro, facilmente se compreende que o apuramento final das candidaturas ocorreu um dia antes, no caso, no dia 10. De resto, é também isto que a Acta n.º 46/EXTRA/2019 vem confirmar, ao frisar (fls. 269) que, de 7 a 10 de Outubro, a Comissão de Mandatos procedeu ao encerramento da apresentação das candidaturas e fecho do apuramento.
Assim sendo, nos dias 7 e 10 de Outubro, em que encerrou a fase de apresentação e apuramento das candidaturas, o pré-candidato Adalberto Costa Júnior ainda possuía a nacionalidade portuguesa adquirida, um elemento essencial de inelegibilidade que obriga à rejeição, in limine, da candidatura e nunca pode, por isso, dar lugar à sua aprovação, mesmo que condicionada.
A fls. 280 dos autos, este Tribunal verifica que o Requerido reconhece (…) que, do ponto de vista jurídico, a prova de renúncia à nacionalidade seria logo feita no momento da apresentação da candidatura, e fundamenta esta tese em obediência ao princípio da legalidade, socorrendo-se da norma do n.º 3 do artigo 25.º da LPP.
No entanto, tendo a candidatura sido recebida e uma vez que o prazo de reclamação e apuramento terminava no dia 10 de Outubro, o candidato gozava do direito de fazer prova da perda da nacionalidade portuguesa adquirida até àquela data, a julgar pelo facto de, no dia 11 do mesmo mês, ter tido início a fase da campanha eleitoral, segundo consta do artigo 33.º do Regulamento Eleitoral aprovado pela UNITA em 2019 para o XIII Congresso Ordinário.
Por imperativo deste Tribunal decidir com base em provas constitucionalmente respaldadas, ao abrigo do disposto no artigo 10.º da LPC, foram os serviços de justiça e dos registos civis de Portugal contactados, no sentido de enviarem elementos probatórios julgados necessários e convenientes para a apreciação e decisão do presente processo.
Os autos compulsados (fls. 409 a 418) demonstram que o candidato Adalberto Costa Júnior não possuía condições de elegibilidade para que a sua candidatura fosse aprovada até ao dia 10 de Outubro. Na verdade, o advogado e representante legal de Adalberto Costa Júnior, com sede em Portugal, só apresentou à Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa o pedido de perda de nacionalidade no dia 27 de Setembro de 2019 (fls. 411 dos autos).
Sequentemente, a Declaração para Perda da Nacionalidade Portuguesa (fls. 412 e 413) foi preenchida pelo mandatário em Portugal no dia 8 de Outubro, isto é, após o encerramento das candidaturas, ocorrido no dia 7 de Outubro. E a decisão de renúncia foi proferida pela Conservatória dos Registos Centrais portuguesa a 11 de Outubro (fls. 416 a 418), data posterior ao término da fase de apresentação das candidaturas e dia de início da campanha eleitoral dos concorrentes apurados.
Facilmente se infere que o pré-candidato se mostrou indiferente, ou seja, “deu de barato” o requisito legal que impunha a obrigação de obter a renúncia antes do encerramento da fase das candidaturas, e que a decisão do Comité Permanente de aceitação da candidatura contraria o n.º 3 do artigo 25.º da LPP, porquanto o membro do Partido não reunia os requisitos de admissibilidade da sua candidatura, nem tão pouco para aprovação, ainda que sob condição.
Hodiernamente, em termos jurídicos, é por meio da lei escrita que a sociedade e qualquer instituição melhor se organiza, pois é nela que se estabelecem regras de funcionamento e de convivência, para o controle e prevenção de possíveis arbitrariedades. É pela lei que são assegurados direitos e prescritos deveres para as pessoas colectivas de direito privado.
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, nos termos do seu artigo 6.º, dispõe que “a Lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através dos seus representantes, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, quer se destine a proteger quer a punir. Todos os cidadãos são iguais a seus olhos…”.
Portanto, fica evidente que o princípio da legalidade deve ser respeitado pelos partidos políticos, em todas as fases do processo eleitoral interno.
Os Estatutos, aprovados no XII Congresso Ordinário de Dezembro de 2015, aquilatam, no seu artigo 1.º, que o Partido UNITA se rege pelos seus próprios Estatutos e Regulamentos do Partido, pela Lei dos Partidos Políticos e demais legislação aplicável. Nesta perspectiva, a alínea a) do artigo 22.º do Regulamento Eleitoral do XIII Congresso Ordinário, na esteira do n.º 3 do artigo 25.º da LPP, determina o seguinte: São inelegíveis ao cargo de Presidente da UNITA (…) os membros titulares de alguma nacionalidade adquirida.
