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ACÓRDÃO N.º 729/2022

PROCESSO N.º 909-C/2021

Recurso para o Plenário

Em nome do Povo, os Juízes, acordam, em Conferência, no Plenário do Tribunal Constitucional:

I. RELATÓRIO

SWAKON, LIMITADA, suficientemente identificada nos autos, veio interpor o presente recurso para o Plenário, contra o Despacho do Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, que indeferiu o seu requerimento de interposição de recurso extraordinário de inconstitucionalidade, tendo de imediato apresentado alegações, das quais se resume o seguinte:

A Recorrente, foi a 30 de Agosto de 2021, notificada de um “despacho judicial” indicado como tendo sido emitido pelo Venerando Dr. Manuel da Costa Aragão, Venerando Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional.

Nos termos do transcrito como Despacho judicial, foi indeferido o Recurso Extraordinário de Inconstitucionalidade que interpôs, por este ter dado entrada fora do prazo (onze dias), não obstante, o despacho da sua admissão a fls. 748.

A não entrega da cópia do “Despacho” e a sua substituição pela transcrição, implica necessariamente, não apenas a violação do disposto nos artigos 259.º do Código do Processo Civil, mas também e mais gravoso do direito fundamental à informação jurídica, previsto no n.º 2 do artigo 29.º da Constituição da República de Angola.

A transcrição oficiosa não é apenas má por não ter fundamento legal, mas por ser ilícita e atrasar, sem justificação, a realização da justiça, principalmente num país como o nosso, onde há escassez de recursos humanos para sustentar a justiça e garantir a sua realização em tempo útil e dentro dos prazos legais.

A estrutura do despacho, e a transcrição do seu conteúdo, está longe de um Despacho judicial, porquanto, não tem um relatório, fundamentação de facto e de direito, havendo apenas a mera evocação de normas legais e não há decisão manuscrita.

Igualmente, a decisão de aclaração respeitante ao despacho em causa, seguiu os mesmos termos, padecendo como o despacho cuja aclaração requereu-se, dos mesmos vícios e tendo sido violadas as mesmas normas, excepto pela presença de um sumular relatório.

A decisão de aclaração do aludido despacho padece ainda do vício da falta de apreciação aos esclarecimentos pedidos, pois no essencial limitou-se a indicar duas normas legais, sem fixar o sentido e alcance que lhes dá e, manteve o despacho cuja aclaração requereu-se.

O despacho de aclaração não aclarou as dúvidas que o despacho suscitou, nem mesmo as colocadas quanto à competência do Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional para revogar o despacho de admissão do recurso.

Ao Juiz da causa cabe decidir da admissibilidade do recurso, e tendo este decidido admiti-lo, é ao juiz a quem for distribuído o processo que tem a competência para deferir os seus termos e, manifestar em nome do Tribunal Constitucional a sua eventual não vinculação à decisão do Tribunal recorrido quanto a admissibilidade.

Os Tribunais estão constitucionalmente vinculados a cumprir prazos, vinculação constitucional a que as partes e os cidadãos não estão submetidos, gozando de tutela jurisdicional efectiva, não se conhecendo na Constituição qualquer possibilidade de limitação.

Assim, qualquer norma infraconstitucional que implique limitação do exercício de um direito não pode ser senão inconstitucional, o mesmo é aplicável ao artigo 42.º n.º 3, b) da Lei do Processo Constitucional ao impedir a admissibilidade do recurso se interposto fora do prazo, sendo a norma inconstitucional o será igualmente a decisão que nela se tenta fundamentar.

O momento em que os autos foram remetidos ao Tribunal Constitucional e a data em que se emitiu o despacho de revogação da admissão, nota-se sem esforço que o mesmo despacho, também não observou o prazo em que o acto deveria ser praticado, extinguindo-se a possibilidade de o praticar, conforme resulta do artigo 29.º da Constituição e dos artigos 144.º e 145.º do Código do Processo Civil.

O Venerando Presidente do Tribunal Constitucional, em oposição aos seus deveres constitucionais e fora dos prazos legais, limitou o direito a recurso, como que invertendo as posições, pois o devedor do prazo razoável agiu restringindo o direito do titular do direito a prazo razoável, limitando a sua tutela efectiva fora do prazo, invocando a falta de prazo.

Tal só seria possível se o Venerando Presidente do Tribunal Constitucional não fosse sujeito processual e não estivesse, por isso, sujeito a prazos judiciais, o que configuraria uma violação do princípio da igualdade.

Assim, as decisões fora dos prazos revogatórios e confirmatória da revogação da admissão do recurso, não são mais que actos violadores do princípio da igualdade, pois implicam necessariamente, que os juízes não estão submetidos a prazos ou que os prazos a que são submetidos são meramente indicativos, o que é manifestamente contrário ao disposto nos artigos 29.º, 73.º e 57.º da Constituição da República de Angola.

Conclui requerendo, que seja revogado o despacho de indeferimento do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, prolactado pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, indicando como violadas as disposições legais previstas nos artigos, 6.º n.º 1 e 2, 23.º, 29.º, 73.º, 174.º n.º 2, 175.º, todos da Constituição da República de Angola, igualmente os artigos 23.º n.º 2, 137.º, 144.º, 145.º, 157.º,158.º 259.º, 660.º do Código do Processo Civil, e ainda do disposto nos artigos 2.º, 39.º e 42.º da Lei.º 3/08 de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional.

O Processo foi à vista do Digníssimo Magistrado representante do Ministério Público junto desta Corte, tendo promovido, em conclusão, o seguinte: “nestes termos, pugnamos pelo não provimento do recurso” (cf. fls. 28 e 29v). 