Assim sendo, a admissão da candidatura de Adalberto Costa Júnior no dia 21 de Outubro de 2019, quando já estava em curso a campanha eleitoral, conforme demonstra a Acta n.º 51/EXTRA/2019 (fls. 293), viola o artigo 33.º do Regulamento Eleitoral aprovado para o XIII Congresso, segundo o qual a campanha eleitoral tem a duração de trinta dias, com início no dia 11 de Outubro de 2019, terminando no dia 11 de Novembro de 2019, as 24 horas.
Pelo acima exposto, o Tribunal entende que assiste razão aos Requerentes quando alegam que Adalberto Costa Júnior era inelegível no momento do apuramento das candidaturas, porque os autos, fls. 263 e 416, referentes à decisão de renúncia e ao averbamento da perda da nacionalidade portuguesa, ambos datados de 11 de Outubro de 2019, provam que o pré-candidato ainda era titular da nacionalidade adquirida até ao dia 10 de Outubro de 2019, pois a renúncia só entrou na esfera de conhecimento da Comissão de Mandatos do XIII Congresso no dia 18 de Outubro (fls. 260).
iii) Sobre as decisões do Comité Permanente na avaliação e apuramento das candidaturas
Os Requerentes alegam (fls. 208, 210 e 238) que as candidaturas formalizadas e apuradas foram apresentadas ao Comité Permanente nas suas reuniões dos dias 8 e 11 de Outubro de 2019, e que este órgão analisou exaustivamente os processos e alargou o prazo de apuramento da candidatura de Adalberto Costa Júnior, usurpando as competências da Comissão de Mandatos (fls. 398), nos termos do artigo 4.º do Regulamento Interno do XIII Congresso (fls. 519).
O Requerido contra alega (fls. 238) dizendo que o acto do Comité Permanente foi uma "deliberação soberana". Assim, no dia 11 de Outubro, o Comité decidiu que Adalberto Costa Júnior podia concluir a sua candidatura, mediante comprovativo de renúncia da nacionalidade portuguesa, até três (3) dias antes do início do Congresso (cfr. Acta n.º 50/EXTRA/2019, a fls. 280), e que a candidatura de Raul Manuel Danda devia ser analisada por um “Comité de Sábios”, criado naquela reunião e integrado por oito (8) anciãos do Partido.
A Constituição define, no seu artigo 17.º, os partidos políticos, como instituições que, no quadro da Constituição e da lei, “concorrem em torno de um projecto de sociedade e de programa político, para a organização e para a expressão da vontade dos cidadãos…”, obrigando-se no exercício da sua actividade, a respeitar os princípios fundamentais, realçando-se aqui a “prossecução pública dos fins” e a “organização e funcionamento democráticos”.
Assim sendo, a apreciação conferida à singularidade da matéria em apreço sugere, da parte deste Tribunal, uma apreciação, deveras incontornável, do que consagra a alínea h) do artigo 20.º da LPP, no sentido de que os Estatutos devem incluir "os órgãos competentes para a apresentação de propostas de candidatos".
Uma vez que a lei determina que devem existir órgãos de recepção de candidaturas, entenda-se que se está perante a obrigação de serem criados órgãos para a gestão, rejeição ou aprovação livre e justa das propostas de candidatos no âmbito da realização dos congressos. Disto decorre a realidade dos órgãos centrais de quaisquer partidos políticos, ao encontrarem-se em véspera de renovação de mandatos e, consequentemente, em situação demissionária, funcionarem para assuntos correntes, porquanto são as comissões de trabalho especializadas que conduzem todo o processo eleitoral e deliberam em matéria das candidaturas e das eleições.
A exigência legal sobredita não pressupõe apenas o dever dos partidos políticos constituírem o órgão ao qual são submetidas as candidaturas, que é a parte mais importante da iniciação de um congresso, mas também estabelecerem regras e critérios referentes à observância da democraticidade interna na forma legal e justa de funcionamento do partido, como estabelece a alínea n) do n.º 2 do artigo 20.º da LPP.