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir

II. COMPETÊNCIA

O presente recurso foi interposto contra o despacho do Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, nos termos do n.º 3 do artigo 5.º da LPC, que estabelece que da decisão do Juiz Presidente que indefere o requerimento cabe recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional.

Ademais, foi observado o pressuposto do prévio esgotamento dos recursos ordinários legalmente previstos nos tribunais comuns e demais tribunais, conforme estatuído no parágrafo único do artigo 49.º da LPC, pelo que tem o Tribunal Constitucional competência para apreciar o presente recurso.

III. LEGITIMIDADE

A Recorrente tem legitimidade para interpor o presente Recurso para o Plenário, face ao Despacho de indeferimento do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, proferido pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional.

Ademais, nos termos da alínea a) do artigo 50.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho, (LPC), têm legitimidade para interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade para o Tribunal Constitucional "as pessoas que, de acordo com a lei reguladora do processo em que a sentença foi proferida, tenham legitimidade para dela interpor recurso ordinário”.

IV.OBJECTO

O presente recurso tem como objecto a verificação da conformidade legal do Despacho de 11 de Agosto de 2021, prolactado pelo Juiz Conselheiro Presidente deste Tribunal, que indeferiu o requerimento de interposição de recurso extraordinário de inconstitucionalidade da Recorrente SWAKON, LIMITADA.

V. APRECIANDO

Questão Prévia

Não se identifica no requerimento de interposição do presente recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional, qualquer deficiência insuprível ou passível de ordenar o seu aperfeiçoamento, no âmbito dos poderes/deveres de regularização e suprimento de carácter vinculativo, previsto em termos gerais, nos artigos 467.º 477.º do Código Processo Civil (CPC), disciplina esta reflectida no disposto no n.º 4 do artigo 41.º e no n.º 1 do artigo 52.º da Lei n.º 3/08 de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC). Todavia, atento ao conteúdo do documento constitutivo de fls. 3 verso a 11 respeitantes às alegações que acompanham o requerimento de interposição do mencionado recurso, justificam-se as observações abaixo elencadas.

Desde logo, na apreciação da aludida peça processual, nota-se dificultada tanto em virtude da redundância dos argumentos expendidos (uso excessivo de palavras para expor uma mesma ideia), como da deficiente organização do texto, em termos de se ver agrupado de forma lógica as ideias relacionadas entre si, com vista a tornar mais acessível à compreensão do texto.

A pertinência do observado acima, prende-se em ordem a se cumprir com um dos afloramentos concernentes ao princípio da cooperação, igualmente exigido a todos os intervenientes processuais, relevando para o caso, entre outras disposições legais, as estipuladas nos artigos 266.º e 519.º do CPC, aplicável ao processo constitucional com as necessárias adaptações, por força do disposto no artigo 2.º da LPC.

 De sorte que, ao mesmo tempo que é requerido ao julgador, o dever de cooperação com as partes, quer seja na clareza e rigor que deve observar na elaboração dos despachos judiciais, passando pela exigência de informação e esclarecimentos devidos, impõe-se, igualmente, às partes no processo semelhante postura. 

Portanto, no mesmo sentido se devem guiar as partes e os seus mandatários judiciais, em relação a este princípio geral, transversal a todos os ramos do direito processual, isto é, primando pelo dever de colaborar com a justiça, incluindo no aspecto de proporcionar menor grau de complexidade das peças processuais, quer seja observando mais cuidado na linguagem utilizada, como adoptando um estilo de peças mais simplificadas e concisas no modo de elaboração, sem que tal implique, como é óbvio, a ausência do rigor técnico necessário, a fim de tornar a justiça mais pronta e eficiente.

Neste particular, além da elementar indicação de um pedido e uma causa de pedir exigidos por lei a toda a demanda judicial, impõe-se, cada vez mais às partes no processo, um amplo dever de diligência e cooperação, em ordem ao cumprimento de uma nova visão do processo mais compatível com a ideia de Estado Constitucional.

Ultrapassado o ponto acima, foi igualmente referido pela sociedade comercial, aqui Recorrente, Swakon Limitada, que a decisão de esclarecimento que coube ao despacho recorrido, não analisou suficientemente as questões que suscitou, concretamente que, este despacho padece do vício da falta de apreciação aos esclarecimentos pedidos, pois no essencial limitou-se a indicar duas normas legais, sem fixar o sentido e alcance que lhes dá e manteve o despacho cuja aclaração requereu-se, ou seja, não esclareceu as dúvidas que o despacho suscitou, nem mesmo as colocadas quanto à competência do Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, para revogar o despacho de admissão do recurso.

Decorre do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 666.º do Código do Processo Civil, conforme antedito, subsidiariamente aplicável ao processo constitucional com as necessárias adaptações que, proferida a decisão, extingue-se o poder de cognição do juiz, quanto a matéria da causa, sendo-lhe, todavia, lícito rectificar erros materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas existentes na sentença, e reformá-la quanto as custas e multas.

Sequencialmente estabelece o n.º 3 do mesmo preceito legal, que o disposto acima, e nos artigos subsequentes, aplica-se, até onde seja possível, aos próprios “despachos”.

Deste modo, na sequência da remessa dos autos, referente ao recurso extraordinário de inconstitucionalidade interposto pela firma ora Recorrente, o Juiz Conselheiro Presidente desta Corte constitucional, ao rejeitar o recurso admitido no tribunal ad quem, expôs o seguinte.

“Tendo sido interposto o R.E.I, fora do Prazo (onze Dias Depois), não obstante, o Despacho de admissão a Fls. 748, indefiro o requerimento de fls. 732 e seguintes.” 

 O referido despacho tem respaldo nas disposições conjugadas dos artigos 38.º alínea b), do n.º 3 do artigo 42.º e da alínea a), do n.º 1 do artigo 51.º todos da LPC, que estabelecem que o prazo legal para interposição do recurso é de 8 (oito) dias.

A Recorrente a fls. 756 a 760, requereu esclarecimento do mencionado despacho, em síntese por não ter percebido o teor da transcrição do mesmo, nem as bases para a sua elaboração, questionando a natureza do acto transcrito e a notificação que lhe foi feita, atacando paralelamente a estrutura do referido despacho por faltar-lhe um relatório, fundamentação e decisão manuscrita.

Ora, atendendo aos pressupostos expressos na lei, para admitir o requerimento de rectificação, esclarecimento ou reforma de decisões judiciais, previsto nos artigos 667.º e seguintes do CPC, facilmente se conclui que, os argumentos invocados pela Recorrente são de todo inadmissíveis, na medida em que, ao contrário de identificar no despacho recorrido, qualquer ambiguidade, imprecisão ou erro material passível de rectificação pelo próprio Juiz, autor do acto, nos termos do disposto no regime em referência, ao invés disso, vem requerer apreciação substancial dos fundamentos do despacho, por nítida inconformação com a decisão nele exarada, o que é manifestamente ilegal.

Porém, não obstante, o exposto acima, a natureza das reivindicações apresentadas pela Recorrente são passíveis de serem apreciadas em sede do presente recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional, de acordo com os termos das disposições conjugadas do n.º 3 do artigo 668.º e n.º 2 do artigo 670.º ambos do CPC, pelo que, é nestes termos que este Plenário é chamado a intervir tendo como objecto de apreciação, exclusivamente o despacho que indeferiu o recurso de inconstitucionalidade interposto pela firma Recorrente, exarado pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional e não o despacho resultante do pedido de esclarecimento que lhe coube.

Assim sendo, abstraindo-se da complexa sistematização utilizada pela Recorrente nas suas alegações, com vista à revogação do aludido despacho de indeferimento, identificam-se as seguintes questões a resolver, tanto no que respeita à forma, como à substância do despacho impugnado.

  1. Sobre a competência do Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional rejeitar o recurso de inconstitucionalidade

Entende a Recorrente que, ao Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional falta a competência para indeferir o requerimento do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, todavia admitido no Tribunal ad quem.

Acrescenta a Recorrente que o disposto no n.º 4 do artigo 42.º da LPC, em que se baseou o aludido Despacho, não confere competência ao Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional para indeferir o recurso, por conseguinte, violando as normas previstas nos artigos 39.º, 42.º, 43.º da LPC e 174.º e 175.º da CRA.

Sobre a competência para admitir ou rejeitar os recursos de inconstitucionalidade no âmbito da fiscalização concreta, quer se trate do recurso ordinário de inconstitucionalidade ou do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, claramente resulta da Lei do Processo Constitucional, que esta competência afigura-se tripartida, seja entre o Juiz da causa no Tribunal Comum, o Juiz Relator a quem for distribuído o processo no Tribunal Constitucional, e concomitantemente ao Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, senão vejamos:

O que ora acaba de se assinalar, ancora-se no preceituado nos n.º 1 e 4 do artigo 42.º da LPC, aplicáveis subsidiariamente ao recurso extraordinário de inconstitucionalidade interposto pela aqui Recorrente, por força do disposto no artigo 52.º do mesmo diploma legal, ao estabelecer que compete ao Tribunal que tiver proferido a decisão recorrida, o dever de igualmente apreciar a admissão do recurso que contra ela for interposto e que a decisão que admite o recurso ou define-lhe o efeito não vincula o Tribunal Constitucional. 

Outrossim, bem se compreende do estabelecido no n.º 5 do artigo 41.º do diploma legal em anotação, que o Juiz Relator do processo no Tribunal Constitucional pode também ele vir a indeferir o requerimento de recurso de inconstitucionalidade, no caso, se o autor não responder ao apelo do Tribunal, concernente ao aperfeiçoamento do requerimento em causa.

No entanto, no que se refere aos poderes do Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, proferir um tal despacho de rejeição, no âmbito da disposição acima, não é de todo paradoxal, na medida em que perfilhamos do entendimento que, face à competência que este detém em admitir o recurso de inconstitucionalidade rejeitado pelo juiz da causa, igualmente a detém para indeferir o recurso, no caso de este não preencher os requisitos.

Em comentário ao n.º 4 do artigo 42.º da Lei do Processo Constitucional, igualmente refere Onofre dos Santos que, “não parece resultar inequivocamente deste preceito que admitido o recurso não haja outro caminho que não seja o da sua distribuição a um relator para elaboração do projecto de acórdão e levá-lo a decisão”(…).

Assevera o mesmo autor que, “deve porém, entender-se incluído entre os poderes do Juiz Presidente o de apreciar o preenchimento de todos os pressupostos da admissibilidade do mesmo recurso, previstos nos artigos 41.º da LPC” (…), pelo que, assim sendo, tem este igualmente o poder de rejeitar o recurso anteriormente admitido pelo juiz da causa, quanto mais não seja, em obediência aos princípios da economia e celeridade processual, in Lei do Processo Constitucional anotada, Texto Editores Limitada, 2016, pág. 55. 