Só respeitando a supra disposição legal passa a ser possível garantir a transparência, a isenção e a lisura em todo o procedimento de renovação dos órgãos directivos de um partido político. Por isso, em face da devida coerência institucional perante a Constituição, afigura-se pertinente advogar que as deliberações do Comité Permanente, órgão deliberativo nos termos do artigo 24.º dos Estatutos, relativamente à admissão da candidatura de Adalberto Costa Júnior (e também em relação à candidatura de Raul Manuel Danda), contrariam o princípio da competência.
No caso, cabia à Comissão de Mandatos decidir sobre tais matérias e dentro do prazo anterior ao início da campanha eleitoral, marcado para 11 de Outubro de 2019 (artigo 33.º do Regulamento Eleitoral), sendo as decisões desta Comissão passíveis de recurso para o Plenário da Comissão Organizadora do Congresso, de acordo com a alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento Interno.
Esta forma assertiva de trabalho não é alheia ao histórico de organização de congressos da FNLA, PRS, MPLA e Bloco Democrático, muito menos ao penúltimo congresso da UNITA. Nos arquivos deste Tribunal estão presentes os documentos reitores do XII Congresso Ordinário da UNITA, realizado em 2015, onde constam os regulamentos das comissões de trabalho, com destaque para a Comissão de Mandatos, a que, nos termos do artigo 3.º do seu Regulamento, competiu "receber, analisar, registar e validar os processos de candidaturas ao cargo de Presidente do Partido, nos termos dos Estatutos".
Já em relação ao XIII Congresso de Novembro de 2019, as competências de analisar, condicionar ou validar as candidaturas foram exercidas pelo Comité Permanente, como demonstram as Actas do próprio órgão de direcção, não observando o princípio da legalidade, norteador do funcionamento dos partidos políticos, sobre os quais também recai o dever de respeitarem e fazerem respeitar a lei no Estado democrático de direito, à luz dos artigos 1.º, 2.º, 6.º e 17.º, todos da CRA, dos artigos 1.º e 8.º da LPP e do artigo 1.º dos Estatutos do Partido UNITA de 2015.
Portanto, os actos do Comité Permanente, consubstanciados na avaliação e decisão sobre o apuramento das candidaturas, mormente as de Adalberto Costa Júnior e Raul Manuel Danda, violam o princípio da legalidade e o princípio da competência, previstos no n.º 2 do artigo 6.º da CRA, na alínea h) do n.º 2 do artigo 20.º da LPP e no n.º 3 do artigo 89.º dos Estatutos saídos do XII Congresso Ordinário.
Por isso, não colhe a alegação do Requerido quando, em sua defesa, aduz, a fls. 240, que as candidaturas foram aprovadas pelo Comité Permanente no estrito respeito à lei, aos Estatutos e aos regulamentos internos do Partido UNITA.
Os Requerentes alegam (fls. 201 e 211) que, no dia 8 de Outubro de 2019, foi realizada a reunião extraordinária do Comité Permanente, em que a Comissão de Mandatos apresentou o relatório do tratamento dos processos dos concorrentes, porque o prazo de entrega das candidaturas havia terminado no dia 7 do mesmo mês e ano.
O Requerido, a fls. 243 e 244 dos autos, confirma que a fase de apresentação de candidaturas encerrou no dia 7 de Outubro, mas explica que, por decisão do Comité Permanente, o apuramento estendeu-se até ao dia 21, data em que foram aprovadas as candidaturas de Adalberto Costa Júnior e de Raul Manuel Danda.
Olhando para as alegações e contra alegações dos Requerentes e do Requerido, respectivamente, dúvidas não restam de que a tónica da questão são os prazos de recepção, avaliação, apuramento e encerramento da fase de candidaturas, decididos pelo Comité Permanente por acta, o que leva este Tribunal a analisar se tais actos praticados por este órgão central estão conforme os limites consagrados na Constituição e na lei, sobre as competências dos entes directivos dos partidos políticos e a forma das suas deliberações.
Os partidos políticos, por possuírem competências no domínio da organização do poder político do Estado (artigo 17.º da CRA e artigo 1.º da LPP), são, na sua essência, o expoente máximo do exercício da liberdade de associação, e gozam de autonomia igualmente conferida às associações de direito privado (artigos 48.º e 55.º da CRA), sobre as quais recaem as limitações genéricas impostas pela Constituição e pela lei.
Pela ordenação da vida interna e pelas funções políticas que exercem, os partidos políticos, na sua actuação para eleição de órgãos de direcção, submetem-se aos limites decorrentes do necessário respeito pelos subprincípios da transparência, da formação de actos e da decisão política lícita, corolários do princípio da organização e funcionamento democráticos, previsto na alínea f) do n.º 2 do artigo 17.º da CRA.