Na mesma linha de argumentação, e aqui seguindo de perto o que vem sufragado no Acórdão n.º 678/2021, prolactado por esta Corte Constitucional, reitera-se o entendimento de que, a competência para o Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, indeferir o requerimento de recurso extraordinário de inconstitucionalidade, paralelamente, advém do disposto no n.º 3 do artigo 5.º, e no n.º 2 do artigo 8.º ambos da LPC.

Efectivamente, a propósito do âmbito da competência do Plenário deste Tribunal decidir, sobre a impugnação do Despacho de indeferimento do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, proferido pelo seu Presidente, refere-se no mencionado aresto o seguinte:

 “O presente recurso foi interposto para o Plenário do Tribunal Constitucional nos termos e com os fundamentos do n.º 3 do artigo 5.º e do n.º 2 do artigo 8.º ambos da LPC, norma que estabelece a possibilidade de se recorrer do despacho de não admissão do requerimento de recurso extraordinário de inconstitucionalidade.

Pelo que tem o Plenário do Tribunal Constitucional competência para apreciar o presente recurso.”  

Na prática, as normas referenciadas nesta passagem do acórdão citado supra, são alusivas a competência que detém o Juiz Conselheiro Presidente desta Corte Constitucional em apreciar liminarmente os requerimentos dirigidos ao Tribunal Constitucional, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 4.º da LPC.

Além do mais, claramente resulta do estabelecido no n.º 1 do artigo 4.º da LPC, que passamos a citar: “as petições de todos os processos da competência do Tribunal Constitucional dão entrada na Secretaria Judicial e, após autuados, são conclusos ao Juiz Presidente do Tribunal Constitucional para decidir da sua admissão ou rejeição”.

Termos em que, carece de rigor técnico jurídico a afirmação segundo a qual, a exigência legal acima, não ser admissível aos recursos extraordinários de inconstitucionalidade, pelo facto de a estes aplicar-se subsidiariamente a tramitação referente ao recurso da Apelação em processo civil, porquanto a regra geral da subsidiariedade prevista nos artigos 2.º e 39.º da LPC, somente abrange a ausência de normas específicas a regularem determinado aspecto do processo constitucional que, como vimos, não se verifica in casu

Sendo assim, resta apenas concluir que nada impede o Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, no âmbito das suas competências jurisdicionais, de proferir despacho no sentido de indeferir o recurso extraordinário de inconstitucionalidade, pese embora, este tenha sido antes admitido pelo Juiz da causa.

Deste modo, não se constata ter havido ofensa ao princípio da legalidade condizente com o estabelecido nos artigos 174.º e 175.º da CRA.  

  1. Sobre a estrutura e formalidade do acto de notificação do Despacho recorrido

Relativamente ao ponto acima, é paralelamente invocado pela Recorrente, a invalidade do acto praticado pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, por alegada violação do disposto nos artigos 29.º n.ºs 2 e 5; 6.º n.ºs 1 e 2; 174.º; e 175.º da CRA, e ainda nos artigos 259.º; 137.º; 157.º e 158.º do CPC.

Em síntese, refere a Recorrente nas suas alegações que o despacho em causa, não observa os requisitos legais para se conformar a exigência de um despacho judicial e, por outro lado, considera ilícito o acto da transcrição do seu conteúdo para efeitos de notificação.

Desde modo, com interesse para presente apreciação, retira-se dos autos o seguinte:

 A sociedade comercial, aqui recorrente, na qualidade de Assistente nos autos de Querela com n.º 1028/18-A, não se conformando com o Acórdão prolactado pelo Tribunal Supremo ao ter revogado a decisão condenatória em primeira instância, apresentou, ainda no tribunal ad quem, requerimento para interposição de um recurso extraordinário de inconstitucionalidade, sendo admitido, apesar de extemporâneo à luz do disposto no artigo 38.º da LPC. (fls. 748).

Na verdade, sucedeu que a Recorrente notificada da decisão do tribunal ad quem, no dia 19 de Março de 2021, somente no dia 30 de Março do mesmo ano, apresentou o requerimento de interposição do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, isto é, passados 11 (onze) dias da data da notificação da aludida decisão. (fls 731 e 732).

Porém, verificada a entrada do processo na Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional a 10/08/21, após autuado nessa mesma data, foi no dia a seguir, ou seja, a 11/08/2021, concluso o processo ao Juiz Conselheiro Presidente que, no mesmo dia emitiu o Despacho seguinte, conforme se pode observar a fls 751:

“Tendo sido interposto o R.E.I, fora do prazo (onze dias depois), não obstante, o despacho de admissão a fls. 748, indefiro o requerimento de fls. 732 e seguintes.”

O referido despacho tem respaldo nas disposições conjugadas dos artigos 38.º, 51.º n.º 1, e 42.º n.º 3 alínea b) da LPC, que estabelecem que o prazo legal para a interposição de recurso é de 8 dias.

Como antedito, vem a Recorrente atacar a estrutura do aludido despacho, por considerar estar longe de observar a forma devida, uma vez que carece de um relatório, fundamentação de facto e de direito, havendo apenas a mera evocação de normas legais e, faltar-lhe decisão manuscrita.

Pois bem! Como refere a Recorrente citando o disposto no artigo 17.º da Lei n.º 2/15, de 02 de Fevereiro – Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais da Jurisdição Comum. “1. As decisões dos juízes sejam por via de acórdãos, sentenças ou meros despachos são sempre fundamentadas de facto e direito. 2. A fundamentação não pode consistir na mera evocação de uma norma legal nem na adesão, por parte do juiz, às razões e alegações evocadas por qualquer das partes incluindo o Ministério Público”.

Do enunciado acima, desde logo, faz-se perfeitamente entender que as decisões judiciais estão classificadas quanto a sua natureza, em função das necessidades próprias do processo judicial, aliás, conforme decorre do disposto no artigo 156.º do CPC. Deste modo, em termos muito resumidos temos as sentenças e os acórdãos, que podem configurar decisões de mérito ou de forma, mas que no essencial conformam o tipo de decisões judiciais pelas quais, o juiz singular ou o colectivo de juízes, decide a causa principal ou algum incidente que se afigura legalmente como tal.

E, finalmente, os despachos judiciais, que tanto podem ser iniciais, finais, ou interlocutórios, tendo como finalidade dar solução a qualquer questão respeitante a tramitação processual, seja de decisões que não respeitem, em princípio, a causa principal ou um incidente com semelhante natureza.

Os despachos judiciais, de acordo com a vasta maioria da doutrina, dividem-se ainda em despachos de mero expediente, discricionários ou vinculativos, interessando para o que neste ponto releva, esta última categoria de despachos, atendendo à imposição do dever de fundamentação que sobre eles pairam, à semelhança das sentenças, sendo sindicáveis por via de recurso.

No entanto, para a questão que se impõe por ora decidir, importa apreciar os requisitos formais e substanciais necessários para a validade das decisões judiciais e, em especial, dos despachos, considerando que a Recorrente alega que não foram observados tais requisitos no despacho recorrido, tal como não foi respeitada a estrutura exigida.

Neste passo, como igualmente percebe a Recorrente, o regime disposto nos artigos 157.º e 158.º do CPC, efectivamente regulam estas matérias, mas não o fazem isoladamente como observar-se-á adiante.

Por conseguinte, a propósito do que a lei apelida de requisitos externos da sentença e do despacho, prevê o n.º 1 do artigo 157.º do CPC, taxativamente o seguinte: “o relatório e os fundamentos dos despachos, sentenças ou acórdãos podem ser dactilografados, mas a decisão tem de ser manuscrita pelo juiz ou relator, que datará e assinará, ressalvando as emendas de todo o texto e rubricando as folhas dactilografadas (...)”

Ora, o preceito em referência trata apenas dos requisitos externos que devem constar das sentenças e dos despachos e não da estrutura a respeitar na sua elaboração. Logo, a referência ao “relatório” respeita exclusivamente as sentenças e acórdãos, conforme resulta do estabelecido no artigo 659.º do CPC.

Portanto, na sua estrutura o despacho não comporta um relatório que é uma etapa necessária e específica da construção de uma sentença, na qual deve vir mencionado a identificação das partes bem como a exposição concisa do pedido e dos seus fundamentos.

Em referência ao direito comparado, na senda do que aborda Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, sobre os correspondentes artigos 659.º e 158.º no Código de Processo Civil Português; “A sentença compõe-se estruturalmente de relatório, fundamentação (de facto e de direito) e decisão (artigo 659.º). Os despachos caracterizam-se pela sua maior informalidade e abreviação, a menos que dirimam qualquer controvérsia ou alguma dúvida suscitada no seio do processo, casos em que devem compreender – tal como as sentenças – os fundamentos da decisão (artigo 158.º), in Direito do Processo Civil, Vol. I, Almedina, 2010, pág. 492.

Não obstante, como referido supra, se imponha a certas categorias de despachos judiciais, pela função que visam acautelar, que sejam fundamentados, a sua elaboração, não comporta jamais uma etapa referente ao relatório, tal como se exige para a construção das sentenças ou acórdãos.

Nesta conformidade, o que demanda exclusivamente o n.º 1 do artigo 157.º do CPC, no que concerne as condições externas a observar, tanto no relatório (a propósito das sentenças e acórdãos) quanto nos fundamentos respeitantes a ambas categorias de decisões judiciais é que podem ser dactilografados, mas que a decisão tem de ser manuscrita pelo juiz ou o relator, que lhes oporá data e assinatura, rubricando as folhas dactilografadas, e por fim, a imposição de todas as emendas feitas no texto a serem ressalvadas. Isto é, nada se extraindo do referenciado preceito legal que, o “relatório” seja, por conseguinte, um dos requisitos externos a observar ao ser exarado um despacho. 

Em harmonia com o que se acaba de exprimir, paralelamente distingue Hermenegildo Cachimbombo, a propósito da razão de ser destes requisitos externos das decisões judicias, que a imposição dos mesmos, com efeito, “prendia-se com a necessidade de garantir a fidelidade da decisão, mas actualmente, dado o desenvolvimento da ciência informática, que disponibiliza outros mecanismos de segurança capazes de garantir a autenticidade dos textos, este requisito revela-se contraproducente-pelo que, numa perspectiva de direito a constituir, deverá ser suprimido”. In Manual dos Recursos no Direito Processual Civil Angolano 2.ª edição, 2017, pág. 21.

Pelo que, aqui chegados, verifica-se que falta razão à Recorrente, ao invocar a violação do disposto no artigo 157.º do CPC, na medida em que foram respeitados os requisitos aí descritos, designadamente que o despacho recorrido foi manuscrito, datado e assinado pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, conforme se pode observar a fls. 751.

Quanto a alegada ausência de fundamentação no despacho recorrido, diante do requerimento de recurso extraordinário de inconstitucionalidade apresentado pela Recorrente, existe uma decisão que foi de indeferimento, e uma justificação, pelo facto do o pedido de recurso ser extemporâneo.