Entretanto, verifica-se que o Partido UNITA não respeitou a necessária submissão aos supra mencionados limites. O Comité Permanente, de forma ilegítima, para além de ter desempenhado o papel da Comissão de Mandatos conforme acima constatado, reiterou uma violação a regras elementares de elaboração de regulamentos (eleitoral e interno) do Congresso, com prazos gerais, abstractos e imperativos.
Na Acta n.º 49/EXTRA/2019, de 8 de Outubro e na Acta n.º 50/EXTRA/2019, de 11 de Outubro, lê-se, a fls. 282 e 276, respectivamente, que o Comité Permanente aprovou o Regulamento Interno e o Regulamento Eleitoral, ambos do XIII Congresso Ordinário. Após consulta, fls. 342 e 518, este Tribunal entrevê que os mesmos regulamentos, judicialmente solicitados, estranhamente, são completamente omissos em relação a quaisquer prazos da fase de candidaturas.
Ao invés de regulamentar, o Comité Permanente optou, de motu proprio, por fixar os prazos na Acta n.º 46/EXTRA/2019 (fls. 269), determinando o dia 7 de Outubro para fecho do período de apresentação das candidaturas, os dias 7 a 10 de Outubro para tratamento dos processos das candidaturas remetidas à Comissão de Mandatos, o dia 11 de Outubro para apresentação das candidaturas apuradas e início da campanha eleitoral, e o dia 11 de Novembro para término da campanha eleitoral.
Entretanto, devido à inelegibilidade do militante Adalberto Costa Júnior, o Comité Permanente decidiu alterar, no dia 11 de Outubro, o prazo de apuramento das candidaturas que havia terminado no dia anterior. Desta vez, em Acta n.º 50/EXTRA/2019, o mesmo órgão decidiu que o apuramento da candidatura do militante ficasse condicionada à apresentação da prova de renúncia à nacionalidade portuguesa adquirida, até três (3) dias antes do início do Congresso.
Fica claro que a inexistência de um regulamento eleitoral ou interno, que devia conter normas de prazos gerais, abstractos e imperativos do processo de candidaturas em geral, deu vazão a alterações de datas em benefício do pré-candidato Adalberto Costa Júnior, eleito presidente, tal como de Raul Manuel Danda, levando o Comité Permanente a dilatar prazos e a decidir sobre o apuramento das candidaturas, o que viola a norma do n.º 3 do artigo 89.º dos Estatutos, que prevê que “a forma de convocação e o funcionamento dos órgãos electivos e deliberativos do Partido são fixados nos regulamentos aos Estatutos”.
As formas dos actos do Comité Permanente, enquanto órgão deliberativo do Partido Político UNITA, são os Regulamentos, as Resoluções e as Recomendações, nos termos conjugados do n.º 1 do artigo 90.º e da alínea c) do n.º 2 do artigo 24.º, ambos dos Estatutos aprovados no XII Congresso.
Se o referido Partido Político tivesse respeitado as supra citadas normas e outras dos seus Estatutos, no regulamento eleitoral ou no regulamento interno, aprovados pelo Comité Permanente, teriam sido previstos prazos de candidaturas aplicáveis a qualquer um dos candidatos, iguais entre si, sem distinção de qualquer natureza, sem servir uma situação concreta e que seriam de cumprimento obrigatório para todos.
Além do mais, o Comité Permanente teria, inclusive, evitado dilatar prazos, intervir e até mesmo decidir sobre o processo de candidatura de Adalberto Costa Júnior, bem como de Raul Manuel Danda e não incorreria na prática de actos que, no caso presente, puseram em causa as disposições das alíneas h) e n) do n.º 2 do artigo 20.º da LPP, relativamente aos princípios da competência do órgão de candidatura e da democraticidade interna.
O candidato eleito presidente só perdeu a nacionalidade adquirida no dia 11 de Outubro e apenas no dia 18 deu conhecimento à Comissão de Mandatos conforme supra frisado. Entre os dias 7 e 10, período de recepção e validação final das candidaturas, Adalberto Costa Júnior ainda era titular da nacionalidade portuguesa adquirida.
Finalmente, os Requerentes formularam, a fls. 222, o pedido de nulidade da candidatura de Adalberto Costa Júnior. Será este pedido atendível, em virtude do que estabelece o princípio da legalidade constitucional?