Logo, daí não parece advir total ausência de fundamentação no Despacho recorrido, conforme alega a Recorrente, na medida em que a decisão de indeferimento ou rejeição do recurso interposto, foi claramente explicada ao interessado, por outras palavras, que o pedido não foi admitido pela sua extemporaneidade, tendo deste modo, precludido o direito de recorrer da decisão proferida no tribunal ad quem.  

Para a presente análise, importa precisar que a razão na base da exigência de fundamentação das decisões judiciais tem como escopo fundamental evitar que o julgador tome decisões arbitrárias ou por outra, sem justificação plausível, isto é em desconformidade ao princípio da legalidade informador do Estado Democrático de Direito consagrado nos artigos 2.º n.º 1 e 6.º da CRA.

A este propósito segue-se de perto o Acórdão n.º 674/2020 desta Corte Constitucional, citando Antunes Varela, deste modo, “mesmo que se considerasse como deficiente a argumentação do Juiz, com pertinência, ANTUNES VARELA, afirma que, para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.”

Tecidas as considerações acima, verifica-se no despacho proferido pelo Juiz Conselheiro Presidente desta Corte Constitucional, há fundamentação bastante para aferir as razões da extemporaneidade da admissibilidade do recurso fundamento do indeferimento, pelo que, não merece qualquer censura ou juízo de inconstitucionalidade. 

Por outro lado, igualmente, alega a Recorrente que, a não entrega da cópia do “Despacho” e a sua substituição pela transcrição, implica necessariamente, não apenas a violação do disposto no artigo 259.º do Código do Processo Civil, mas também e mais gravemente do direito fundamental à informação jurídica, previsto no n.º 2 do artigo 29.º da Constituição da República de Angola, e que a transcrição oficiosa não é apenas má por não ter fundamento legal, mas por ser ilícita e atrasar, sem justificação, a realização da justiça.

No que concerne ao acto de notificação das decisões judiciais, efectivamente demanda a lei que, quando se notifiquem despachos, sentenças ou acórdãos, que deve enviar-se ou entregar-se ao notificado, a cópia da decisão e dos fundamentos.

Como referido atrás, exarado o despacho recorrido foi elaborado competente mandado de notificação, onde se faz referência a entrega da transcrição do despacho judicial que indefere o presente recurso, fls 753. 

Na sequência, de igual modo, foi junta a certidão de notificação nos autos, atestando que na data de 30 de Agosto de 2021, foi notificada a firma Recorrente. (cf. fls 754). 

Face ao descrito acima, cabe responder à questão de saber se é ou não ilegal, o acto de transcrição do aludido despacho para efeitos de notificação ao interessado.

Vejamos:

 A notificação é um acto da Secretaria Judicial que se destina a dar conhecimento das decisões judiciais aos demais intervenientes processuais. No entanto, é importante não perder de vista que, a exigência contida neste preceito legal, na altura em que este Código do Processo Civil foi aprovado e entrou em vigor no território que corresponde hoje o nosso país, (Portaria n.º 23 090 de 26 de Dezembro de 1967), a referência a “cópia” descrita no preceito legal, quer das sentenças, quer dos despachos, correspondia a reprodução “dactilografada” dos mesmos documentos, contando que não existia na altura fotocopiadoras, como as que conhecemos actualmente. Vide a propósito Abílio Neto, Código do Processo Civil Anotado, 6.ª edição revista e actualizada, 1985, págs. 196 a 197.

Por isso, se compreende que a transcrição do despacho referenciado pela Recorrente, indiscutivelmente condiz com a “cópia dactilografada” do despacho judicial, no sentido que a lei faz referência, trata-se, pois, agora, da reprodução digitalizada do documento a ser notificado à parte nos autos.

Está em causa, no preceito em referência, além da necessidade de levar o conhecimento da decisão judicial ao interessado, igualmente a necessidade de o conteúdo da mesma ser-lhe perceptível.

Como é evidente, não é praticável, fazer-se a entrega no acto de notificação do despacho original, para dele, o interessado ou interessados tomarem conhecimento, por isso, ordena-se a entrega de “cópias” do mesmo expediente, tal como observamos na altura em que foi elaborado o código, correspondiam a reprodução das aludidas decisões pelo método dactilografado.

Usualmente, os Tribunais dispõem de máquinas fotocopiadoras pelo que, têm sido efectivamente fotocopiadas as decisões judiciais para efeitos de notificação, mas nada proíbe que se utilize o método da transcrição verso reprodução digital dos despachos que, aliás, vai mais de encontro com a letra e o espírito do preceito, a fim de se obter melhor legibilidade da decisão a notificar, levando em conta que a decisão original foi elaborada a manuscrito.

Noutra perspectiva, se concorda que da mesma forma, a exigência contida no preceito legal em nota, não desconsidera a preocupação com o aspecto da certificação sobre autenticidade das decisões judiciais, tendo em conta que, a transcrição é certificada pelo cartório judicial que confere fé ao auto.

Portanto, a indispensabilidade da segurança que, a decisão a notificar proveio efectivamente do Juiz da causa no processo, não implica de modo algum, a existência de incumprimento dos requisitos externos da sentença ou do despacho, conquanto no caso dos autos, como atrás se verifica, o despacho original encontra-se manuscrito, datado e assinado pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional.

Porém, não obstando o sublinhado acima, em relação à alegada invalidade do despacho recorrido, em virtude da sua transcrição para o efeito do acto de notificação, menção forçosa para o previsto no artigo 201.º do CPC, respeitante as regras gerais de nulidade dos actos judiciais, onde se esclarece que, “(…), a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.

Por fim, nota-se que, não sendo ilícito o acto da transcrição ou reprodução digitalizada do Despacho recorrido, atendendo que mesmo indiscutivelmente equipara-se a uma “copia dactilografada” do mesmo despacho, bem como não se demonstrando em função da aludida transcrição, qualquer prejuízo aos legítimos interesses da Recorrente no processo, sempre diria que a interessada poderia certificar-se da autenticidade do despacho judicial em consulta aos autos, podendo igualmente requerer ao Tribunal a repetição da notificação, desta feita, mediante fotocópia do despacho, sem prejuízo do prazo para, querendo, reagir posteriormente contra a decisão em causa.

Serve o atrás exposto, para evidenciar que no caso vertente igualmente não foi ofendido no âmbito do princípio do acesso ao direito, o direito a informação e consulta jurídica. Na verdade, a Recorrente distorce este enunciado constitucional, na medida em que dele apenas se retira que “a consulta jurídica deve ser entendida como o esclarecimento técnico sobre o direito aplicável a questões ou casos concretos nos quais avultem interesses pessoais legítimos, ou direitos próprios lesados ou ameaçados de lesão”, o que de todo não é demostrado pela recorrente que tenha sido afectado. Vide Manuel Pereira da Silva, Tutela Jurisdicional Efectiva em Matérias Administrativas em Angola, 2019, pág. 68.    

Portanto, não se divisa pelo exposto que o despacho recorrido tenha violado o estipulado nos n.ºs 2 e 5 do artigo 29.º, 1 e 2 do artigo 6.º, 174.º e 175.º todos da CRA, bem como nos artigos 137.º, 157.º 158.º e 259.º do CPC, como mais adiante será reforçado.

  1. Sobre o prazo para a Recorrente interpor recurso extraordinário de inconstitucionalidade, e da alegada violação do prazo para proferir o Despacho de rejeição do recurso.

Paralelamente aos aspectos de forma invocados contra o despacho de rejeição do recurso extraordinário de inconstitucionalidade, prolactado pelo Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, a Recorrente de igual modo impugna o aludido despacho, primeiro, porque na sua óptica não está obrigada a observar um prazo para interposição de recurso, segundo, pelo facto de o Despacho de rejeição ter sido exarado fora do prazo.

Defende a Recorrente nas suas alegações que, “os Tribunais estão constitucionalmente vinculados a cumprir prazos, vinculação constitucional a que as partes e os cidadãos não estão submetidos, gozando de tutela jurisdicional efectiva, não se conhecendo na Constituição qualquer possibilidade de limitação, assim, qualquer norma infraconstitucional que implique limitação do exercício de um direito não pode ser senão inconstitucional.”

Neste sentido, é invocado pela Recorrente a violação do disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 29.º da CRA a respeito do acesso ao direito e a tutela jurisdicional efectiva.

Por certo, traduz-se do n.º 5 do preceito constitucional em apontamento que “Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.”

Tal entendimento foi também ilustrado por Manuel Pereira da Silva, ao mencionar que “esta necessidade de celeridade está intimamente ligada ao acesso ao direito e a tutela jurisdicional efectiva, que apenas será se os procedimentos judiciais forem caracterizados, nomeadamente, pela presteza, de modo a obter a tutela efectiva em tempo útil (…)”, situando-se neste âmbito, tanto os prazos de acção ou recurso a serem observados pelos sujeitos processuais, como o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas. Ob. cit, pág. 39.

Desta forma, em ordem a garantir a tutela jurisdicional efectiva, não ressalta definitivamente do enunciado acima, que os actos processuais das partes estejam isentos da obrigatoriedade de cumprimento de prazos, pelo contrário, é justamente em atenção a tornar-se efectiva a referida garantia constitucional, que a lei deve, por conseguinte, assegurar a previsão de procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade, e por certo, não se cumpre um tal desígnio sem se estabelecer um regime adequado de prazos de cumprimento dos actos judiciais, conforme estabelece por regra geral os artigos 144.º e ss do CPC. 

Semelhante entendimento é reafirmado, por Jorge Miranda e Rui Medeiros, ao dilucidar que “ o estabelecimento legal de prazos de caducidade para a propositura de uma acção prossegue, designadamente, os interesses da Certeza e da segurança jurídicas, não violando, em si mesmo, o direito de acesso aos tribunais”. in Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª edição, 2010, Coimbra Editora, pág. 434.

Portanto, o disposto no n.º 3 alínea) b) do artigo 42.º da Lei do Processo Constitucional, ao estabelecer especificamente regras no que concerne o prazo para interposição do recurso de inconstitucionalidade, não mácula de modo algum a garantia do direito fundamental ao recurso.

Pelo contrário, garantindo no mesmo sentido a par de outros princípios constitucionais, também o respeito aos princípios da economia e celeridade processual, da certeza e segurança jurídica, ambos co-envolvidos igualmente na efectivação do Estado Democrático de Direito e, atendendo que não se concebe uma democracia com a ausência de regras, parâmetros de actuação dos titulares de direitos fundamentais, incluindo o que respeita a duração do direito de agir em juízo.

Assim sendo, afigura-se indefensável a viabilidade criadora de incerteza e desrespeito pela segurança jurídica, consubstanciada na invocada isenção da observação de um prazo para interposição do recurso extraordinário de inconstitucionalidade. Estando por isso a Recorrente obrigada a apresentar o seu requerimento de recurso dentro do prazo estipulado por lei, que é de 8 (oito) dias, contados da data da notificação da decisão que pretende impugnar.