As Actas nºs 46/EXTRA/2019, 50/EXTRA/2019 e 51/EXTRA/2019, a fls. 265, 276 e 293, constituem elementos demonstrativos que tornam nulo o processo da candidatura de Adalberto Costa Júnior, tal como acontece com a candidatura de Raul Manuel Danda.
Neste sentido, conforme dados constantes das actas supra citadas, a prorrogação do período de apuramento da candidatura, a avaliação das condições de admissão condicionada da mesma candidatura, bem como a sua aprovação definitiva por parte do Comité Permanente, sem competência legal para o efeito, para além dos prazos de candidaturas fixados em actas, ao invés de constarem em regulamento eleitoral ou regulamento da Comissão de Mandatos, são actos que ferem de nulidade não só a candidatura de Adalberto Costa Júnior, mas todo o processo eleitoral.
Este Tribunal nota, aliás, que não faltaram reações, por parte dos membros presentes na reunião do Comité Permanente, quanto à violação das normas legais e estatutárias e, sobre isto, transcreve-se da Acta n.º 51/EXTRA/2019, de 21 de Outubro (fls. 293), o seguinte:
"Foram analisados os documentos apresentados e verificou-se que os mesmos são autênticos e que, nos termos do artigo 8º. da Lei portuguesa n.º 37/81, de 3 de Outubro, provam sem qualquer dúvida a perda da nacionalidade portuguesa, pelo requerente. Deste modo, foi eliminada a condicionante antes estabelecida ao candidato Adalberto Costa Júnior e ficou aceite, sem mais reserva, a sua candidatura. O Fórum debruçou-se sobre o parecer da Comissão de Mandatos, que rejeitara esta candidatura. No entanto, após apresentação de um recurso pelo proponente, o Comité Permanente decidiu dar um prazo de oito dias para que o "Grupo de Sábios" pudesse analisá-lo com mais propriedade. Consequentemente, o parecer deste Grupo de Trabalho Ad Hoc (Grupo de Sábios) aconselhou que a candidatura do Vice-Presidente fosse validada, apesar disso e daquilo. Após várias intervenções, umas a favor e outras contra, alguns membros interrogaram-se se algum dos candidatos não usaria este «arranjo» para impugnar o Congresso, por ser anti-estatutário. Outros defendiam que os candidatos assinassem um documento de compromisso de não impugnação do Congresso. Por sua vez, o candidato José Pedro Kachiungo disse que o que devia prevalecer era o parecer dos Mais Velhos. (...). A jurista Mihaela Webba disse que, ao contrário da maioria, não concordava com esta decisão, porque violava os Estatutos, e sugeriu que houvesse votação secreta. Seguidamente, procedeu-se a uma votação aberta e das cinquenta e sete presenças, quarenta e sete votaram a favor e dez votaram contra. Finalmente, o Comité Permanente deu parecer favorável sobre a candidatura...".
Desta transcrição decorre a certeza de que o Requerido tinha o pleno domínio de que estava, efectivamente, a incorrer em práticas que contrariavam os seus estatutos e a lei, quer relativamente aos actos de incompetência atribuídos ao Comité Permanente e ao “Grupo de Sábios” para decidirem sobre a admissão de candidaturas, quer relativamente à extensão irregular de prazos, violando a legalidade do processo de candidaturas do XIII Congresso Ordinário do Partido UNITA.
Nas considerações que antecedem, este Tribunal clarificou que a intervenção, a dilação de prazos e a decisão do Comité Permanente, a fls. 279, 280 e 296 dos autos, na admissão da candidatura de Adalberto Costa Júnior e outrem, violou os princípios da legalidade e da competência, previstos no n.º 2 do artigo 6.º da CRA e na alínea h) do n.º 2 do artigo 20.º da LPP, respectivamente, bem como o n.º 3 do artigo 89.º dos Estatutos do XII Congresso.
Resta, assim, analisar os efeitos da violação da Constituição, da lei e dos Estatutos da UNITA por parte do Comité Permanente, que praticou actos sem poderes legais para o efeito e sem regulação devida de prazos.