Termos em que, o Tribunal Constitucional, considera que bem andou o Juiz Conselheiro Presidente ao proferir o despacho de indeferimento do recurso interposto pela Recorrente, por ter este dado entrado no Tribunal fora do prazo devido, de acordo as disposições conjugadas dos artigos 38.º, 51.º n.º 1, e 42.º n.º 3 alínea b) da LPC. 

Além do mais, importa ressalvar, relativamente ao entendimento da Recorrente, segundo o qual a norma prevista alínea b) do n.º 3 do artigo 42.º da LPC, é de todo inconstitucional e, pela mesma razão a decisão que com ela se tenta fundamentar, que este não seria o meio processual adequado para impugnar a norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, visto o disposto nos artigos 16.º a 35.º e 36.º da LPC, condizentes respectivamente com a fiscalização abstracta e com o recurso ordinário de inconstitucionalidade.

Termos em que, o procedimento em apreciação não visa declarar a inconstitucionalidade de qualquer norma, incluindo a referenciada pela Recorrente. 

Sobre esta questão já se pronunciou esta Corte Constitucional no Aresto n.º 654/2020, frisando que o princípio da supremacia da Constituição e da legalidade, condiz com o dever deste Tribunal observar as espécies de processos previstas no artigo 3.º da LPC, não permitindo que o objecto próprio de uma causa seja apreciado em outra causa ou espécie de processo.

Por último, alega a Recorrente, que o momento em que os autos foram remetidos ao Tribunal Constitucional e, a data em que se emitiu o despacho de revogação da admissão, nota-se sem esforço que o mesmo despacho, também não observou o prazo em que o acto deveria ser praticado, extinguindo-se a possibilidade de o praticar, conforme resulta do artigo 29.º da Constituição e dos artigos 144.º e 145.º do Código do Processo Civil, a este propósito colocando em paridade a posição processual das partes versus o próprio tribunal.

Ora, o princípio da igualdade previsto no artigo 23.º da CRA, perpassa, com efeito todo o texto constitucional, no entanto, é cristalino que, entre o conjunto das garantias constitucionais que enforma o chamado direito à jurisdição, decorrente dos n.ºs 4 e 5 do artigo 29.º da CRA, entre elas o princípio da equidade nas suas vertentes da contraditoriedade e da igualdade de armas, é apenas oponente às partes no processo e não ao julgador, que de todo não é parte processual como reivindica a Recorrente.

Deste modo, a consequência jurídica a retirar em virtude do incumprimento dos prazos legalmente estipulados não é semelhante, não obstante, tanto uns como os outros, os actos das partes como dos magistrados estarem sujeitos a prazos.

No domínio específico da jurisdição constitucional, tendo em conta que o regime geral previsto no Código do Processo Civil, ser apenas de aplicação subsidiária, deste modo, estabelece a LPC, uma miríade de prazos quer relativos aos actos das partes (sujeitos processuais) quer dos demais intervenientes processuais, incluindo o Juiz Conselheiro Presidente desta instância jurisdicional. Vide o artigo 14.º da LPC (anotada).

Feita essa ressalva, dispõe a Lei do Processo Constitucional relativamente ao prazo em que deve ser tomada a decisão de admissão ou rejeição do recurso de inconstitucionalidade no n.º 2 do artigo 42.º que “a decisão de admissão do recurso deve ser tomada pelo Juiz da causa no prazo máximo de 5 (cinco) dias, contados da data de entrada no cartório do requerimento de interposição”.

Todavia, para decidir da admissão ou indeferimento do recurso de inconstitucionalidade, o Juiz Conselheiro Presidente está vinculado ao prazo de 5 dias, nos termos no n.º 2 do artigo 159.º do CPC, aplicável subsidiariamente por força do disposto no artigo 2.º da LPC.

Como já referido acima, lavrada a entrada e autuado o processo na Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional em 10/08/21, no dia seguinte, isto a 11/08/2021, foi o processo concluso ao Juiz Conselheiro Presidente que, na mesma data proferiu o despacho de indeferimento conforme se observa a fls 751 dos autos, isto é, no mesmo dia depois de o processo ser-lhe concluso para decidir sobre admissão ou não do recurso de inconstitucionalidade.

Assim sendo, temos por certo que, o despacho de rejeição do recurso de inconstitucionalidade interposto pela Recorrente, foi exarado pelo Juiz Conselheiro Presidente deste Tribunal, dentro do prazo previsto legalmente para o efeito, logo, é desprovido de qualquer sentido a alegação da Recorrida.

Por conseguinte, de acordo com as normas constitucionais e a doutrina referenciadas, o Plenário deste Tribunal é do entendimento que o despacho recorrido não violou normas legais nem ofendeu qualquer preceito constitucional invocado pela Recorrente, estão devidamente fundamentadas as razões do indeferimento do requerimento, não sendo atendível a alegada violação do princípio constitucional do dever de fundamentação das decisões judiciárias, dos princípios da igualdade e do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva.

DECIDINDO

Nestes termos,

Tudo visto e ponderado, acordam, em Plenário, os Juízes do Tribunal Constitucional, em:

Custas pela Recorrente, nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho.

Notifique.

 

Tribunal Constitucional, em Luanda, 16 de Março de 2022.

 

OS JUÍZES CONSELHEIROS

Dra. Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso (Presidente) 

Dra. Guilhermina Prata (Vice-Presidente) 

Dr. Carlos Alberto B. Burity da Silva 

Dr. Carlos Manuel dos Santos Teixeira 

Dr. Gilberto de Faria Magalhães 

Dra. Josefa Antónia dos Santos Neto 

Dra. Júlia de Fátima Leite Silva Ferreira 

Dra. Maria de Fátima de Lima d’A. B. da Silva (Relatora)