Ao Tribunal Constitucional não compete decidir sobre todas as matérias de conflito interno dos partidos políticos, por dever de respeito à garantia constitucional do controlo mitigado ou de intervenção mínima judicial na vida interna das instituições partidárias e entes equiparados. Assim, este Tribunal, para decidir sobre o conflito interno de impugnação da candidatura de Adalberto Costa Júnior, tem em linha de consideração os termos processuais que estão determinados na Constituição, na LPP e nos estatutos ou convenções partidárias, de forma a concretizar a concordância prática entre o princípio da autonomia na ordenação da vida interna dos partidos políticos e o princípio da decisão judicial justa e conforme diante da violação de normas constitucionais, ordinárias ou estatutárias.
A violação imputada ao Comité Permanente por actos praticados por si, não afecta apenas a validade da candidatura do presidente eleito, tornando-a unilateralmente nula, mas acaba por afectar todo o processo de candidaturas.
Em sede de processos similares o tribunal Constitucional já adoptou, pelo menos, duas decisões da mesma natureza, conforme o Acórdão n.º 109/09, que declarou nulo o congresso da fnla, ocorrido de 5 a 7 de novembro de 2007, pelo que repristinou a direcção eleita e os estatutos provindos do congresso anterior, de 2004 (cfr. página 16 do acórdão n.º 109/09, patente no site deste tribunal) e o acórdão n.º 543/19, que declarou inválido o ii congresso extraordinário da fnla, realizado de 25 a 27 de junho de 2018, na cidade do huambo, e todos os seus actos e deliberações.
As regras gerais sobre a nulidade dos actos, previstas no artigo 201.º do CPC, patenteiam que a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
A nulidade apenas da candidatura de Adalberto Costa Júnior ou a nulidade do processo de candidaturas no seu todo impactam, num ou noutro caso, substancialmente o Congresso, uma vez que, o candidato eleito Presidente teve a prerrogativa de encerrar o certame e submeter à aprovação da primeira reunião ordinária da Comissão Política, a que preside, os candidatos aos cargos de Vice-Presidentes, Secretário Geral e Secretário Geral Adjunto, nos termos do artigo 47.º dos Estatutos de 2015.
Por outro lado, por proposta do candidato eleito Presidente, que foi aprovada, conforme Acta do Congresso (fls. 310), a Comissão Política passou de duzentos e cinquenta e um membros efectivos e cinquenta suplentes para trezentos e um membros efectivos e sessenta suplentes. Por sua vez, esta Comissão Política, irregularmente instituída, na sua primeira Reunião elegeu o Comité Permanente com uma composição de 51 membros efectivos.
Por conseguinte, havendo a nulidade da candidatura do dirigente máximo do Partido Político eleito no congresso, as acções, as propostas e as deliberações produzidas na sequência do exercício do novo cargo em que ficou investido são afectadas na sua essência e subsistência funcional, devido à falta de legitimidade legal do órgão presidencial para a prática de tais actos estatutariamente previstos.
Posto isto, o Tribunal Constitucional considera que assiste razão aos Requerentes e declara nulo o processo de candidaturas, por violação dos princípios da legalidade, da competência dos órgãos internos e da organização e funcionamento democráticos dos partidos políticos e da elegibilidade do presidente, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º, do n.º 1 e da alínea f) do n.º 2 do artigo 17.º, ambos da CRA, do artigo 1.º e da alínea h) do n.º 2 do artigo 20.º e do n.º 3 do artigo 25.º, ambos da LPP, assim como dos artigos 1.º, 48.º e n.º 3 do artigo 89.º, todos dos Estatutos do Partido UNITA, de 2015.
No mesmo sentido, e porque o processo de candidaturas considerado nulo representa uma significativa fase organizatória do Congresso, sem a qual não existiria o conclave realizado (fls. 302 a 312), este Tribunal declara sem efeito o XIII Congresso Ordinário de 2019 e ulteriores actos praticados na eleição e nomeação dos órgãos singulares e colegiais, devendo o Partido Político manter a ordem de composição, competência, organização e funcionamento saída da direcção central eleita no XII Congresso Ordinário de 2015, validamente anotado e registado nos próprios arquivos deste Tribunal Constitucional.
DECIDINDO
Nestes termos,
Tudo visto e ponderado, acordam em Plenário os Juízes do Tribunal Constitucional em:
Sem custas, nos termos do artigo 15.o da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho.
Notifique.
Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 5 de Outubro de 2021.
OS JUÍZES CONSELHEIROS
Dra. Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso (Presidente)
Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente)
Dr. Carlos Alberto B. Burity da Silva (Relator)
Dr. Carlos Magalhães
Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto
Dra. Maria de Fátima Lima d´A. B. da Silva
Dra. Victória Manuel Izata